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Estado de Minas COVID-19

Brasil perde tempo vital com politização da vacina e falta de coordenação

É para esses equívocos que alertam especialistas ouvidos pelo EM, enquanto Reino Unido começa a vacinação na próxima semana


03/12/2020 04:00 - atualizado 03/12/2020 00:48

Testes da vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford e o grupo AstraZeneca: o Ministério da Saúde espera 15 milhões de doses entre janeiro e fevereiro(foto: Vincenzo Pinto/AFP)
Testes da vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford e o grupo AstraZeneca: o Ministério da Saúde espera 15 milhões de doses entre janeiro e fevereiro (foto: Vincenzo Pinto/AFP)


A corrida mundial pela vacina contra a COVID-19 avança com a autorização dada ontem no Reino Unido ao uso emergencial do imunizante produzido pela farmacêutica Pfizer, enquanto o Brasil ainda vive incertezas quanto à imunização para barrar o novo coronavírus. Embora o Ministério da Saúde tenha apresentado, na terça-feira, um calendário que prevê a vacinação de grupos prioritários – como idosos de 75 anos ou mais – a partir de março, o processo depende de uma série de fatores, como a aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Especialistas ouvidos pelo Estado de Minas alertam que, para acelerar a busca por uma vacina, o país precisa abandonar práticas como a politização do tema, diferentemente do que faz o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), por exemplo, ao descartar a compra da substância de origem chinesa.Ontem, no Congresso Nacional, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, não descartou por completo a possibilidade de o país utilizar a vacina da Pfizer, produzida em parceria com a alemã BioNTech.

Contudo, o produto necessita de câmaras ultrafrias, a cerca de 70°C negativos, para ser armazenado. Luana Marinho, infectologista e consultora em Saúde Pública Global do Banco Mundial, crê que a exigência, fora dos padrões adotados pelo Programa Nacional de Imunizações (PNI), pode dificultar ao acesso ao imunizante. “A chance de perder milhões de doses é muito grande. Não é uma vacina barata, ainda que seja comprada via CoVax (consórcio liderado pela Organização Mundial de Saúde). É diferente de fazer isso na Grã-Bretanha, país menor e com maior adaptabilidade à cadeia de ultrafrios”, explica ela, que enxerga lógica no cronograma estruturado pelo Planalto.

Pazuello afirmou ainda que o Brasil deve receber 15 milhões de doses da vacina produzida pela Universidade de Oxford e pelo laboratório AstraZeneca entre janeiro e fevereiro de 2021. Carlos Starling, médico integrante do Comitê de Enfrentamento à pandemia instituído pela Prefeitura de Belo Horizonte, diz que a iniciativa privada pode auxiliar o país a importar vacinas tidas como complexas. “Nenhuma vacina pode ser descartada. Nem a que exige um processo de acondicionamento mais rigoroso, como a da Pfizer. Se o governo não tem logística, o setor privado tem. Há vacinas que podem ser oferecidas à população via setor privado. Não necessariamente precisa ser só pelo SUS”.

Para Starling, o país está atrás de outras nações na corrida rumo à solução para o vírus. O especialista atribui a desvantagem à politização do tema. “Preconceito contra vacina ‘X’ ou ‘Y’ é atraso de raciocínio e crime de saúde pública. Se temos instituições que vão avaliar a qualidade das vacinas, não faz sentido ter preconceito contra a vacina produzida em determinado local”, diz.

Flávio Fonseca, virologista da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), tem opinião semelhante. “É preciso entender que vamos ter de usar mais de uma vacina. Isso vai levar tempo para que a gente consiga vacinar toda a população”, salienta. De acordo com o que disse o ministro Eduardo Pazuello na audiência promovida pelo Parlamento algumas propostas de imunizantes apresentadas ao país são “pífias”. “Ficou muito óbvio que são muito poucas as fabricantes que têm a quantidade e cronograma de entrega efetivo para nosso país. Quando a gente chega no fim das negociações e vai para cronograma de entrega, fabricação, os números são pífios. Números em grande quantidade, se reduz a uma, duas, três ideias".

Infectologista e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Geraldo Cunha Cury acredita que o Executivo federal não será capaz de resistir à pressão caso vacinas não adquiridas pelo Ministério da Saúde, como a chinesa CoronaVac — alvo de estudos no Instituto Butantan, em São Paulo, recebam o aval da Anvisa. “Se ela mostrar eficácia e for registrada na Anvisa, não tenho nenhuma dúvida de que o governo brasileiro será forçado, pela população, pelo Parlamento e pelo STF, a comprar e distribuir”, projeta.

Plano ‘B’

Enquanto o governo federal cogita suas possibilidades, outras esferas do Executivo se movimentam. O prefeito de Belo Horizontino, Alexandre Kalil (PSD), garantiu reservas para comprar vacinas, se for preciso. Enquanto isso, estados como Paraná e São Paulo costuram acordos com Rússia e China, respectivamente, para receber os modelos fabricados pelos países. “Cada lugar tem seu plano B, pois não confia no plano A, do ministério. Quando você tem um governo federal de política errática, é obrigatório ter um plano B”, opina Starling.

Para Luana Mariano, do Banco Mundial, a esfera federal precisa tomar as rédeas do processo, para evitar confusões entre estados e municípios. “É preciso que haja uma customização das necessidades, mas também uma coordenação política. Toda incoordenação favorece a confusão, a falta de comunicação e fragiliza a resposta em saúde pública”, sustenta.

A especialista defende maior participação do Brasil na busca por soluções para a pandemia. Na visão dela, entretanto, faltam condições para tal. “Existe uma fuga de cérebros e um subfinanciamento crônico da ciência e da saúde no Brasil que nos impede de ter esse tipo de protagonismo. Isso não se resolve da noite para o dia. É investimento em educação, e não só em ciência”, salienta.


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