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Estado de Minas PENSAR

Em entrevista de 2016, José Murilo de Carvalho relembra suas origens

Depoimento a Rogério Faria Tavares na sede do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro passa também pela formação acadêmica do historiador mineiro


18/08/2023 04:00 - atualizado 17/08/2023 23:29
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José Murilo de Carvalho
José Murilo de Carvalho (foto: Quinho)

 

Das Minas da terra para o mundo 

 

Rogério Faria Tavares

Especial para o EM

 

Na longa entrevista biográfica que fiz com José Murilo de Carvalho, em julho de 2016, na sede do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), ele se deteve longamente nas origens de sua família. Relembrando que os Ribeiros maternos e os Carvalhos paternos vieram para Minas Gerais no bojo da forte migração dos minhotos para o estado, ainda no século 18, ele creditou a essa “onda” o poder de formar uma “segunda Minas”, a que chamou de “Minas da terra', sucedânea das 'Minas do ouro”. Essa nova configuração gerou uma sociedade estável, baseada na agricultura de consumo (abastecia até o Rio de Janeiro), de valores religiosos e morais fortes e de famílias sólidas, nada tendo que ver com o período anterior, marcado pela “tradição de rebeldia”. Envolvida no cultivo de cereais e na criação de gado leiteiro, sua linhagem se fixou no Campo das Vertentes, região de que São João del-Rei e Barbacena são as principais cidades. Nascido no meio rural, José Murilo não fez o curso primário. Alfabetizado pelo pai, viveu na fazenda até os 10anos, quando iniciou périplo por três internatos franciscanos: o primeiro em Santos Dumont, o segundo perto de Garibaldi, no Rio Grande do Sul, e o último em Divinópolis. 

Leia: José Murilo de Carvalho: o homem que nos ajudou a decifrar o Brasil 

Leia: Conheça os livros que tornaram José Murilo de Carvalho uma referência

 

Seu próximo passo foi tentar o vestibular para economia. Reprovado por não resolver uma equação matemática, prestou novo concurso para sociologia e política, alcançando a segunda colocação. Parte de "Contribuições para a história do IHGB", livro que lancei em 2018, o depoimento de José Murilo também incluiu passagens sobre sua experiência universitária nos turbulentos anos do Golpe de 64, além de reflexões sobre sua primeira pesquisa, de 1966, que resultou no texto publicado pelo professor Orlando de Carvalho na Revista Brasileira de Estudos Políticos: "Barbacena: a família, a política e uma hipótese". 

 

Em fina análise sobre aquele momento histórico, não se esqueceu de mencionar sua atividade como membro da Ação Popular, quando, com o apoio da Igreja, percorreu o interior mineiro fomentando a formação de sindicatos rurais. Responsáveis por consolidar sua vocação para a vida acadêmica, o mestrado e o doutorado em Stanford abriram caminhos para o intelectual que lecionou por décadas no Rio de Janeiro e nas melhores universidades do planeta, e escreveu artigos e livros fundamentais para a compreensão da história brasileira. Seu legado é incontornável e perene. De sua personalidade refinada, generosa e gentil ficará uma saudade terna e eterna. 

 

A seguir, leia alguns trechos do depoimento de José Murilo de Carvalho.

 

Rogério Faria Tavares é jornalista, doutor em literatura e presidente emérito da Academia Mineira de Letras 

 

Origem da família

 

"A minha família ocupa a região de Minas Gerais que se chamava Campos do Mantiqueira. Agora é a cidade de São João del-Rei, Barbacena... aquele (miolo). A família, tanto os Carvalhos quanto os Ribeiros, que também é de minha mãe, fazem parte de uma forte migração portuguesa para Minas, já no século 18. Na época já existia a vila – em direção ao ouro, né? Mas foram suficientemente espertos pra perceber que havia uma outra maneira de fazer, que não era minerar, mas alimentar os mineiros. Então, começaram a se expandir em torno de São João del-Rei e ocuparam ali uma região vasta, com dezenas de fazendas de cereais e depois de gado leiteiro. Era uma segunda Minas que se formava, ao lado da Minas do ouro, o que eu chamei da 'Minas da terra', que começou a se formar ali, e que depois já se tornou predominante com a queda da produção do ouro, já final do século 19, início do século 20. Essa Minas da terra se expandiu para o Sul de Minas também, Zona da Mata e toda essa região que passou a abastecer o Rio de Janeiro, quando a corte veio (de Portugal). Então, em propriedades de terra, tamanho médio das terras, havia, obviamente, escravidão. Mas, e tem dados sobre isso, não se comparava com a escravidão do açúcar no Nordeste e nem à escravidão do café. Eram plantéis pequenos de escravos. Quem tinha trinta escravos era muito, a maioria tinha menos. Porque era essa agricultura de consumo: cereais em geral e gado leiteiro."  

