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Estado de Minas

Levantamento torna o Brasil o país com mais mamíferos em todo o planeta

177 novas espécies de mamíferos integram lista atualizada 16 anos depois da primeira publicação. Iniciativa é da ONG Conservação Internacional e envolveu cientistas brasileiros e americanos para investigar detalhes dos animais encontrados no Brasil


postado em 02/06/2012 11:05 / atualizado em 02/06/2012 11:23

Muriqui (acima) e mico-leão dourado (abaixo) são espécies já conhecidas, que vivem sob ameaça de desaparecer(foto: Daniel Ferraz/Conservação Internacional )
Muriqui (acima) e mico-leão dourado (abaixo) são espécies já conhecidas, que vivem sob ameaça de desaparecer (foto: Daniel Ferraz/Conservação Internacional )
O Brasil tem 701 espécies de mamíferos conhecidas, de acordo com o segundo levantamento sobre o tema, que será apresentado no Congresso Brasileiro de Mastozoologia, no final de julho, em Corumbá, no Mato Grosso do Sul. Dezesseis anos depois da primeira pesquisa, 177 espécies foram descobertas e algumas, consideradas uma única até então, acabaram revisadas. A iniciativa é da organização não governamental Conservação Internacional, cuja sede é em Belo Horizonte, mas o trabalho foi feito de forma independente por biólogos brasileiros e americanos, especialistas em diferentes grupos de mamíferos.

Segundo o coordenador da pesquisa, Adriano Paglia, o levantamento faz do Brasil o país com mais mamíferos em todo o planeta, superando a Indonésia. Até agora, 210 espécies existem apenas no nosso país.

A inquietude do biólogo, professor do Departamento de Biologia Geral da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o levou a procurar amigos de profissão para sugerir o desafio de refazer a lista principal. Com base nas informações originais, os mastozoólogos (especialistas em mamíferos) pesquisaram a literatura e dados de coleções científicas, identificando o surgimento de outras espécies. Em alguns casos, foi possível perceber que uma espécie catalogada no estudo de 1996, na verdade poderia ser distribuída em muitas outras. Naquela época, 524 espécies foram analisadas.


“Em 2005, um livro sobre mamíferos foi publicado no Paraná, mas muitas espécies foram descobertas logo depois. Eu tinha um grande incômodo com a lista original e surgiu, então, o interesse comum de mastozoólogos em produzir uma lista mais completa, localizando os biomas nos quais essas espécies que surgiram de 1.500 anos para cá são encontradas”, explica Paglia.

O levantamento faz uma análise mais refinada dos locais de existência das espécies e posiciona os biomas mais importantes no mapa do país. Os biólogos também conseguiram definir se a presença dessas espécies é ampla ou restrita a uma região específica do território nacional e se determinado mamífero é exclusivamente brasileiro. O mico-leão, por exemplo, só existe por aqui e todas as suas quatro espécies são encontradas mais especificamente numa pequena porção de mata atlântica no Rio de Janeiro.


No trabalho atual – do qual participaram professores da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade de Brasília (UnB), além do maior especialista em roedores da região neotropical, James Patton, da Universidade da Califórnia – descreve-se também o peso, a dieta e a forma de locomoção das espécies.

“Esse estudo mostra que se conhece muito pouco da diversidade biológica, embora os mamíferos e as aves sejam os grupos mais estudados. Desde 1990, 32 espécies foram descobertas na mata atlântica e 36 na floresta amazônica. A tendência é aumentar”, avalia o professor. “Só nesse processo, quanto mais tempo passava, alguém publicava um artigo científico com novidades. Foi um trabalho intenso durante três anos e, mesmo agora, já sabemos de mais espécies. Por isso, vamos esperar um ano e meio para publicar a terceira edição”, diz Adriano Paglia, empolgado.


O estudo confirma a extinção de uma espécie endêmica de roedor, descoberta pelo navegador florentino Américo Vespúcio no arquipélago de Fernando de Noronha, em 1580. Na década de 70, os zoólogos foram atrás dessa espécie, mas só encontraram restos semifossilizados. “Era um caso documentado no Brasil, mas, com a ocupação da ilha e a chegada de animais exóticos, cães e gatos, esses roedores se tornaram extintos”, conta o coordenador do estudo.

