(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas editorial

De volta aos trilhos?

No Brasil, a fabulosa malha ferroviária que interligava o país foi destruída


20/06/2023 04:00
667


O historiador inglês Tony Judt, que faleceu precocemente, em 2010, aos 62 anos, dedicou dois ensaios ao tema das ferrovias, publicados postumamente, no livro “Quando os fatos mudam”. Considerado o maior especialista do pós-Segunda Guerra Mundial, faz um diagnóstico preciso da decadência das ferrovias a partir da década de 1950: “A cidade moderna havia nascido a partir do transporte sobre trilhos (….) Mas, ao tirar as pessoas do campo e jogá-las na cidade, ao drenar a área rural de comunidades, povoados e trabalhadores, o trem tinha começado a destruir sua própria razão de ser: o movimento das pessoas entre as cidades e de distantes distritos rurais para centros urbanos”.
 
Para ele, no ensaio “Tragam os trilhos de volta", o grande propiciador da urbanização acabou sendo uma vítima desse mesmo processo. “Com as viagens obrigatórias muito longa ou muito curta, fazia mais sentido realizá-las de avião ou de carro. Mesmo o transporte de cargas estava sendo ameaçado pelo baixo custo do serviço oferecido pelos caminhões, apoiado pelo Estado na forma de autoestradas”, avaliava.
 
Por todo lugar, as ferrovias foram vítimas de uma dupla falta de fé: nos benefícios proporcionados pelos serviços públicos; e no planejamento urbano, no espaço público e patrimônio arquitetônico e cultural. “Entre 1955 e 1975, um misto de modismo anti-histórico e egoísmo corporativo levou à destruição de um notável número de estações terminais, algumas espetaculares, como o Euston (Londres), Gare du Midi (Bruxelas), Penn Station (Nova York)”.
 
Judt morreu em 2010 e deixou um livro-testamento chamado “O Chalé da Memória”, no qual conta como, menino, pegava trens em Londres e ia de um lado a outro do país, vendo as paisagens, encontrando as pessoas. Trens conectavam cidadãos, lugares e ideias, traziam informação e gente diferente, transformavam províncias em centros vibrantes. Em todo o mundo, as estradas de ferro aceleram a vida e o processo civilizatório. Eram a internet da época.
 
No Brasil, a fabulosa malha ferroviária que interligava o país foi destruída. Talvez o maior símbolo de abandono seja a estação central da antiga Estrada de Ferro Leopoldina, no Rio de Janeiro, um patrimônio arruinado. Em Brasília, o destino dado à funcional e modernista Estação Rodoferroviária, na qual deságua o Eixo Monumental, só não é igual porque, ironicamente, lhe foi atribuída a função pública de cuidar da habilitação dos motoristas de automóveis. Em Minas, pouco resta da malha ferroviária que cortava o estado e interligava cidades de todas as regiões. Restam estações abandonadas, como triste lembrança.
 
Entretanto, não percamos as esperanças no brado de Tony Judt. Na sexta-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva inaugurou a ligação ferroviária entre os portos de Itaqui, no Maranhão, e Santos, em São Paulo. Depois de mais de 30 anos, a Ferrovia Norte-Sul se tornou realidade. Vai acelerar o desenvolvimento da região Centro-Oeste, fundamental para a agropecuária.
 
Com o Terminal da Rumo de Rio Verde (GO), a ferrovia completa 2.257 quilômetros e atravessa quatro regiões. Com forte produção de commodities – como soja, milho e algodão –, Goiás, Mato Grosso e Minas Gerais se conectam mais intensamente, pelo Sudeste e pelo Norte, com a economia global.
 
Iniciada em 1986, a Ferrovia Norte-Sul foi uma ousadia do então presidente José Sarney, que enxergou muito mais longe, porém, chegou a ser até ridicularizado. Estávamos no auge do sucateamento das nossas ferrovias. Ganhou impulso quando o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), no segundo mandato de Lula, então a cargo da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, virou realidade. No seu governo, a ex-presidente apostou nessa parceria público-privada.
 
O trecho de Açailândia (MA) a Porto Nacional (TO) é operado pela VLI Logística. A partir de 2019, a operadora logística Rumo passou a gerir o ramo Sul do empreendimento, com 1.537 quilômetros de trilhos. No governo Bolsonaro, construiu novos terminais em São Simão, Rio Verde e Iturama.
 
Nesse período, a empresa investiu R$ 4 bilhões em obras de infraestrutura, terminais e material rodante. Mais de 5 mil empregos foram criados. Só em 2022, cerca de 7,8 milhões de toneladas de soja, milho e farelo foram transportadas pelos novos trechos da ferrovia,  o que representou um aumento de 25% do total exportado por Goiás em comparação aos anos anteriores.


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)