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Estado de Minas

Bairro Lagoinha é o vizinho pobre do Centro

Lagoinha, apesar da proximidade com a área mais movimentada de BH, é carente em comércio e serviços. Região sofre com degradação e com pontos de consumo de drogas


postado em 25/03/2013 06:00 / atualizado em 25/03/2013 07:09

Valquiria Lopes

 

Bem ao lado do Centro de Belo Horizonte e tão distante dele, o Bairro Lagoinha, na Região Noroeste, sofre com as barreiras físicas impostas pela linha do metrô e pelo Ribeirão Arrudas. Moradores e comerciantes reclamam da falta de infraestrutura de serviços e de comércio e dizem que precisam andar até a Avenida Pedro II ou atravessar até o Hipercentro para conseguir o que precisam. Para isso, um dos desafios é se arriscar entre os milhares de carros que cruzam o complexo diariamente, pois há uma única passarela na ligação com a área central.


“Trabalhar aqui é realmente muito difícil, porque não temos restaurante, farmácia, bancos, lotérica nem mesmo uma boa lanchonete por perto”, queixa-se o vendedor da Peixaria Serradão, no início da Rua Bonfim, Jandir Ferreira, de 52 anos. Da porta do estabelecimento, ele observa o emaranhado de viadutos e comenta a dificuldade enfrentada por quem vive ou trabalha na área. “A Lagoinha sofre com o abandono, com a falta de infraestrutura. Até para chegar aqui é difícil. O Bairro Bonfim (ao lado do complexo) é atendido por uma única linha de ônibus, que tem o quadro de horários reduzidíssimo”, afirma. Segundo o vendedor, que trabalha há 36 anos na região, quem depende do transporte público usa os sistemas das avenidas Antônio Carlos ou Pedro II para acessar o bairro.

Dono do estabelecimento, o empresário Breno José de Lima Ferreira, de 37, afirma que escolheu a Rua Bonfim pela tradição das peixarias, mas diz sofrer cotidianamente para chegar ao local, por causa do trânsito. A reclamação é comum entre a clientela, que se queixa ainda do aspecto de abandono do lugar e da aglomeração de moradores de rua e usuários de drogas no entorno dos viadutos.

O ar de abandono do lugar torna a região hostil para quem passa a pé, como relata a autônoma Maria da Conceição Pereira, de 52, que mora no Bairro Floresta, vizinho à Lagoinha, mas já na Região Leste. “Atravesso os viadutos diariamente para vir à Lagoinha. Acho muito perigoso, mas preciso e, então, me arrisco entre os carros. Mas só faço isso durante o dia. À noite, nem pensar. O risco de assalto é muito grande”, diz.

A situação enfrentada pela Lagoinha é resultado de projetos de revitalização que nunca saíram do papel ou não foram devidamente implantados. A arquiteta, urbanista e conselheira do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) Cláudia Pires exemplifica: “A revitalização da década de 1990, nos moldes do que foi feito no Centro de Lisboa, em Portugal, foi parcialmente implantada. O Mercado da Lagoinha, por exemplo, foi reformado, mas não foi usado em sua totalidade”.

Segundo a urbanista, espaços como o Cine Lagoinha, que poderiam ter se tornar atrações culturais, estão à mercê do tempo. Sem falar nos casarões históricos, muitos deles tombados e abandonados. “Os espaços da Lagoinha foram transformados para se tornarem calhas de vias expressas. Isso mudou muito a realidade no lugar. Enquanto a prefeitura não perceber que a cidade precisa ser desenhada, as obras continuarão sendo feitas apenas para as pessoas passarem, e não para se apoderarem dos espaços”, critica Cláudia, confiante na possibilidade de a Lagoinha se reerguer.

ATRASADO A Prefeitura de Belo Horizonte tem planos para revitalizar a região e pretende melhorar as condições urbanísticas, sociais e ambientais. As transformações envolvem uma série de alterações que vão desde o traçado das ruas e criação de espaços públicos ou áreas destinadas às atividades econômicas até a implantação de equipamentos públicos, revitalização de prédios preservados e a construção de habitações voltadas para a população de baixa renda.

O projeto deve ser concretizado por meio de parceria público-privada e, de acordo com a Secretaria Municipal de Desenvolvimento, está em fase de estudos de viabilidade econômica e de impacto de vizinhança, que deveriam ter sido concluídos no ano passado. A previsão inicial é que o projeto de lei com os moldes da operação urbana no local seja encaminhado à Câmara Municipal este ano. No entanto, não tem data para ser executado.


