Luciana Atheniense
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LUCIANA ATHENIENSE

STF suspende processos contra cias aéreas: o que muda para os passageiros

Por decisão do ministro Dias Toffoli foram suspensas as ações que discutem indenizações por atraso, alteração ou cancelamento de voos

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A decisão publicada nessa quarta-feira (26/11) pelo ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a suspensão nacional de processos judiciais contra companhias aéreas que discutem indenizações por atraso, alteração ou cancelamento de voos.

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A medida gerou apreensão entre consumidores, mas, ao contrário do que parte do setor passou a divulgar, a suspensão não vale para todos os casos envolvendo empresas aéreas e não autoriza a exclusão generalizada da responsabilidade civil dessas companhias.

O que está em análise no STF é uma questão específica: definir se, o Código Brasileiro da Aeronáutica pode prevalecer sobre o Código de Defesa do Consumidor (CDC) somente quando o atraso ou cancelamento de voo resultar de caso fortuito externo ou força maior: eventos imprevisíveis, inevitáveis e totalmente alheios ao controle da companhia.

O Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA), no artigo 256, §3º, lista as únicas hipóteses que podem ser consideradas fortuito externo: mau tempo que impeça operações aéreas, falhas de infraestrutura aeroportuária, determinação de autoridade pública e restrições decorrentes de pandemia ou atos governamentais.

Fora dessas hipóteses taxativas, o evento não pode ser considerado externo ao risco da atividade. Isso significa que a maior parte dos atrasos e cancelamentos vivenciados no cotidiano da aviação brasileira, por integrarem o ciclo operacional normal, configura fortuito interno e não exclui responsabilidade da empresa, nos termos do CDC (artigo 14).

Exemplos frequentes de fortuito interno incluem:

• falta ou atraso de tripulação;
• manutenção programada que impede o voo;
• manutenção decorrente de desgaste natural da aeronave;
• troca de aeronave sem disponibilidade técnica imediata;
• readequação comercial da malha aérea (corte de voos por estratégia de mercado);
• problemas logísticos internos (excesso de conexões, atrasos sequenciais);
• falhas previsíveis de abastecimento, limpeza ou checagem técnica.

Esses eventos decorrem de planejamento, organização da malha e gestão operacional e são considerados riscos da própria atividade empresarial. Por isso, continuam gerando indenização, tanto por dano material quanto por dano moral.

Além disso, mesmo quando houver hipótese potencial de fortuito externo, a companhia aérea não pode simplesmente alegar força maior para excluir responsabilidade sem comprovação robusta. Cabe à empresa demonstrar, com elementos técnicos inequívocos e verificáveis, que o evento era imprevisível, inevitável e impeditivo da operação. A alegação genérica não basta. É preciso provar.

Nesse sentido, relatórios meteorológicos unilaterais, como as telas METAR, utilizados pelas empresas para justificar cancelamentos, não são suficientes para afastar o dever de indenizar, sobretudo quando outras aeronaves decolam e pousam normalmente no mesmo aeroporto, horário e condição climática.

A jurisprudência brasileira tem afastado a exclusão de responsabilidade quando não há comprovação técnica da impossibilidade real e absoluta do voo.

Ressalte-se que o STF também não afastou o direito à assistência. Mesmo quando comprovado o fortuito externo, o CBA (artigo 256, §4º) e a Resolução 400/2016 da ANAC determinam que a empresa deve fornecer alimentação, hospedagem, comunicação, reacomodação e reembolso integral, quando necessário.

Apesar disso, parte do setor aéreo tentou associar a decisão à narrativa de “excesso de judicialização”. A Associação Brasileira de Empresas Aéreas (ABEAR) alegou que o Brasil teria 5.000 vezes mais ações do que os Estados Unidos. Porém, tal comparação ignora que, nos EUA, a agência reguladora (DOT) aplica multas severas e prevê compensações automáticas; enquanto, no Brasil, o passageiro depende do Judiciário para garantir direitos básicos.

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Dados da própria ANAC revelam que condenações judiciais representam apenas 1,3% dos custos operacionais das empresas, desmentindo o argumento econômico utilizado para justificar reformas contra os consumidores.

Além disso, segundo dados oficiais do consumidor.gov.br, até agosto de 2025, foram registradas 631.155 reclamações envolvendo transporte aéreo, sendo que 91,34% dos passageiros afirmaram que tentaram resolver o problema diretamente com a companhia antes de recorrer à plataforma pública, evidenciando falha no atendimento das empresas.

Portanto, amparado na “questão em discursão”, estará vinculada a “responsabilidade civil por cancelamento, alteração ou atraso de voo por motivo de caso fortuito ou força maior”, sem afastar o dever de assistência, a responsabilidade por falhas operacionais internas e o regime de reparação integral previsto na Constituição e no CDC. Mais do que diminuir direitos, o setor aéreo precisa cumprir a legislação vigente com eficiência e boa-fé. O consumidor não é responsável pela judicialização: ele é vítima dela.

As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.

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