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Estado de Minas

Apurações compartilhadas tornam julgamento do mensalão um frankenstein jurídico

Compartimentação das apurações geraram um inquérito com começo, mas sem fim. Fontes dos recursos foram analisadas em um segundo inquérito que não foi anexado ao volume principal


postado em 29/07/2012 07:27


As provas juntadas ao processo do mensalão, que começa a ser julgado no dia 2 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), não atingem um importante aspecto do megaesquema de pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio político durante o primeiro governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva: a origem do dinheiro. As fontes dos recursos foram analisadas em um segundo inquérito, concluído em abril de 2011, que não foi anexado ao volume principal. Depois de quase um ano parado na Procuradoria da República, conforme registro de movimentação do STF, em fevereiro, o Ministério Público Federal pediu que fossem feitas várias cópias do inquérito e remetidas aos seus escritórios regionais para as providências nos estados. Passados sete anos do escândalo, a compartimentação das apurações terminou por transformar em um verdadeiro frankenstein o inquérito, que tem início mas não fim.

As intrincadas investigações tiveram início em 2005 pela Polícia Federal. Dois anos depois, o delegado federal Luís Flávio Zampronha – presidente do inquérito e então coordenador da Divisão de Combate a Crimes de Lavagem de Dinheiro da PF –, após identificar os operadores, colaboradores e beneficiários da proprina, remeteu o inquérito ao Supremo, com pedido de mais prazo para conclusão das investigações, que passaria a focar mais detalhadamente as fontes de financiamento do esquema. Ao contrário disso, a Procuradoria Geral da República entendeu que já tinha elementos suficientes para denunciar os envolvidos e acusou criminalmente 40 pessoas – entre políticos, diretores de banco, ministros e empresários – pelos crimes de improbidade administrativa e enriquecimento ilícito.

Junto com a denúncia, o Ministério Público Federal (MPF) requereu a continuidade das investigações, trabalho assumido pelo delegado Zampronha. Um inquérito separado, porém, apontaria a origem dos recursos movimentados, entre 2003 e 2004, pelo empresário e operador do esquema, Marcos Valério, dono da DNA Propaganda e SMP&B. As investigações concluíram que uma das principais fontes de financiamento do mensalão foram recursos de publicidade do Banco do Brasil, por meio do Fundo Visanet, criado para promover a bandeira de cartões Visa. Em seu relatório, Zampronha comprova que o banco estatal repassou à DNA Propaganda de Valério R$ 91,9 milhões dos R$ 151,9 milhões sacados da conta do fundo. No entanto, parte desses recursos nunca chegou ao destino verdadeiro: foi desviado para abastecer o esquema pelo publicitário e seus colaboradores. Para dar aparência legal, algumas operações eram para negócios fictícios ou empresas que não comprovaram a prestação de serviço.

Lucro moveu socorro ao PT

A segunda parte do inquérito, que ainda não produziu qualquer efeito legal, dedica tópicos distintos para descrever a atuação de cada um dos colaboradores para as sofisticadas movimentações financeiras, necessárias para ocultação da origem do dinheiro. O delegado federal afirma no relatório que o que moveu o empresário Marcos Valério a socorrer o PT era seu interesse em manter o contrato milionário de sua empresa com o Fundo Visanet, firmado no governo antecessor, e abocanhar novos contratos no governo petista. Em razão disso, se aproximou do tesoureiro do PT, Delúbio Soares, com a promessa de ajudar o partido a quitar uma dívida da campanha presidencial de 2002, no valor de R$ 50 milhões.

“A dispendiosa campanha eleitoral resultou em um déficit orçamentário nas contas da nova coligação partidária que assumiu o governo federal em 2003, causando fragilidade econômica que seria inteligentemente explorada por Marcos Valério, por meio de uma ação de cooptação financeira”, diz o relatório de Zampronha. O texto traz ainda como conclusão que, além da manutenção dos contratos, Valério pretendia “a criação de uma nova rede de influência política a ser explorada ao longo dos anos”. No entanto, a Polícia Federal conclui ainda que a “referida operação de aproximação envolveu o aporte de um volume crescente de dinheiro, cujos repasses foram aumentando à medida em que se estreitavam os laços entre Marcos Valério e o número político do governo Lula”.

Fonte alternativa de financiamento

Em consequência, diz o documento, o empresário foi obrigado a alternar as fontes de financiamento à medida que crescia a necessidade de maior aporte de recursos. “Inicialmente, tiveram (os valores) como origem o próprio excedente financeiro gerado por contratos de publicidade mantido pelas empresas de Marcos Valério”, afirma a PF. Com o crescimento da rede, Valério passou também a captar recursos por meio de empréstimos em instituições financeiras privadas, as quais se beneficiariam do lobby do empresário junto ao governo, de olho em empréstimos consignados para servidores entre outros. Entre as operações financeiras de Valério, estão dois empréstimos no Banco Rural e BMG, que mantiveram a roda girando. As operações, no entanto, segundo a PF, não tiveram qualquer irregularidade e cumpriram todas as regras instituídas pelo Banco Central e agências reguladoras do setor. Na sexta-feira o relator do mensalão, ministro Joaquim Barbosa, acatou pedido da defesa de Valério e concordou em anexar ao processo decisão do Tribunal de Contas da União, que considerou regular o contrato firmado em 2004 pela DNA e o BB. Denúncia do MPF não incluiu sócios da DNA Propaganda.

Entre as manobras contábeis para alimentar o esquema, o relatório descreve uma ocorrida em 2003, em que a DNA se “apropriou” diretamente de recursos para ações de marketing do Banco de Brasil, ao fazer uma retirada de mais de meio milhão de reais, depois de um contrato de R$ 2,5 milhões assinado com uma casa de shows. As investigações apontaram também que entre as 15 empresas que mais receberam recursos do Fundo Visanet, algumas são fantasmas como a Carre Airports, que abocanhou R$ 1 milhão.

A denúncia

As 40 pessoas acusadas de envolvimento no mensalão foram denunciadas em março de 2007, pelo então procurador-geral Antônio Fernando de Souza. Entre os acusados estavam o então ministro da Casa Civil, José Dirceu, hoje deputado federal cassado, o ex-deputado federal José Genoíno, então presidente do PT, o secretário-geral do partido, Sílvio Pereira, o tesoureiro petista Delúbio Soares, o empresário Marcos Valério, além de parlamentares de cinco partidos: PP, PL, PTB, PMDB e PT. De acordo com a denúncia, “a organização criminosa” era composta por três núcleos de atuação: o central, integrado por dirigentes do PT e do Poder Executivo; o publicitário, comandado por Marcos Valério; e o financeiro, que envolvia instituições financeiras.


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