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Estado de Minas

Registro de morte anormal de macacos desde 2014 não motivou prevenção eficaz da febre amarela

Enquanto Minas volta a bater recorde nacional de mortes, documento mostra que desde julho de 2014 relatos de macacos mortos em época considerada anormal indicavam risco de avanço da doença


postado em 02/02/2017 06:00 / atualizado em 02/02/2017 07:32

(foto: Arte EM)
(foto: Arte EM)
O surto de febre amarela silvestre em Minas, o mais letal registrado no país desde 1980, foi precedido de alertas do próprio Ministério da Saúde, que desde julho de 2014 tem registro de mortes de macacos fora do período considerado normal para esse tipo de evento – entre dezembro e maio (veja quadro). A advertência se justifica porque casos da forma silvestre da doença entre humanos são, em geral, precedidos de mortes desses animais, hospedeiros do vírus Flavivirus. Documento que consta no site do ministério informa que, entre julho de 2014 e dezembro do ano passado, quando os primeiros pacientes do atual surto começaram a adoecer, a ocorrência de casos humanos foi compatível com o período sazonal da doença. Porém, alertava  que a morte de macacos em períodos considerados anormais indicava que as condições eram favoráveis à propagação da virose entre humanos, o que exigia ações e esforços adicionais de vigilância, prevenção e controle. A julgar pelo quadro atual em Minas, que ontem voltou a bater pela segunda vez o recorde de óbitos causados pelo mal no país, o aviso não resultou em prevenção eficaz.

Apesar de o ministério e a Secretaria de Estado de Saúde (SES) informarem que providências foram tomadas diante do alerta, especialistas acreditam que elas não foram suficientes. Prova disso são os números relativos à enfermidade. No balanço diário divulgado ontem pela secretaria, mais quatro mortes foram confirmadas e outras 11, notificadas. Com isso, já chega a 127 o total de óbitos suspeitos, dos quais 48 comprovadamente causados por febre amarela somente em janeiro de 2017. O número deste ano já é 20% maior do que as 40 mortes registradas no país inteiro em todo o ano de 2000, até então considerado o mais letal da série histórica de acompanhamento da doença pelo Ministério da Saúde (1980/2017). E o quadro ainda deve se agravar, já que 79 mortes continuam sob investigação.

Ainda segundo o levantamento, são 774 casos  notificados, dos quais 29 foram descartados e 132 confirmados. Na última sexta-feira, eram 486, mas, de acordo com a SES, o aumento significativo nas notificações deve-se à atualização de dados, que incluem casos com início dos sintomas durante todo o período de investigação, a maioria entre 8 e 14 de janeiro. Em relação ao boletim de quarta-feira, o balanço de ontem elevou em 35 o número de casos suspeitos e em seis os confirmados.

Quanto à área afetada pelo surto, já chega a 60 o total de municípios mineiros com notificações da febre amarela – seis a mais que no último levantamento. E em 31 deles já há casos confirmados. No dia do anúncio do surto, em 9 de janeiro, 15 cidades registravam notificações, ainda sem confirmação.

No Brasil, a forma urbana da febre amarela foi eliminada em 1942 e, desde então, só há ocorrência de casos silvestres com focos endêmicos. De acordo com o ministério, a maior parte dos recentes eventos de morte de macacos, em junho de 2014, ocorreu inicialmente na região Centro-Oeste do Brasil. “Posteriormente, foi observada a dispersão da transmissão nos sentidos Sul e Sudeste do país, quando afetou o estado de Minas Gerais, com registro de cinco mortes de primatas não humanos confirmadas até o momento”, informa o documento no site da Saúde.

O RASTRO DO SURTO Em março de 2016, uma pessoa morreu com a doença no município paulista de Bady Bassitt. Desde então, o número de mortes de macacos notificadas no estado vizinho aumentou e, no fim de 2016, já eram 16 confirmadas para febre amarela. Em dezembro, uma pessoa morreu pela doença em Ribeirão Preto (SP). No mesmo mês, pacientes começaram a adoecer em Minas e em 9 de janeiro o surto foi anunciado pelo governo mineiro.

Presidente da Sociedade Mineira de Infectologia, Estevão Urbano é enfático ao dizer que o documento do próprio ministério confirma que a intensa circulação viral detectada na região indica a dispersão do vírus, a manutenção da transmissão ativa e a necessidade de providências. “A questão é saber quais intervenções foram feitas e se elas foram adequadas. O monitoramento de mortes de macacos é feito justamente para perceber se há um problema que exija, por exemplo, reforço vacinal. É cedo para dizer o que falhou, mas é bem possível que tenha havido uma baixa atenção das autoridades.”

As mortes de macacos fora da época considerada normal também são avaliadas pelo infectologista Unaí Tupinambás, professor da Faculdade de Medicina da UFMG, como sinal de alerta que poderia ter sido observado. “Uma cadeia de eventos poderia ter sido evitada, como a baixa cobertura vacinal da população ”, diz. Dados da SES mostram que na última década (2006/2016), o percentual de imunização dos mineiros era de 49% para a febre amarela.

De acordo com SES, a vigilância de mortes de primatas é desenvolvida de modo permanente no estado, já que é um eixo importante do programa de controle da febre amarela. A secretaria informou que, diante da notificação de qualquer evento dessa natureza, medidas específicas são adotadas de imediato. Em relação à morte dos primatas, é feita a verificação da denúncia pelo setor de saúde do município e, em caso de confirmação – segundo a saúde estadual –, ocorre a abordagem da população sobre medidas preventivas, protetivas e de educação para o controle de possível circulação do vírus. Os profissionais de saúde também são mobilizados, de acordo com a secretaria, que anuncia já ter aplicado neste ano 1,9 milhão do total de 3,4 milhões de vacinas já distribuídas.

O Ministério da Saúde, por sua vez, informou que a maior parte dos municípios afetados até o momento está em área de recomendação de vacina e que, independentemente da ocorrência de eventos de febre amarela, a pasta já orienta a manutenção de elevadas coberturas vacinais, para evitar casos e surtos nas áreas onde se reconhece o risco de transmissão. “Anualmente, o Ministério da Saúde emite alerta às vigilâncias epidemiológicas para intensificação das ações de vigilância oportuna, antes do início do período sazonal (dezembro/maio), a fim de aumentar a sensibilidade dos serviços de saúde para a detecção de eventos suspeitos”, informou a pasta, em nota. O documento ressalta ainda que a vigilância de mortes de primatas tem como objetivo detectar precocemente a circulação viral, possibilitando ações de prevenção e controle em humanos.

Ainda de acordo com a nota, não houve demora para início das ações de controle do surto. “A vacinação começou a ser reforçada quando ainda foram notificados os primeiros casos suspeitos.” A pasta frisa que, além de a vacina estar disponível no calendário nacional, todo o estado de Minas já estava dentro da área com recomendação de imunização. Em 2016, o ministério sustenta ter enviado mais de 3,1 milhões de doses para Minas. Informa ainda que no mês passado foram enviadas como rotina mais de 135 mil vacinas ao estado, que recebeu mais 3,5 milhões de doses extras. O primeiro envio, de 150 mil doses, foi autorizado em 6 de janeiro, um dia após a comunicação sobre casos suspeitos.


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