A solução que virou funil

Rotas alternativas e novos corredores são a saída para o gargalo da Lagoinha, nos limites das regiões Noroeste, Leste e Centro-Sul. É o que defende o doutor em engenharia de transportes Frederico Rodrigues. Segundo ele, isso evitaria que metade dos motoristas passassem pelo complexo para chegar à área central. Essa é, inclusive, a proposta do Corta Caminho, idealizado pela prefeitura e que ainda não saiu do papel. O programa prevê a implantação de vias que liguem regiões da capital sem cruzar o Centro. Inicialmente prevista para a Copa, a Via-710, que conecta as avenidas dos Andradas e Cristiano Machado, deve ficar pronta em outubro do ano que vem e é a mais adiantada dos pelo menos cinco corredores prioritários.

Rodrigues afirma que outra saída para a Lagoinha é o investimento em planejamento urbano e no transporte público de massa, como o BRT e o metrô. “Planejar a expansão da cidade é algo recente no Brasil. Acordamos somente agora para essa questão, que precisa ser levada a sério”, diz o especialista, que considera o Complexo da Lagoinha bem projetado para a época em que foi concebido. “Mas naquele tempo a cidade não tinha Plano Diretor com previsão de crescimento da cidade e da frota, e com o passar dos anos a capacidade se tornou saturada.”

Outro fator que agravou os congestionamentos, segundo o especialista, foram as obras da Linha Verde na Avenida Cristiano Machado e a duplicação na Antônio Carlos, que tornaram essas vias cada vez mais expressas. Com isso, os carros chegam mais rápido ao complexo, mas não encontram vazão no acesso ao Centro e ficam parados em congestionamentos.



História

1950

O Túnel da Lagoinha, que liga a Avenida Cristiano Machado ao Centro, começa a ser construído, mas a obra fica abandonada

Dezembro de 1968

Retomada da construção do Túnel Lagoinha-Concórdia. Estrutura foi concluída no início dos anos 1970, em pista simples.

Início dos anos 1980

Construção dos viadutos A (que liga o Centro, saindo da Rua Curitiba, à Avenida Antônio Carlos e a Pedro II) e B (que conecta as avenidas Antônio Carlos e Pedro II ao Centro, chegando à Rua dos Caetés)

Novembro de 1986

Inauguração da obra de duplicação do Túnel Lagoinha-Concórdia. Orçada em 447 milhões de cruzados, a nova estrutura foi construída com 400 metros de extensão

1986

Inauguração do Viaduto Oeste, que liga as avenidas Nossa Senhora de Fátima e Contorno, e do Viaduto Leste, que faz a transposição do fluxo de veículos das avenidas Cristiano Machado e Antônio Carlos para o Centro

Outubro de 1991

Inauguração da passarela de pedestres que faz a ligação entre a rodoviária e a região da Lagoinha, chegando ao lado da Praça Vaz de Melo

Agosto de 1996

Conclusão da alça A2 do viaduto A, que liga a região da rodoviária no Centro à avenida Pedro II, passando pela Rua Itapecirica. Nessa época, somente na Avenida Antônio Carlos passavam 60 mil carros diariamente.

Fevereiro de 1999

Início da construção da ligação entre Avenida Antônio Carlos e Pedro II

Dezembro de 2012

Alargamento do Viaduto B para implantação do BRT Pedro II

Pedestres

Garantir acessibilidade aos pedestres e otimizar a ocupação urbana na Lagoinha é a proposta de um projeto de conclusão de curso desenvolvido no Departamento de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Batizado de Conexões Urbanas, o estudo valoriza a história e a vocação comercial da área, integrando-as às atuais condições do trânsito e do conjunto de viadutos. O autor do estudo, o arquiteto Henrique Eduardo Araújo Coelho, explica que a proposta visa à revitalização do espaço. “A Lagoinha é uma área extensa e subutilizada. Todo o entorno dos viadutos pode receber tratamento urbanístico para se tornar agradável e de fácil acesso a pedestres e portadores de necessidades especiais”, diz, citando a implantação de praças e outros equipamentos públicos. Para ele, as mudanças atrairiam lojas, restaurantes, bancos e outros gêneros de comércio e serviços, atualmente escassos na região. A principal intervenção viária seria a transposição do fluxo da Avenida Antônio Carlos para o subsolo, na altura da Praça Vaz de Mello (na perspectiva abaixo), que seria ampliada. “A Antônio Carlos secionou a Lagoinha. Essa proposta visa devolver a área que sempre foi da região. A praça que era muito importante para os moradores”, afirma. O projeto prevê ainda a integração do BRT com o metrô, mas também com deslocamentos por bicicleta e a pé.


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