Segundo um relatório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) sobre as operações de busca e salvamento e a proteção de migrantes no Mediterrâneo, as políticas e práticas atuais "fracassam na hora de dar prioridade à vida, à segurança e aos direitos humanos das pessoas que tentam cruzar da África à Europa".
O documento, publicado nesta quarta-feira (26), indica que "não se trata de numa anomalia trágica, mas de uma consequência das decisões políticas e de práticas concretas das autoridades líbias, dos Estados-membros e das instituições da União Europeia, e de outros atores".
Concentrado no Mediterrâneo central, o relatório de 37 páginas analisa o período que vai de janeiro de 2019 a dezembro de 2020. O texto chega à conclusão de que a Líbia não é um lugar seguro para o desembarque de migrantes resgatados no mar e que as políticas e práticas atuais no Mediterrâneo central favorecem mais as violações e abusos dos migrantes do que o contrário.
- Sofrimento evitável -
Com o relatório em mãos, a comissária dos direitos humanos das Nações Unidas, Michelle Bachelet, pediu a Tripoli e Bruxelas que reformem urgentemente suas políticas de busca e salvamento.
"A verdadeira tragédia é que uma grande parte do sofrimento e das mortes na rota do Mediterrâneo central é evitável", segundo a ex-presidente chilena.
"Todo ano há naufrágios porque o socorro chega tarde demais ou não chega", disse a alta comissária.
"Os que são socorridos geralmente têm que esperar dias ou semanas para desembarcarem em total segurança, ou, como costuma ser o caso, são reenviados à Líbia que, como já foi alertado em várias ocasiões, não é um porto seguro", alertou.
O relatório indica que os Estados-membros da UE reduziram suas operações de busca e salvamento, e as organizações humanitárias foram impedidas de realizar resgates.
Além disso, afirma que as embarcações privadas evitam cada vez mais socorrer os migrantes em perigo, devido aos conflitos que cercam os desembarques.
A Europa recomendou às autoridades líbias que assumam uma parte mais significativa das operações de busca e resgate. Em 2020, ao menos 10.352 migrantes foram interceptados pela guarda costeira líbia e devolvidos à Líbia, contra cerca de 8.403 em 2019.
No entanto, quando retornam à Líbia, enfrentam uma série de violações e abusos graves dos direitos humanos, acusa o relatório.
"Ninguém deveria sentir-se obrigado a arriscar sua vida ou a de sua família em embarcações em más condições em busca de segurança e dignidade", alertou Bachelet. "Mas a resposta não pode se resumir a impedir as saídas da Líbia ou fazer com que as viagens sejam mais desesperadas e perigosas".
"Enquanto não houver suficientes canais de migração seguros, acessíveis e regulares, as pessoas continuarão tentando atravessar o Mediterrâneo central, independente dos perigos e das consequências", lamentou.
GENEBRA