 

Longe da tradição

 

"Essa Minas (da família) é marcada por certos traços que às vezes são incorporados. Outro que se chama mineiridade – eu não gosto muito da expressão –, mas que não tem nada a ver com a tradição mineira do século 18. Que era essa uma tradição rebelde, revolucionária e tudo. Quer dizer, não havia praticamente família naquela região. Essa nova, não. É estável, com famílias sólidas, com valores religiosos muitos fortes... E um traço que é muito interessante, que é extrema honestidade nas negociações. A história do fio da barba (bigode) como garantia do negócio."

 

Da fazenda ao internato

 

"Até os dez anos de idade eu fiquei na fazenda. Não fiz..., nunca fiz o ensino primário, nunca fui à escola. O meu pai, que era dentista, nos ensinou a ler e a escrever lá no meio das vacas. Fomos aprendendo dessa maneira, até que nos mandaram para o internato. Aí foi outra história e começa outra vida. Fiz o internato em Santos Dumont. Era um seminário franciscano. Quando me deixaram lá com o meu irmão mais velho, meu tio nos levou e foi embora. Nós choramos uma semana. Fiquei bastante tempo, cheguei a ir para o Rio Grande do Sul, no mesmo esquema, morei lá uns três anos, perto de Garibaldi, depois para Divinópolis e depois saí. E fiz vestibular para a Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG."

 

Chegada à UFMG

 

"Visitei a Faculdade de Ciências Econômicas, que era modelo, certamente, em termos de funcionamento. Nossas universidades, nossas faculdades em Belo Horizonte eram modelo. O dono dela era um déspota esclarecido... (Ivon) de Magalhães, que era um déspota esclarecido, a faculdade funcionava uma beleza, né? Os funcionários de uniforme, alunos chegavam na hora, todos chegavam na hora, havia papel higiênico nos banheiros... Tentei o vestibular para economia, primeira tentativa. Mas eu tinha feito equivalente ao clássico. Então havia prova oral. E quando o professor mandou resolver uma equação de segundo grau na prova oral, eu naufraguei. E o professor foi até gentil, ele falou: 'Olha, assim não dá'. Aí, logo a seguir, houve segunda chamada, aí eu fiz para sociologia e política. Aí eu tirei de letra. Ganhei uma bolsa e, com isso, eu pude terminar o curso e fazer como aluno bolsista. E foi como obrigação dessa bolsa que eu escrevi um trabalhinho ('Barbacena antes de Barbacena', publicado em 1966). Eu tenho saudades desse tempo. No Brasil, foi a única escola que realmente me deixou saudades. Porque realmente funcionava bem. Além disso, eram tempos agitados, né? Tempo agitados. Eu entrei lá em 1961 e formei no final de 1965. Uma agitação muito grande estudantil, os grupos de esquerda e de direita se enfrentando, mas também a esquerda contra a esquerda. Me formei em 65, e logo aconteceu o quê? Como consequência da revolução cubana, os Estados Unidos passaram a dar mais atenção ao Brasil. E a Fundação Ford, que não era do governo, era coisa particular, tinha decidido, dar bolsas de estudos para brasileiros. Fui selecionado para fazer o doutorado na Universidade de Stanford. E lá fui eu, do Curral da Santa Cruz, fazenda, para Stanford (onde fez mestrado e doutorado em ciência política)."

Londres e Princeton

 

"Foi em Londres (no pós-doutorado) que passei realmente a estudar a história da América Latina. Lá, sim, aí eu comecei a fazer uma guinada da circunstância política para a história. Mas foi uma coisa curta. O que me marcou realmente foi a experiência de um ano como visitante no Instituto de Estudos Avançados de Princeton. É um instituto com um grupo pequeno de pesquisadores, que anualmente chama vinte, trinta pessoas no mundo inteiro. Fiquei absolutamente encantado com essa experiência. Um historiador que ficou muito conhecido, Robert Darnton, do famoso texto 'O massacre dos gatos', apresentou lá a primeira versão. Clifford Geertz, o antropólogo, que ficou depois também muito conhecido, influente, estava lá, assim como Albert Hirschman, economista dedicado à América Latina. Colegas indianos, holandeses, franceses... Convivi um ano com essas pessoas. Abriu a cabeça além da sociologia e da política, para a história, para a história das artes, para uma série de coisas." 

