Goiabada cascão é um dos símbolos da identidade dos mineiros e já ultrapassou as barreiras de Ponte Nova -  (crédito: Marcos Michelin/EM/D.A Press – 3/210)

Goiabada cascão é um dos símbolos da identidade dos mineiros e já ultrapassou as barreiras de Ponte Nova

crédito: Marcos Michelin/EM/D.A Press – 3/210

 

Feita com goiaba e açúcar, a goiabada cascão da região de Ponte Nova vai parar nas telonas em breve. A Atlântico Filmes iniciou em 18 de março último a gravação de um curta-metragem que conta a tradição, a história e a importância da iguaria para a cidade. As filmagens seguem até hoje (22/3) e o lançamento está previsto para julho.


A diretora e proponente do projeto, Mônica Veiga, é natural de Ponte Nova e conta que o preparo desse doce é herança de sua família. “Lembro da minha mãe contando que, desde os 11 anos de idade, ela ajudava a minha avó a fazer goiabada na roça. Por meio de um edital da Secretaria de Cultura de Ponte Nova, através da Lei Paulo Gustavo, estamos preparando um documentário sensível e os próprios produtores da cidade são os atores principais”, explica.


Dalila Pires, produtora-executiva, acredita que o curta trará lembranças para gerações. “A goiabada cascão já faz parte da memória de muitas famílias. Vamos acompanhar a produção de cinco delas”, ressalta. O filme “Doce herança” traz histórias de como o doce permeia a vida dos produtores, passando de geração para geração. As memórias afetivas e as preparações tradicionais, que preservam a cultura gastronômica e valorizam os saberes e os fazeres, serão retratadas no documentário. Toda a produção do doce mantém viva a tradição rica que, mesmo com o passar dos anos, mantém características próprias.

 


O orgulho da população de Ponte Nova será captado e transportado para as telas. A produção vai contar como a cultura doceira se tornou tão importante para a economia e a identidade de Ponte Nova e de Minas Gerais.


A goiabada cascão tem outra história, de doce considerado divino e além-mar. A diferença que não era toda vendida, era presenteada aos amigos. A chef famosa do doce era a socialite Neném Gutierrez e a produção ocorria na sua fazenda, Morada Nova, perto de Sete Lagoas. A plantação era de dezenas de goiabeiras, ela controlava pessoalmente.


Neném ensinou às funcionárias o preparo do doce – simples, mas coberto de atenção. Quando as frutas começavam a amadurecer, a família podia se esquecer dela, que se mandava para comandar os fogões na fazenda. Para organizar tudo, mandou construir alguns galpões onde ficavam os fogões a lenha para fazer o doce.


As goiabas eram escolhidas uma a uma, antes de irem para os imensos panelões de cobre, onde o doce era preparado. Os galpões tinham paredes de azulejo. Os fogões a lenha eram um pouco mais baixos, combinando com o tamanho das doceiras, que mexiam nas panelas sem terem que se debruçar sobre o calor dos fogões. Uma vez pronto, o doce era colocado em latas de metal com o nome da fazenda. O que tornava fácil sua conservação e o envio para o exterior.


Outro detalhe da produção é que uma boa parte era destinada às funcionárias da fazenda, que ganhavam um bom dinheiro vendendo sua parte.


O filme conta toda a história de sua produção. Vale saber que há 10 anos o doce foi registrado pela Prefeitura de Ponte Nova como patrimônio cultural e imaterial brasileiro e aprovado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG). De acordo com o decreto, o modo de fazer a goiabada cascão tem valor gastronômico, antropológico e é elemento integrante da identidade cultural do município.


Tradição na cidade, o doce é produzido de forma autônoma por diversas famílias. O nome cascão vem da casca da fruta que fica mais dura e escura depois de cozinhada. Essa característica traz um aspecto mais artesanal para o doce que surgiu em meados do século 18 como forma de aproveitar as goiabas que sobravam nas fazendas.


A culinária foi a forma encontrada para conservar a fruta por mais tempo e gerar renda para os produtores. O doce representa a identidade e a resistência dos mineiros, sendo um símbolo de simplicidade, criatividade e persistência de um povo que soube transformar uma fruta simples em um doce sofisticado e saboroso que ultrapassou as barreiras de Ponte Nova.