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Estado de Minas

Mineiros são pioneiros no estudo da interação do boto-cor-de-rosa com o homem


postado em 15/10/2012 13:04 / atualizado em 15/10/2012 13:08

(foto: Bruno Barbosa/Divulgação)
(foto: Bruno Barbosa/Divulgação)
Curiosamente, são biólogos mineiros de Juiz de Fora dois dos mais relevantes pesquisadores dedicados ao bem-estar do boto-vermelho, espécie também conhecida como boto-cor-de-rosa, que habita, entre outras regiões, a Bacia do Rio Amazonas. Ele não está ameaçado de extinção, mas certas populações da espécie sofrem por conta de interação inadequada com turistas, habituados a tocá-lo e alimentá-lo em margens fluviais. É justamente disso que se ocupam Mariana Frias, mestranda pela Universidade Federal de Juiz de Fora, e Luiz Cláudio Pinto de Sá Alves, doutorando pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

Luiz é um dos pioneiros no estudo dessa questão, tendo iniciado pesquisa em 2008. Hoje ele é conselheiro do Instituto Aqualie, que tem sede em Cabo Frio (RJ) e mantém o projeto Inia, cujo objetivo é estudar o caso da alimentação artificial de botos-vermelhos (Inia geoffrensis, daí o nome) como atração turística na Amazônia Central brasileira. O comportamento dos animais é analisado durante essa atividade (o que inclui nadar com humanos) e questionários são aplicados aos turistas e pescadores locais, sempre no interior do Parque Nacional de Anavilhanas (AM), às margens do Rio Negro.

“Agora estou me aprofundando nas pesquisas para chegar a modelo que possibilite boa qualidade de vida para os animais e mantenha a renda dos ribeirinhos que trabalham com essa atividade. Quero pensar a regulamentação dessa forma de turismo”, afirma Mariana, que teve como ponto de partida o trabalho já desenvolvido na área por Luiz Cláudio. Sua dissertação recebeu o título “Percepção de turistas sobre atividade/interação com botos-vermelhos no estado do Amazonas, Brasil”.

Ela já visitou a região três vezes e, em julho, iniciou a aplicação de 200 questionários a turistas que interagiram com botos em dois locais, o Recanto do Boto (em Novo Airão, à beira do Rio Negro) e a Pousada Uacari (na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá), ambos no Amazonas. Sem interferência dos proprietários desses estabelecimentos ou de seus instrutores, os turistas relatam exatamente o que fizeram e se tocaram, alimentaram ou nadaram com os animais, entre outras questões.

Segundo ela, em função do hábito é difícil pensar num modelo de interação entre humanos e botos que não inclua o contato físico, daí a preocupação em evitar que essa prática seja disseminada em outros locais onde a atividade é realizada. “É importante que mais animais não sejam acostumados a isso. Só o ventre dele deve ser tocado, pois o contato no dorso o incomoda e nele está o orifício respiratório. O melão, órgão ecolocalizador que fica na cabeça, também é muito sensível e os dentes podem ferir”, diz.

Entidades como o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade e o Ibama vêm estabelecendo diretrizes que ajudarão na regulamentação dessa atividade turística, vital para a assegurar mínima qualidade de vida aos animas que já estão habituados ao contato humano. “A alimentação descontrolada afeta a habilidade de caça do animal e pode causar danos à saúde dele, como obesidade e doenças provocadas pelo acondicionamento incorreto do alimento até o momento da visitação”, observa Mariana.

(foto: Danielle Carvalho/Divulgação)
(foto: Danielle Carvalho/Divulgação)
Três perguntas para...


Luiz Cláudio Pinto de Sá Alves
biólogo e doutorando pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro

O boto está em extinção? Há registro de crescimento ou diminuição da população em certas áreas?
Atualmente, o boto está classificado pela International Union for Conservation of Nature (IUCN) como espécie com deficiência de dados depois de ter figurado entre 1988 e 1996 como espécie vulnerável no livro Lista vermelha de animais ameaçados, elaborado pela mesma instituição. Contudo, a IUCN esclarece que as espécies classificadas com deficiência de dados devem receber a mesma atenção que as espécies ameaçadas até que um estudo de risco de extinção seja realizado. Na maioria de sua área de distribuição não há estudos realizados sobre o tamanho de população da espécie. Mas, em alguns locais onde há estudos, sabe-se que a caça para uso como isca ou a matança indiscriminada de botos causam diminuição nas populações.

Qual é a principal ameaça ao animal? Por quê?
A espécie encontra diversas ameaças no Brasil, entre elas o uso de suas carcaças como isca em atividades de pesca e a matança indiscriminada devido a lendas regionais, conflitos com atividades de pesca (captura e morte acidental em redes), aumento no tráfego de embarcações, perda e degradação de seu habitat, mortalidade em projetos de prospecção de petróleo e construção de hidrovias e barragens e aumento de atividades turísticas potencialmente causadoras de impactos negativos aos animais. Na região de Manacapuru (AM), os botos são extremamente indesejados, até mesmo odiados, sendo considerados uma peste devido ao fato de atrapalharem atividades de pesca. A mais recente e talvez maior ameaça é seu uso como isca para a pesca da piracatinga, peixe que tem sido muito exportado para a Colômbia na última década.

Sobre o contato entre boto e turista, há uma maneira ideal para que essa relação ocorra? Quais são os pontos negativos e positivos dessa atividade?
O maior ponto positivo é o fato de os botos serem vistos como atrativo turístico, percebidos pela população local como fonte de renda. Isso pode mudar a percepção negativa que as pessoas da região têm da espécie. Os maiores pontos negativos são o fato de os animais comerem peixes mortos (quando só comem vivos), o risco de contraírem doenças de humanos e diversas alterações comportamentais, como aumento na agressividade, mudanças na estrutura social e dependência de alimento dado pelo ser humano. Fora os riscos para os seres humanos, que podem se machucar, pegar doenças e acreditar que condicionar animais silvestres ao contato humano através da alimentação artificial é correto. Seria necessário implementar um programa de educação para que turistas aprendam a apreciar somente comportamentos naturais, tornando-se parte de atividade turística sustentável.

 


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