 

De volta ao Brasil

 

"Voltei ao Brasil no finalzinho de 1968, logo depois do golpe no golpe.  Já tinha sido inaugurado o Departamento de Ciência Política (da UFMG) como consequência dessa doação da Fundação Ford Nessa disputa lá, acabou ficando na Faculdade de Filosofia (e Ciências Humanas da UFMG, Fafich), não na Faculdade de Ciências Econômicas, porque o pessoal da Ciências Econômicas expulsou... Eles expulsaram o curso de sociologia e política de lá, porque os alunos criavam muito problema. Então o departamento foi localizado na Fafich. Funcionou um tempo na reitoria, depois foi pra Fafich ali na Rua Carangola. Você pode imaginar o choque que eu senti. Porque (a faculdade de) Ciências Econômicas era muito organizada, a Fafich realmente nem tanto, né? Nem tanto. Além disso, eram os anos do AI-5. E foi um choque enorme. Enorme. Porque era o oposto inclusive do que eu tinha vivido na Ciências Econômicas. Os alunos não chegavam, ou chegavam e saíam na hora que queriam, ficavam conversando em sala de aula... E a parte política. Que quando eu estava na Ciências Econômicas, aluno que queria ter liderança estudantil, ele tinha que ser o primeiro aluno na sala de aula. Senão, ele não tinha autoridade. Quando eu cheguei lá na Faculdade de Filosofia, era o oposto: aluno que queria ter liderança estudantil não podia... não convinha nem ir à sala de aula. Porque ir à sala de aula significava que ele estava ‘assim’ com os homens. Quer dizer, ele era conivente com as pessoas que representavam o poder, alguma coisa. Então, era um inferno para trabalhar. Foi realmente uma experiência muito difícil."

 

Estudo do Império

 

"Fui para Stanford já com um projeto de dar continuidade ao que tinha começado a fazer em Minas, que é o estudo de poder local. Mas mudei totalmente o meu tema. Decidi estudar a elite política do Império. E, com isso, eu ficava dependendo muito de atividades no Rio, que tinha a Biblioteca Nacional, o Arquivo Nacional... Então resolvi deixar a UFMG e ficar no Rio em uma instituição particular, que era o Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro). Aí continuei dando mais ou menos as mesmas aulas. E aí era uma instituição que funcionava no modelo americano, só tinha pós-graduação. Então não tinha graduação e quase todo mundo era formado nos Estados Unidos. E o Iuperj teve um impacto enorme na área de sociologia e ciência política, sobretudo. Terminei a tese 'A construção da ordem', que saiu em dois volumes. A segunda parte, 'Teatro de sombras', saiu depois. E somente depois é que os dois livros foram fundidos em um só."

 

Do Império à República

 

"Uma ex-aluna do Iuperj estava dirigindo o Centro de Pesquisa da Casa Rui Barbosa, aí ela me convidou para lá. Estava ali o arquivo do Rui Barbosa, que é muito grande, e tem uma parte razoável do período imperial, mas o forte do arquivo é a atuação dele na República, a partir do ministro da Fazenda, ministro da República, enorme. Então, cronologicamente, fui seguindo e passei a estudar a República. E dessas pesquisas saíram dois livros: ‘Os bestializados’ e ‘Formação das almas’. Fiz também a redação de um outro ensaio, que era o 'Cidadania no Brasil'." 

