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Estado de Minas HOMENS-BOMBA AO VOLANTE

Cresce gasto na saúde pública com socorro às vítimas de acidentes envolvendo caminhões


postado em 01/02/2012 06:00 / atualizado em 01/02/2012 07:08

"Enterraram meu marido vivo. O plano de saúde, a polícia, o poder público, o caminhoneiro. O país não admite eutanásia, mas enterra as vítimas das estradas vivas", Eliane Helena Gonçalves Silva, esposa de Délio Alves Silva, em coma desde 2010 (foto: FOTOS: Beto Novaes/EM/D.A PRESS)


As despesas do Sistema Único de Saúde (SUS) com o tratamento das vítimas de acidentes que envolveram transportes de carga pesada chegaram a R$ 120 milhões em Minas Gerais entre janeiro e novembro do ano passado. A quantia é 6% maior do que o que foi gasto em 2010 (R$ 113 milhões) e 46% superior aos recursos destinados em 2008 (R$ 82 milhões). O aumento dos acidentes trouxe prejuízo ao Estado, mas nada que possa ser comparado à perda da professora Eliane Helena Gonçalves Silva, de 40 anos, e de seus três filhos. Para eles, a carreta que passou por cima do carro do marido e pai de família, Délio Alves Silva, de 41, roubou-lhes a alegria e a esperança de um futuro juntos. Ele não morreu, mas vegeta sobre uma cama diante dos olhos impotentes dos parentes, em coma desde 20 de outubro de 2010, após um desastre na BR-381, altura do km 375, em São Gonçalo do Rio Abaixo, Região Central de Minas.

“Enterraram meu marido vivo. O plano de saúde, a polícia, o poder público, o caminhoneiro. Para eles o Délio já morreu. O país não admite eutanásia, mas enterra as vítimas das estradas vivas”, desabafa Eliane. O sofrimento da família da professora é uma faceta pouco conhecida, distante das estatísticas da terra sem lei em que se transformaram as rodovias mineiras. Enquanto isso, as estreitas vias de traçado antigo recebem cada vez mais carretas pesadas, reflexo de um país que precisa escoar 60% do que produz pelas estradas, segundo Confederação Nacional do Transporte (CNT).

“É um absurdo a desproporção do tamanho de um automóvel para uma carreta. O carro do Délio era novo: virou um monte de ferro retorcido. Ou se duplica as vias ou se tira os caminhões ou os carros. Se ficarem juntos, as tragédias vão continuar”, critica Eliane. Da Justiça ela só espera recursos capazes de manter a vida do pai de seus filhos, pois o processo criminal contra o caminhoneiro de 24 anos que provocou o acidente já prescreveu. “Tinha seis meses para fazer uma representação. Não fiz porque lutava pela vida do meu marido”, justifica.

O acidente de Délio é mais um da Curva do Mel, um dos pontos críticos da BR-381, conhecida como a Rodovia da Morte pelo altíssimo número de acidentes. De acordo com Eliane, os policiais contaram que Délio e a carreta estavam em sentido oposto quando o trânsito começou a parar. “Meu marido ficou na fila. O caminhoneiro freou só a carreta, mas não a carroceria. Por isso ela deslizou em L e acertou o carro”, conta. O inchaço no cérebro obrigou os médicos a removerem parte do cérebro de Délio e agora ele aguarda uma nova cirurgia para receber uma prótese que custa R$500 mil. “Logo no início ele falava. Queria me tranquilizar. Dizia que tudo ia ficar bem. Mas depois entrou em coma”, conta.

Falta manutenção

Também na BR-381, em outro acidente, foi preciso um motociclista acelerar em meio à chuva para avisar ao caminhoneiro de uma bitrem que ele tinha acabado de matar uma pessoa. Naquela tarde do dia 4 de outubro do ano passado o carreteiro perdeu o controle da última composição do veículo de carga. O comando da carreta foi retomado depois que o carro do empresário Hilário Moutinho Roberto, de 45 anos, que seguia no sentido João Monlevade, foi arrebatado pela carroceria de aço. Ele morreu na hora. “Como é que (o caminhoneiro) nem viu o que aconteceu? Como se mata o filho de alguém, pai de família, e vai embora sem ter visto nada? Nossa vida acabou”, afirma a dona de casa Geralda Moutinho Roberto, de 63 anos, mãe de Hilário.

A manutenção precária de muitos caminhões e carretas, como mostrou o Estado de Minas na edição da última segunda-feira, é um fator de alto risco nas estradas. Apesar de não haver uma estatística sobre a mortalidade dos veículos de transporte de carga em estado precário, os números mostram que tanto máquinas novas quanto antigas são causadoras de desastres. Dos 11.345 cargueiros envolvidos em acidentes nas estradas federais mineiras entre janeiro e novembro de 2011, 4.163 tinham até quatro anos de uso, enquanto 4.294 tinham mais de nove anos.

Os números são da Polícia Rodoviária Federal compilados pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). “É um problema comum nas estradas mineiras. Os cavalos, que são a parte da carreta que puxa a carga, geralmente são novos e mais bem cuidados. As carrocerias geralmente são das empresas e não recebem tanta atenção. Só são reparadas quando estragam”, alerta o especialista em manutenção de veículos pesados Alberto Vidal Guimarães.



ROTINA DE ABUSOS


Uma mistura perigosa de sexo, drogas e álcool assombra caminhoneiros solitários que cruzam as estradas de Minas Gerais, às vezes virando dias sem descanso. Pela mão das prostitutas, dos travestis e até de menores que vendem seus corpos por alguns reais, muitos desses homens responsáveis por transportar toneladas de cargas desperdiçam em farras o tempo precioso que têm para recobrar as forças e voltar atentos às perigosas estradas mineiras. Essa situação foi mostrada na edição de ontem da série “Homens-bomba ao volante”, publicada desde domingo pelo Estado de Minas. Em Montes Claros (Norte de Minas) e Frei Inocêncio (Vale do Rio Doce), garotas de até 14 anos são exploradas sexualmente com consentimento dos parentes. Na cidade de Governador Valadares, no Vale do Rio Doce, muitos caminhoneiros são clientes e fornecedores de drogas para travestis no entroncamento das BRs 116 e 381.


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