(none) || (none)
Publicidade

Estado de Minas

Vacina contra o HIV é nova esperança na prevenção da Aids

Cientistas comemoram teste de substância em larga escala na Tailândia


postado em 10/04/2012 10:59 / atualizado em 10/04/2012 11:03

Distribuição de droga anti-HIV na Tailândia: epidemia nos anos 1990(foto: Sukree Sukplang/Reuters )
Distribuição de droga anti-HIV na Tailândia: epidemia nos anos 1990 (foto: Sukree Sukplang/Reuters )
Já faz 30 anos que a comunidade científica descobriu que o HIV é o vírus causador da Aids. Em todo esse tempo, no entanto, esteve muito longe de encontrar uma vacina eficaz contra o agente infeccioso. Por isso, é motivo de comemoração os resultados obtidos por uma vacina desenvolvida em parceria pelo Exército americano e o Instituto Nacional de Alergias e Doenças Infecciosas (Niaid) dos Estados Unidos. A RV144 mostrou uma eficiência de 31% na prevenção em testes em grande escala. Apesar de a taxa de proteção não ser ainda expressiva o suficiente para aplicar a substância em toda a população mundial, os cientistas descobriram importantes pistas na RV144 que podem conduzir a uma vacina 100% efetiva.

Vítima de uma severa epidemia de Aids nos anos 1990, a Tailândia foi um dos primeiros países a criar um plano nacional contra a doença. Um dos objetivos desse programa era promover pesquisas em parceria com grupos internacionais. Foi então que o Niaid e o Exército americano entraram em cena, em 2003. Mais de 16 mil pessoas, com diferentes perfis e formas de exposição ao vírus, se inscreveram para participar dos testes da vacina.

Enquanto alguns dos voluntários foram, de fato, vacinados, outros receberam injeções de placebo. O objetivo era eliminar a hipótese de qualquer efeito psicológico de imunização sobre os participantes. Doses de reforço foram dadas depois de um, três e seis meses. A cada visita, os voluntários também recebiam educação sexual e aprendiam como prevenir-se contra a Aids. A cada seis meses, eles passaram por testes de HIV. Três anos e meio depois, 74 das 8.198 pessoas que receberam a injeção de placebo contraíram Aids. Entre os vacinados, 51 entre 8.197 foram infectadas. Para os pesquisadores, a redução de 31% na recorrência foi um sinal positivo: alguma coisa na vacina estava ajudando a evitar a transmissão do HIV. Restava saber o quê.

As amostras de sangue dos voluntários, retiradas a cada seis meses, ofereceram algumas pistas. As pessoas que não tinham sido contaminadas pelo HIV apresentavam uma quantidade maior de um anticorpo chamado imunoglobulina G (IgG), enquanto as infectadas tinham outro tipo de anticorpo, a imunoglobulina A (IgA). A partir daí, os pesquisadores teorizaram que, talvez, a IgG esteja ligando-se ao HIV e, assim, “atrapalhando” que ele se conecte aos linfócitos T, células integrantes do sistema de defesa do corpo humano. A IgA, por sua vez, poderia estar inibindo a ação do IgG.

Um dos grandes trunfos do vírus da Aids é uma camada de proteína que o protege e faz com que ele “grude” nas células do sistema imunológico humano, se apodere delas e as mate. Assim, o indivíduo fica cada vez mais vulnerável a doenças oportunistas e pode morrer. Se a tese dos cientistas estiver correta, o IgG estaria interagindo com uma região dessa camada chamada V1V2 e diminuindo seu “poder de cola”. “Nós ainda não temos certeza de que os anticorpos IgG previnem o HIV diretamente. Eles podem ser produto de outros agentes protetores da vacina ainda não identificados, ou, simplesmente, uma marca de que o corpo daquele indivíduo foi exposto ao HIV”, admite Alan Fix, diretor do programa de Pesquisa em Vacinação do Niaid. “As novas descobertas, no entanto, nos ofereceram algumas guias sobre qual caminho seguir para responder as nossas perguntas e tomar passos mais acertados no aperfeiçoamento da RV144.”

