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Estado de Minas MEMÓRIA

LUTO NAS LETRAS


postado em 07/08/2019 04:00 / atualizado em 06/08/2019 21:56

(foto: Mandel NGAN/AFP)
(foto: Mandel NGAN/AFP)
 
Sua escrita foi um belo e significativo desafio para a nossa consciência e nossa imaginação moral. Que presente foi respirar o mesmo ar que ela, mesmo que por apenas um tempo"

Barack Obama, ex-presidente dos EUA (na foto, ele entrega a Toni Morrison a Medalha da Liberdade)
  
Primeira e única autora afro-americana a ganhar o Prêmio Nobel de Literatura, Toni Morrison morreu aos 88 anos, após uma breve doença, na última segunda-feira (5), segundo informou ontem sua família, num comunicado em que se lê: "Apesar de sua morte representar uma tremenda perda, estamos gratos por ela ter tido uma vida longa e bem vivida".

Morrison escreveu 11 romances em uma brilhante e multipremiada carreira literária. Ganhou o Prêmio Pulitzer e o American Book Award em 1988 pelo romance Amada. Ambientada após a Guerra Civil americana na década de 1860, a história é centrada em uma escrava que fugiu de Kentucky para o estado livre de Ohio. O livro ganhou uma versão cinematográfica estrelada por Danny Glover e Oprah Winfrey com o título de Bem-amada.

Morrison recebeu vários outros prêmios, incluindo o Prêmio Nobel de Literatura em 1993. À época, a Academia sueca celebrou, em sua obra, "uma poderosa imaginação, uma expressividade poética e o quadro vivo de uma face essencial da realidade americana".

Em 1996, foi homenageada com a Medalha de Honra da National Book Foundation. Em 2012, o então presidente Barack Obama lhe entregou a Medalha Presidencial da Liberdade e, em 2016, Morrison recebeu o prêmio PEN/Saul Bellow pelo conjunto de sua obra na literatura de ficção americana.

O olho mais azul, seu primeiro romance, foi publicado em 1970. Sula foi lançado 1973 e, na sequência, a escritora publicou outros nove romances, entre eles Voltar para casa, de 2012, e Deus ajude essa criança, de 2015. Também passou um tempo como editora na Random House e lecionou na Universidade de Princeton. Foi a primeira negra a receber uma cátedra na renomada instituição.

Morrison também escreveu vários ensaios, como Playing in the dark (Brincando no escuro), no qual descortina o lugar do escravo na construção – por oposição – da identidade do branco americano. A autora destaca que, durante muito tempo na ficção americana, os negros serviram de contraste para valorizar o herói branco.

Filha da Grande Depressão, Chloé Anthony Wofford (sobrenome do fazendeiro branco proprietário de seus avós escravos) nasceu em 18 de fevereiro de 1931, em Lorain, perto de Cleveland, no estado de Ohio (Norte dos EUA), em uma família trabalhadora de quatro irmãos.

SEGREGAÇÃO Educada por um pai que detestava os brancos e por uma mãe alegre e acolhedora, Toni Morrison cresceu em um meio pobre e multicultural. Disse nunca ter tido consciência da segregação racial até partir, em 1949, para a Howard University, conhecida como a "Harvard Negra", em Washington.

Com uma formidável autoconfiança, seguiu seus estudos na Universidade de Cornell, onde defendeu sua tese sobre o suicídio de William Faulkner e de Virginia Woolf. Torna-se professora de literatura no Texas, antes de voltar para Washington.

Em 1958, casa-se com Harold Morrison, um estudante de arquitetura de origem jamaicana. Separam-se em 1964, e ela e seus dois filhos, de 3 anos e de 3 meses, vão viver em Nova York. No momento em que a América ferve, em meio à luta pelos direitos civis, ela se torna editora na Random House e milita pela causa negra, publicando as biografias de Mohammed Ali e de Angela Davis.

Reeditada várias vezes, sua antologia de escritores negros The black book (1974) estimula toda uma geração de autores a fazer ouvir sua voz. Movida "pela alegria, e não pela decepção" e dotada de uma força de vontade e de um humor a toda prova, Toni Morrison publica O olho mais azul aos 39 anos. Nele, conta a história de uma adolescente negra, uma de suas colegas, que sonha com a beleza das bonecas de olhos azuis e que afunda na loucura após ser violentada pelo pai e engravidar.
"Eu não tinha nada além da minha imaginação, um terrível senso de ironia e um enorme respeito pelas palavras", afirmou ela. O reconhecimento chega em 1977, com Canção de Salomão, e o triunfo mundial em 1985, com Amada. Ganhador do Pulitzer, esse livro conta a história de uma antiga escrava que matou a filha para que ela não repetisse sua trajetória. Em 2006, foi considerado pelo jornal The New York Times o "melhor romance dos últimos 25 anos".

Acostumada com os debates polêmicos, em 1998, em meio ao "escândalo Monica Lewinsky", afirma que Bill Clinton é o "primeiro presidente negro" americano. "Foi tratado como um negro na rua, já culpado, já criminoso", explicaria essa democrata convicta alguns anos depois.

Ardorosa apoiadora de Barack Obama, no dia seguinte à vitória do republicano Donald Trump na eleição à Presidência dos EUA, em 2016, publica na revista New Yorker artigo intitulado Mourning for whiteness (Luto pela brancura, em tradução livre).

Se, no início, ela se concentra em escrever "para os negros", sua escrita mestiça, folclórica, quer, em um segundo momento, ultrapassar a "obsessão da cor" para atingir o leitor no que ele tem de universal. "Eu amaria escrever sobre os negros sem ter de dizer que são negros. Exatamente como os brancos escrevem sobre os brancos", gostava de repetir, com sua voz grave, entrecortada pelo riso franco. (AFP)


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