 

Perplexidade com o golpe militar  

 

"Quando veio (o golpe militar de) 1964, a sensação que eu tive foi de perplexidade. Eu me lembro de a gente andar por Belo Horizonte, no dia 1º de abril, perplexo. Não é que as pessoas não esperassem o golpe. Havia uma expectativa. Expectativa havia. Pessoas que falavam na viabilidade do golpe. Mas ninguém previu o tipo de golpe que foi dado. Isso é... Os militares tomaram o poder e ficaram no poder. Isso era inédito no Brasil. Em 1930 não foi assim, em 1937 não foi assim, em 1945 não foi assim, em 1954 não foi assim. Aí comecei a me perguntar: 'Mas por que ninguém previu isso?' Como aluno eu comecei (a pensar): ‘Não, então eu vou ver que tipo de gente é essa, o que aconteceu no Exército que fez eles mudassem de posição em relação à intervenção política’. E aí comecei a estudar os militares. O Boris Fausto também havia me pedido um estudo sobre militares. No CPDOC (Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil) eu expandi essa pesquisa para o período de 1930 e um pouquinho... pelo menos até 1945, expandi muito essa pesquisa, que deu um trabalho sobre os militares nesse período, e que depois deu um livro ('Forças armadas e política no Brasil')."

 

Estudo da elite

 

"Resolvi realmente enfrentar esse tema (estudo das elites) porque me atraía, mas era politicamente ingrato. Naquele momento, já durante a ditadura, estudar a elite era uma coisa que não caía bem. Nem hoje. O que estava estudado eram personagens, biografias, pessoas. Mas não a elite como um coletivo. Resolvi fazer isso em duas partes da tese. Uma realmente é o papel dessa elite e a outra parte é a política desenvolvida, a política imperial. Acho que pela primeira vez eu botei isso também em números. Que aí realmente vinha da minha formação de ciências sociais. E uma hipótese central que dirigia. Então, você pode dizer que realmente é uma tese que é tanto história, mas é de história política. Porque o gancho da coisa é uma teoria: o papel da elite em determinado tipo de país. Estudei até a Turquia pra ver esse tipo de impacto. A pesquisa foi histórica, mas também com esse viés um pouco estatístico. Tanto que tem muita tabela. Historiador não fazia tabela. Nem sabia fazer. Até hoje, a maioria não sabe fazer."

 

Elite social, elite política

 

"A elite definida como eu defini: ministros, deputados, senadores, conselheiros de Estado. Não elite social, elite política. E as duas nem sempre coincidiam. Esse inclusive é um grande ponto. Até que ponto elas (as duas elites) coincidem ou não coincidem? Cheguei às conclusões e descobri esse impacto tremendo de Coimbra (escola portuguesa). Até metade do século 20, boa parte da elite tinha sido ainda formada em Coimbra. Até a formação da criação das escolas (de direito), em 1928, que é só a partir de 1928, 1929, 1930, a partir do início... já na Regência que este pessoal de São Paulo começou a entrar na política, né? Alguns como o próprio Visconde de Uruguai, que começou em Coimbra e terminou em São Paulo. As evidências são bastante fortes nessa direção. E a segunda parte é a política. Aí entra a política, (pesa) a abolição, problema do orçamento imperial, etc.  Eu mostro realmente que embora, não há dúvida, a economia fosse dominada pela escravidão, latifúndio, comércio, etc., mas na elite, nas decisões, havia uma mistura grande. Que havia realmente um grupo de burocratas, sobretudo, o pessoal em torno do imperador, que essas posições se chocavam. Ao ponto que o Ventre Livre foi uma batalha extraordinária no Congresso, talvez a maior batalha no Congresso brasileiro, em termos inclusive de duração e intensidade dos debates, manifesto dos populares brasileiros, etc. Foi um debate interessante, em que, no final, claramente a vontade do imperador, via (Visconde) Rio Branco, acabou derrotando os interesses de suas elites."

 

De baixo para cima

 

