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Estado de Minas ELEIÇÕES 2020

O que está por trás do fracasso do PT na eleição para a prefeitura de São Paulo

As decisões do partido são centralizadas pelo ex-presidente Lula e a atual presidente do partido, Gleisi Hoffmann, segundo membro do partido ligado à cúpula do PT. Segundo ele, isso estaria "queimando" grandes nomes petistas, como Chico Alencar, Fernando Haddad e Eduardo Suplicy


16/11/2020 08:56 - atualizado 16/11/2020 09:38

As eleições deste ano decretaram o maior fracasso petista das últimas décadas em São Paulo, o colégio eleitoral tido como um dos principais termômetros para as eleições nacionais. Neste ano o candidato petista Jilmar Tatto ficou em 6º lugar no pleito na capital paulista, com apenas 8,6% dos votos, atrás de nomes como Arthur do Val (Mamãe Falei), com 9,7% e Celso Russomanno, 10,5%.

É a primeira vez desde 1988 que um candidato do Partido dos Trabalhadores (PT) não fica em primeiro ou segundo nas eleições em São Paulo. Nas palavras de membros do alto escalão do partido e cientistas políticos ouvidos pela BBC News Brasil, "um grande fracasso".

O professor de História contemporânea da USP Lincoln Secco afirmou que o principal erro do PT foi não ter disputado o pleito com um candidato que estivesse na memória do eleitor e que dialogasse com a classe média progressista.

"Esse candidato era o Fernando Haddad. Ele é o grande derrotado desta eleição e agora vai desaparecer como uma figura nacional. O PT fez um cálculo político de que o Haddad poderia perder, mas o que ele não colocou nesse cálculo foi que outra pessoa de esquerda poderia vencer no lugar dele, no caso o Boulos. Porque ir para o segundo turno já é uma vitória", afirmou Secco.

No ponto de vista do professor da USP, o ex-presidente Lula também sai derrotado dessas eleições por ter "vendido" Jilmar Tatto como o nome forte do partido.

"Se o Boulos tiver uma boa campanha no segundo turno, ele passa automaticamente a ser a grande figura da esquerda em São Paulo. Talvez até com o apoio do Lula. É muito cedo para dizer se isso vai se tornar algo estrutural na política paulistana, mas é a primeira vez que uma candidatura à esquerda do PT passou a ocupar um espaço do partido", afirmou Secco.

O professor lembra, porém, que o PT vem tendo uma queda de votos gradual em São Paulo desde a vitória de Marta Suplicy, em 2000. Até mesmo na vitória de Fernando Haddad na capital paulista em 2012, o PT teve menos votos no 1º turno do que tinha antes. E em 2016 teve o pior desempenho, com 16% e uma derrota para João Doria no primeiro turno — algo que não ocorria desde 1992.

"Mas a gente ainda não sabe o quanto a vitória do Boulos é uma conquista dele ou do PSOL. Por isso é cedo para dizer se ele vai realmente substituir o PT. Agora se o PSOL ganhar, ele se torna a força de esquerda decisiva em São Paulo porque vai atrair os quadros do PT e ter uma posição de poder para disputar a reeleição", disse o professor.

"Um desastre"

Um estrategista da alta cúpula petista disse à BBC News Brasil sob a condição de anonimato que o fracasso do PT nas eleições municipais na capital paulista era tido como "uma bola cantada" dentro do partido e avalia a campanha como um grande "desastre".

"O PT se colocou mal em diversos aspectos. É um desastre a postura do partido sobre o governo Bolsonaro. Insistir em defender bandeiras de causas ultrapassadas: se foi golpe ou não, a prisão do Lula…", afirmou.

Na opinião desse membro do PT, o partido deveria ter atacado a gestão do atual prefeito tucano Bruno Covas com mais vigor, principalmente em relação às medidas adotadas em relação à pandemia do coronavírus.

"Não dissemos em nenhum momento que o Estado de São Paulo tem o maior número de casos e mortes por covid do Brasil, mas o Jilmar se calou", afirmou.

Atacar o trato da administração de Bruno Covas em relação à pandemia foi justamente a estratégia de Guilherme Boulos no primeiro discurso dele após o anúncio oficial de que ele iria para o segundo turno.

Pessoas que também participam das campanhas do PT adiantaram que o partido deverá usar a partir de agora o discurso de que ele está ressurgindo das cinzas, que ainda vai disputar a prefeitura em diversas cidades nestas eleições e que o pleito não foi um completo fracasso.

Uma pessoa ligada à cúpula do PT disse que a postura do partido está "queimando" grandes nomes petistas, como Fernando Haddad e Eduardo Suplicy. Ela afirma que um dos principais motivos é que não há diálogo e que todas as decisões da legenda são centralizadas pelo ex-presidente Lula e pela atual presidente do PT, Gleisi Hoffmann.

"O partido não censura eles, não se conforma até hoje que perdeu as ruas. Que perdeu o voto dos jovens em 2013. O Boulos ganhou esse espaço porque o PSOL não censura ele, não tem uma perseguição interna contra ele como acontece no PT", afirmou.

Sucesso entre jovens e mulheres

A cientista política e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) Camila Rocha de Oliveira, que estuda a votação na periferia, disse que Boulos conquistou o eleitorado petista principalmente por surgir como um rosto novo e ser "muito autêntico".

"O Boulos já estava consolidado na classe média e conquistou as periferias de última hora, o que fez ele disparar. As pessoas decidem o voto na última hora. Elas olham a pesquisa, veem que há chances e escolhem", disse a pesquisadora.

Ela afirmou, porém, que o sucesso do candidato do PSOL também tem uma forte relação com o candidato escolhido pelos petistas.


Guilherme Boulos, do PSOL, teve 20% dos votos em São Paulo, chegando ao segundo turno
Guilherme Boulos, do PSOL, teve 20% dos votos em São Paulo, chegando ao segundo turno (foto: Reuters)

"O Tatto não teve capacidade de mobilizar o PT. Ele está muito associado à imagem da política tradicional. E as periferias estão muito indignadas com essa política. Elas querem renovação. O Boulos traz isso mesmo tendo disputado presidência. Além de ter uma ligação com movimento de moradia, ele atraiu muitos jovens e mulheres, entre as pessoas que entrevistei."

A pesquisadora disse ainda que o fracasso petista nas eleições paulistanas pode ser lido como um termômetro da frustração generalizada com o PT. "Se não mudar essa oferta de candidatos e o discurso, essa tendência também deve se expressar em 2022", afirmou.


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