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Estado de Minas

Comunidade mexicana homenageia mortos por covid nos Estados Unidos com altares


02/11/2020 19:13

"Bem-vindo à casa", diz María Isabel, às lágrimas, ao invocar a alma de seu irmão Pablo, vítima da covid-19 nos Estados Unidos e homenageado com um dos quase 40 altares de mais de dois metros em Huaquechula, México.

Minutos antes de os sinos da igreja desta comunidade de Puebla (centro) tocarem no domingo para chamar os espíritos dos mortos, María Isabel Vargas - uma senhora miúda-, seu filho Carlos e amigos correram de um lugar para outro para concluir a oferenda na casa que também abriga galinhas.

"Onde está a água benta? Quem tem incenso?", pediu Carlos, um professor de dança folclórica, em um ambiente apático devido às restrições sanitárias.

Cerca de 2.500 mexicanos morreram até o final de setembro no país vizinho devido à pandemia, segundo dados oficiais.

Às duas horas da tarde, aqueles com parentes mortos no ano passado saíram às ruas e caminharam alguns metros para marcar o percurso até seus altares com água benta e pétalas de calêndula, flor do Dia dos Mortos, celebrado no domingo e nesta segunda-feira (2).

Carlos diz que eles pensaram que nada fariam por seu tio, que morreu em março no Queens, em Nova York. Mas "Huaquechula é um lugar onde a tradição nunca morre", diz ele com orgulho da cidade que homenageou os imigrantes mexicanos vítimas da covid.

- Limiar do além -

Sob o lema "se não te recebo é porque te amo e me amo", Huaquechula proibiu a entrada de turistas durante a festa mais representativa do país.

Milhares de famílias mexicanas tiveram que homenagear seus mortos na privacidade de suas casas antes do fechamento de cemitérios e outras restrições devido à epidemia, que deixa cerca de 92.000 mortos e mais de 900.000 infectados no país.

Mas em Huaquechula, uma comunidade empobrecida de 26.000 habitantes localizada perto do vulcão Popocatépetl, os familiares ergueram seus altares tradicionais, que diferem dos demais no México por seu tamanho, pois tomam uma parede inteira.

São montados em estruturas de madeira e divisórias de concreto, iluminados com lâmpadas brancas e revestidos de cetim.

Cada um dos três andares representa uma visão da morte baseada em lendas pré-hispânicas e religiosas. Sua construção pode custar até 5 mil dólares.

Entre anjos, tangerinas, cana-de-açúcar, maçãs, pães doces e tamales(prato típico) está a fotografia de Pablo, refletida em um espelho que representa o limiar entre a vida e a morte.

Há também um prato fumegante de mole negro(receita tradicional) com pedaços de peru, que Maria Isabel levou dois dias para preparar em uma panela enorme.

O aroma da comida se mistura com o da resina copal ( um material natural considerado sagrado em algumas culturas) quando María Isabel, 74, e Carlos, 37, abrem as portas de sua casa para permitir a entrada do espírito de Pablo.

- "Está feito" -

Após as boas-vindas, enquanto um violonista entoa canções religiosas, a idosa se declara satisfeita. "Já está feito, ele pode seguir feliz", disse em meio às lágrimas.

O altar de Eusebio Silvano Camacho, cozinheiro de 49 anos que também morreu de covid-19 em New Jersey em maio, se destaca porque o nível destinado a sua vida na terra é o mais amplo, com vários pratos como o chicharrón (pele de porco frito), arroz e espaguete.

"Mesmo sem receber visitantes ou turistas, tínhamos que homenageá-lo", diz a sobrinha Evelyn Camacho, estudante de Pedagogia, em frente ao retábulo construído com o dinheiro enviado por Eusébio.

"É um pouco triste porque estamos acostumados a receber gente (...), há muito silêncio nas ruas", diz Cristina Morales, 40, ao pé do altar do cunhado Francisco Cruz, 53, que dirigia um restaurante em Nova York quando foi infectado.

Mas "se não o fizéssemos, eles iriam embora de mãos vazias, nossos filhos iriam sozinhos", diz a mulher.


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