"(Com os livros 'Os bestializados' e 'A formação das almas') Eu inverti um pouco a postura, em vez de olhar de cima pra baixo, eu passei a olhar de baixo pra cima. Ou pelo menos como é que os de baixo se relacionavam com os de cima. Isso está, sobretudo, em 'Os bestializados'. Com a República foi proclamada essa relação entre povo e política...  Nesta pesquisa, eu, de novo, para surpresa minha, encontrei os positivistas como atores políticos. Na faculdade, positivismo era uma palavra feia. Era o oposto da dialética. Então, dialética era bom, positivismo era ruim. Mas não encontrei positivismo como doutrina, mas encontrei com os positivistas. E os positivistas são ortodoxos, né?  E isso me abriu muito a cabeça. E aí já com a influência de Princeton, da área das artes, etc., para o lado, digamos, efetivo da política. Que o Comte pós-Clotilde levou, que... Comte da Religião da Humanidade, não o Comte do Curso de Filosofia Positiva, mas o Sistema de Política Positiva, ele passou a valorizar muito o lado afetivo na política. Daí que ele colocou a mulher como o centro de tudo, a mulher como símbolo da humanidade, a humanidade como mulher. Quer dizer, fez uma religião laica. Tirou a Nossa Senhora, cortou a transcendência e botou a imagem, que é a imagem de Clotilde como a deusa, a deusa da humanidade. Então, a humanidade se transformou em deusa. E eles levavam isso a extremos. Tanto que, por exemplo, em enterros, eles não falavam "a deusa", eles falavam "adeusa". A incorporação do proletariado, a valorização da mulher, a proteção aos índios, o pacifismo... Eles fizeram quase tudo certo, né? Certo, do ponto de vista de hoje. Com algumas exceções... Porque o positivismo tinha essa ideia da ditadura republicana. Não é a ditadura no sentido de hoje, mas era um Executivo muito forte. Isso aí foi uma herança deles que talvez o Getúlio (Vargas) tenha juntado com a tradição gaúcha dos caudilhos e talvez tenha afetado. Mas afetou também a política trabalhista. Enfim. Na minha visão, o que há de mais interessante tem um pouco de método também. A imagem era usada sempre como ilustração do texto. Nisso eu aprendi, neste texto, a usar a imagem com o texto. Tem Monumento ao Floriano (Peixoto, no Centro do Rio de Janeiro). Você não bota lá a imagem... Você pega o monumento e lê. Inclusive o Movimento Positivista usava muito para isso, porque eram todos didáticos. Isso foi realmente uma proposta dos positivistas, que, como diz um historiador português, o (Fernando) Catroga, que também, sem que eu soubesse, trabalhou muito nisso. Porque ele trabalhava sob o ponto de vista do afeto na política. Quer dizer, a política não apenas como convencimento racional, mas como mobilização do sentimento. E produção do imaginário, que você faz pelas artes. Eles trabalhavam, sobretudo, pintura, escultura... Pintura, escultura e arquitetura e a criação de mitos, de heróis – Tiradentes – e de símbolos como a bandeira. A ideia de valorização da ideia de pátria e a ideia de República como dedicação ao bem público. Eu costumo dizer que eles eram ETs ao valorizar o serviço público. Você tem que se dedicar ao coletivo: à humanidade, à pátria e deixar em segundo lugar o seu interesse pessoal. Quer dizer, isso hoje no Brasil é um espanto, quem vai pensar dessa maneira?" 

 

Visão da cidadania

"O meu livro ‘ A cidadania no Brasil: o longo caminho’  é uma panorâmica e foi feito por encomenda de um colégio do México. Foi publicado em espanhol em primeiro lugar. Parte de certos conceitos, dos tipos de direitos, civis, políticos e sociais, e verifica como isso se verificou ao longo da história do Brasil. Não é um texto acadêmico. Praticamente não tem notas de pé de página. É para um público amplo. A ideia realmente um pouco era essa: como, na descontinuidade, que é a marca da história, é possível ver certos traços de continuidade, mas traços que são constantes e que sofrem altos e baixos. Depois saiu a edição em português e, pelo que eu ouço das editoras, esse livro é usado bastante em curso de graduação. Inclusive nas faculdades de direito." 

 

Finalidade da história

"Eu acho muito importante para a história alcançar um público maior. É uma discussão que eu tenho com os colegas, há uma certa má vontade de alguns. Todo mundo hoje quer o monopólio da história para quem tem diploma de curso de história. Nesse processo cria-se quase um dialeto do historiador. E com todo esse aparato de (anotações), etc., realmente torna a leitura da maioria desses textos um tanto difícil mesmo, um tanto penosa. (Principalmente), o contexto que vai para as revistas acadêmicas não atinge um público geral. Eu acho que se pode fazer as duas coisas."

 

 

Livro de depoimentos

As declarações de José Murilo de Carvalho que o Pensar publica hoje estão no depoimento que o historiador concedeu a Rogério Faria Tavares e foi publicado no livro “Contribuições para a história do IHGB”. Lançado em 2018, o volume reúne entrevistas de nomes como Angelo Oswaldo, Arno Wehling, Candido Mendes de Almeida, Marcos Azambuja e Pedro Corrêa do Lago, todos sócios do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. A íntegra dos depoimentos está disponível, em vídeo, para consulta na Biblioteca do IHGB em sua sede, no Rio de Janeiro. 


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