(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas

A Vitória que embalou Maicon

"Não se esqueça nunca de que você é de Justinópolis, que veio de Neves", aconselha a mãe do atleta ao filho, com quem enfrentou longa corrida de obstáculos até o pódio da Rio'2016


postado em 28/08/2016 06:00 / atualizado em 28/08/2016 08:01

Aos 66 anos, dona Vitória comemora a maior conquista do filho atleta, por quem se dispôs até a passar noites à luz de velas para economizar(foto: Euler Júnior/EM/DA PRESS)
Aos 66 anos, dona Vitória comemora a maior conquista do filho atleta, por quem se dispôs até a passar noites à luz de velas para economizar (foto: Euler Júnior/EM/DA PRESS)
O nome dela traduz a luta e a superação que conquistaram uma medalha para o Brasil, a única de esporte individual de um mineiro. A senhora Vitória de Andrade Siqueira, de 66 anos, não é apenas a mãe do medalhista de bronze do tae kwon do, Maicon Andrade Siqueira, de 23. É uma mulher obstinada e de muita fé, que criou oito filhos em Justinópolis, distrito de Ribeirão das Neves, um dos mais carentes municípios da Grande BH. Em 2014, encarou uma cirurgia para câncer e venceu também o tratamento quimioterápico que levou dela os cabelos, mas não o vigor. Depois de tudo isso, ainda que com seu filho agora sob os holofotes devido ao feito esportivo improvável, considerando a sua origem, ela ainda lhe dá os mesmos conselhos de quando era um adolescente: “Não se esqueça nunca de que você é de Justinópolis, que veio de Neves, que é um mineiro. Nunca deixe de cumprimentar as pessoas e de ajudar os humildes. Isso é tão importante quanto conquistar nossos sonhos”.


A luta dela e do filho para vencer no esporte é uma trajetória de muitas dificuldades e que começou com uma teimosia, já perdoada pela dona Vitória. “Com 13 anos, Maicon entrou escondido para um projeto da prefeitura com os amigos e aprendeu tae kwon do lá. Ele disse que tinha medo de eu não deixar, por ser uma luta, mas sempre amei os esportes. Desde que ele era pequeno que assistimos juntos aos Jogos Olímpicos e Pan-americanos”, lembra. Dois meses depois, a mentira foi descoberta, porque o adolescente precisava de um quimono para participar da primeira competição. “Ele me pediu com tanta vontade que fiquei abalada. Daí veio o professor e conversou comigo e então cedi”, conta.


O problema é que a família não dispunha de dinheiro para comprar o uniforme. A solução foi usar os recursos que tinham para pagar a conta de energia elétrica. “Dei R$ 45 para comprar o quimono. O Maicon perguntou: ‘Mas como você vai pagar a conta de luz?’ Aí eu disse que se precisasse a gente usava velas”. O uniforme comprado, contudo, era de má qualidade. “Era de um tecido duro demais. Então peguei e lavei na mão com amaciante e passei à noite para ele até o tecido ficar macio e cheiroso”, lembra dona Vitória. E todo esse esforço valeu a pena, já que Maicon trouxe dessa competição uma medalha, que, ainda que feita de latão e num modelo muito simples, seria a primeira de uma trajetória vitoriosa que inundou a casa da mãe de troféus e outras insígnias.


No projeto social, Maicon continuou por muito tempo, mesmo com seus amigos abandonando as aulas. “Quando o projeto fechou por falta de apoio, ele procurou academias, mas não lhe deram uma oportunidade. Com isso, meu filho foi trabalhando de ajudante de pedreiro e de garçom, quando tinha serviço, para pagar pelas trocas de faixa”, conta Vitória. Para manter a forma, treinava na garagem de casa, onde amarrava sacos de laranja com travesseiros e enchimento no telhado para poder chutar. Até que o antigo treinador o chamou para competir em São Paulo. Como não vinha seguindo uma dieta balanceada, Maicon ficou triste ao ver que pesava 83 quilos, três acima de sua categoria. “Mas ele não desistiu. Pegou meus sacos de lixo e vestiu sobre o corpo, depois saiu vestindo roupas em cima. Aí ele saía correndo pelo bairro debaixo do sol para suar e conseguiu perder peso”, lembra a mãe do atleta.


Foi depois dessa competição que Maicon chamou a atenção da equipe de tae kwon do da cidade paulista de São Caetano, que, por fim, o chamou para morar lá e treinar até se classificar para os Jogos Olímpicos. “Tive de ensinar a ele como fazer comida, pelo telefone, porque Maicon só ficava sozinho. Mas nesses quatro anos ele viajou para várias partes do mundo. Antes de competir, me disse que ia trazer uma medalha para colocar no meu peito. Achava que era sonho, mas como sempre o incentivei a sonhar, ia com ele nesse sonho. Quando ele ganhou, pulou para cima de mim e dos amigos na arquibancada, uma vitória que nunca vou esquecer”, afirma a dona Vitória.


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)