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Estado de Minas padecendo

Câncer de mama: superando o abandono

Cerca de 70% dos homens abandonam suas companheiras após o diagnóstico da doença. Os machos abandonam suas companheiras, os homens ficam e cuidam delas'


10/10/2021 04:00




Entre sentir aquele nódulo no seio, fazer os exames e pegar o resultado passaram-se alguns meses. Ela era muito jovem, não tinha histórico de câncer na família. Aquilo nunca aconteceria com ela até ela abrir o exame e o resultado saltar da tela.

Era câncer.
 
 
 
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Não acreditou quando leu. Tornou a ler, e reler. Ficou trêmula, as pernas bambas. Sentou-se. Sentia falta de ar. E agora? Ela ia morrer? Como ela poderia estar com câncer? Era saudável, praticava esportes, se alimentava bem, tinha filhos, amamentou por muito tempo. Não era possível! Mas era real. Estava ali há algum tempo e ela podia senti-lo.

Tomou um banho demorado e deixou as lágrimas descerem junto com a água do chuveiro enquanto organizava seus pensamentos.

Não quis contar para ninguém. Ligou para o consultório da mastologista, conseguiu um encaixe e foi lá. Foi encami- nhada para uma oncologista. Fez outros exames, descobriu que já estava avançado. Precisou começar a quimioterapia com urgência. Precisou criar coragem e contar para seus pais, seu marido.

A mãe a acompanhou em todas as sessões de quimioterapia. O marido agia como se não tivesse nada com isso. Nem perguntava como ela estava se sentindo. Nada. Era como se ela tivesse quebrado um acordo. Um acordo que ela nunca havia feito: ser eternamente saudável, apesar dos votos matrimoniais que diziam “na saúde e na doença”. Oh, masculinidade frágil!

Usou a touca térmica nas primeiras sessões, mas o cabelo caiu mesmo assim. Cada punhado de cabelo que enchia suas mãos a deixava desnorteada. Ela não se importava com o cabelo, queria ficar curada, mas sabia que o marido ia odiar vê-la careca. Ele gostava de cabelo bem comprido e, embora ela sempre tivesse tido vontade de cortar mais curto, ele nunca deixava. E os seios? Ela ainda teria que fazer uma mastectomia e depois radioterapia. Como ele iria lidar com isso? Ele, que sempre valorizou corpos perfeitos.

O cabelo caiu, ela passou máquina, assumiu a careca. Sabia que poderia usar prótese, mas escolheu não usar. Apesar de tudo, era bom ter liberdade de mudar o cabelo depois de anos usando do jeito que o marido gostava.

As unhas ficaram fracas, finas, quase sumindo. Ela que sempre teve unhas enormes e pintadas em tons pastel. Também de acordo com o padrão estético dele.

Marcou a cirurgia, ele não quis acompanhá-la. Mais uma vez, quem estava sempre presente era sua mãe.

Chegou em casa enfaixada, com aquele dreno, careca e sem unhas. O sujeito a recebeu dizendo: “o que você está fazendo comigo?”. Era como se ele tivesse comprado um brinquedo em perfeito estado e, sem mais nem menos, o brinquedo tivesse quebrado. A esposa com defeito. Inaceitável. Fez as malas e saiu de casa, deixando-a lá com suas feridas ainda abertas, com as crianças, com a casa para cuidar, quando era ela quem mais precisava de cuidados.

Apesar de toda a sua fragilidade naquele momento, ela foi extremamente forte. Fez outras sessões de quimioterapia, fez radioterapia. Terminou seu tratamento. Seu cabelo cresceu, as unhas também. A autoestima, que quase foi destruída após o abandono, foi resgatada.

Superou o abandono. Descobriu uma vida diferente. Descobriu a liberdade de ser.

Hoje, ela pode ter o cabelo do jeito que quiser, pode até raspar outras vezes se tiver vontade. Ela deixou crescer e doou muitas vezes. As unhas voltaram a crescer fortes e agora ela pinta de vermelho, de azul, até de roxo com amarelo se ela quiser. Sabe que seu corpo é perfeito com todas aquelas cicatrizes, elas contam sua história.

O estrupício que saiu de casa por não ter maturidade para fazer papel de homem e apoiar a mulher com quem ele havia escolhido passar sua vida continua se sentindo enganado. Continua achando que o universo gira em torno daquele umbigo peludo. Não cresceu, não aprendeu a ser gente. Continuou precisando fazer muito esforço para gostar de mulher.

Outubro Rosa

Cuide-se, toque-se, conheça seu corpo. Em caso de dúvida, procure um médico.

Se está tudo bem com você, apoie as amigas que estão tendo que lidar com essa doença.

Dê suporte àquelas que foram abandonadas pelos seus parceiros. Cerca de 70% dos homens abandonam suas companheiras após o diagnóstico da doença. Homens? Não, isso não é ser homem. Homem não faz isso. Os machos abandonam suas companheiras, os homens ficam e cuidam delas.

Cuide. Converse, mande mensagens. Chame para tomar um café (sem se esquecer dos cuidados com a COVID). Não precisa ficar lembrando que ela tem câncer o tempo todo. Na falta de sair para tomar um café, mande uns biscoitinhos, um bolo, qualquer coisa que seja um ca- rinho a distância. Promova um encontro virtual. Escute.

Você pode lembrá-la de que não é a mama que a torna uma mulher maravi- lhosa. Que a beleza da mulher não está nos cabelos longos, mas que está tudo bem ela não se sentir bem careca e que ela pode usar uma prótese capilar, lenços, perucas. E que tudo é temporário e o cabelo vai voltar a crescer.

Doe cabelo nas campanhas, 20 centímetros do seu cabelo não vão afetar sua vida, mas vão deixar alguém se sentindo muito melhor.

Deixe chorar e chore junto. O medo da morte é legítimo, tão legítimo quanto o medo de perder alguém que você ama.

Demonstre seu afeto sempre que puder. Amor nunca é demais.

#outubrorosa

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