Endemismo

Entre as descobertas mais recentes há um grupo de primatas localizado no Nordeste: o macaco-prego-galego. Segundo o pesquisador, não se tinha notícias dele "há séculos" e sua espécie foi reencontrada na região de mangue de Pernambuco. Candidato a mascote dos Jogos Olímpicos de 2016, o macaco-muriqui tem duas espécies descritas em Caratinga, no Vale do Rio Doce mineiro. O monocarvoeiro, uma dessas espécies, também pode ser encontrado na Serra do Brigadeiro, em Araponga, na Zona da Mata, e no Parque Estadual do Rio Doce, em Ipatinga, no Vale do Aço.

Há também, na lista de novidades, gêneros novos de roedores e morcegos. Lembrados como vampiros no imaginário popular, os morcegos têm 174 espécies no Brasil, duas hematófagas (que se alimentam de sangue) e 13 delas endêmicas, ou seja, só ocorrem por aqui. Nas regiões de cerrado de Minas Gerais, como a Serra do Cipó, pode-se encontrar o morcego-beija-flor, uma das espécies unicamente brasileiras. É chamado assim porque suga o néctar das plantas e serve como dispersor de pólen.

''Desde 1990, 32 espécies foram descobertas na Mata Atlântica e 36 na Floresta Amazônica. A tendência é aumentar'', diz o biólogo Adriano Paglia(foto: Euler Júnior/EM/D.A Press)
''Desde 1990, 32 espécies foram descobertas na Mata Atlântica e 36 na Floresta Amazônica. A tendência é aumentar'', diz o biólogo Adriano Paglia (foto: Euler Júnior/EM/D.A Press)

Nesse importante banco de dados também foram incluídas informações sobre o veado-bororó, uma espécie encontrada em São Paulo. Há também esquilos genuinamente brasileiros, que podem ser vistos na caatinga. “Os biomas de maior riqueza para os mamíferos continuam sendo a floresta amazônica e a mata atlântica e as áreas de cerrado, como já havia sido detectado há 16 anos. Na Amazônia, há 399 espécies de mamíferos, para se ter uma ideia. Conseguimos definir as especificações desses animais e o ambiente em que ele evolui. Os maiores e com melhor capacidade de locomoção, por exemplo, são encontrados de maneira mais ampla, em vários pontos do país ou até na Argentina. Por isso, também monitoramos aquela região”, lembra Adriano.

Primeiro estudo feito no braço
Integrante do primeiro grupo de pesquisa, a bióloga e doutora em ecologia e conservação Gisela Herrmann diz que o acesso à informação foi muito maior 16 anos depois do primeiro levantamento. “Temos muito mais informações, mas elas também são mais complexas por causa dos estudos de biologia molecular. Da primeira vez, o trabalho foi todo manual, braçal mesmo. Agora, fizemos tudo on-line.” Membro fundadora da ONG Valor Natural, ela destaca que o Brasil é signatário da convenção sobre diversidade biológica e precisa avançar nos estudos, até para proteger suas espécies, principalmente aquelas muito restritas, ameaçadas de extinção.

O professor Yuri Leite, do Departamento de Biologia da Ufes, conta que o ratinho Juscelinomys, da espécie J. candango, nunca mais foi visto desde a década de 1960, quando foi descrito na literatura científica. Encontrado durante a construção de Brasília, o roedor homenageia os trabalhadores da capital federal, mas tornou-se uma espécie ameaçada. Para o pesquisador, um dos destaques do trabalho é a descoberta de um novo gênero. Trata-se do Drymoreomys, cuja espécie é um tipo de roedor tão diferente que não pôde ser classificado em uma espécie já existente, o D.albimaculatus. O pequeno rato de mata atlântica foi encontrado em uma fazenda de São Paulo e tem distinções anatômicas e genéticas, além de uma mancha branca.

“O primeiro registro dele foi na década de 90. É um ratinho de floresta completamente novo. Foi preciso criar um gênero, porque ele sequer se adequava às espécies já existentes. Seu parentesco mais próximo eram animais dos Andes. Isso mostra nossa falta conhecimento e que ainda estamos descobrindo a nossa própria diversidade”, afirma o especialista.

 


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