Dificuldades
A RV144 foi apenas a terceira vacina a chegar a um teste em larga escala e a única a apresentar resultados ao menos moderados. Isso se deve a diversas dificuldades. Para começar, o vírus da Aids é extremamente mutante e tem uma série de variáveis – a RV144, por exemplo, é preparada para combater apenas duas delas. Depois, os testes em animais são ineficientes. Mesmo os macacos, parentes mais próximos dos seres humanos, só podem ser testados com dois primos distantes do HIV, o SIV e o SHIV. “Nenhum desses vírus se comporta exatamente como o HIV. Além disso, os ingredientes usados na vacina para primatas não podem ser os mesmos que nas vacinas para humanos por causa das diferenças genéticas entre HIV, SIV e SHIV”, afirma Fix.

Há ainda o fator duração. Enrique Roberto Argañaraz, especialista em virologia molecular da Universidade de Brasília (UnB), explica que a maioria das vacinas testadas até então produziam apenas uma imunização de curto prazo. “A RV144, mesmo perdendo eficiência ao longo do tempo, conseguiu manter seus efeitos preventivos por um período mais longo que as demais (a queda na imunidade começava só a partir do 12º mês). Essa é a principal conquista dessa substância”, opina Argañaraz.

O infectologista Ricardo Sobhie Diaz, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), vê ainda outra qualidade na RV144. “Ela é a primeira vacina a juntar duas estratégias de luta contra o HIV em uma injeção só.” No princípio, conta Diaz, as vacinas contra a Aids investiam em uma técnica simples: inserir no organismo um pedacinho do envelope do HIV para que o corpo aprendesse a produzir anticorpos contra ele. Essa tática não se mostrou eficiente, já que o HIV vivia alterando essa capa protetora em suas mutações. Depois, os cientistas apostaram na inclusão de proteínas internas no vírus, para que as células entendessem que havia uma ameaça e se defendessem contra ela. Também foi ineficaz. A RV144 tentou de tudo. Colocou os envelopes de duas variáveis diferentes do vírus (B e E) e três proteínas internas. “Talvez isso seja responsável pelo sucesso relativo dessa vacina”, conclui Diaz.

Não faz sentido, no momento, distribuir uma vacina que proteja apenas 31% das pessoas contra duas variações do HIV. Isso poderia estimular as pessoas a afrouxar sua exigência de preservativos e estabelecer uma loteria de mau gosto. Os pesquisadores do Niaid apostam, isso sim, é que as descobertas propiciadas pela RV144 os ajudem a descobrir uma vacina definitiva. Fix conta que um movimento nessa direção já começou. “Uma grande parceria público-privada chamada Pox-Protein (ou P5) já está planejando estudos de aperfeiçoamento da RV144. Seu objetivo é produzir resultados em larga escala”, acrescenta Alan Fix.

Interesse militar
Um fator que chama a atenção no desenvolvimento da vacina RV144 é o apoio do Exército dos Estados Unidos ao projeto. Não deveria a instituição estar gastando seus fundos em pesquisas militares? O papel do Exército, no entanto, tem sido ampliado em muitos países recentemente. Alguns deles, como os Estados Unidos, têm entendido que é missão da organização investir em áreas estratégicas para a nação, como a saúde – afinal, doenças estão entre as grandes causas de morte de soldados em lugares estranhos, durante as guerras e operações de paz. O coronel Nelson Michael, diretor do Programa Militar de Pesquisa sobre o HIV dos EUA, confirma: “Por mais de um século, a comunidade médica militar tem resolvido problemas de saúde globais significativos, principalmente nas áreas de doenças infeciosas tropicais, como malária, febre amarela e leishmaniose. Consideramos que esses males representam uma enorme ameaça às Forças Armadas americanas e à comunidade global. Controlando a Aids, o Exército pretende reduzir a instabilidade global e, assim, os conflitos mundiais”, acrescenta Michael.

 


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)