(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas

Falta legislação para coibir o desperdício de água em Belo Horizonte

Copasa amplia captação para não deixar a Grande BH de torneira vazia, mas exagero no consumo pode levar o abastecimento ao colapso


postado em 21/10/2014 06:00 / atualizado em 21/10/2014 07:39

Mangueira para lavar garagem e a calçada, usando jato como se fosse um rodo: cena registrada em bairro de região nobre da capital e que se repete em outras áreas da cidade(foto: Mateus Parreiras/EM/DA press)
Mangueira para lavar garagem e a calçada, usando jato como se fosse um rodo: cena registrada em bairro de região nobre da capital e que se repete em outras áreas da cidade (foto: Mateus Parreiras/EM/DA press)


A seca que reduziu a vazão do Rio das Velhas em 50% abaixo do previsto para esta época do ano chegou a obrigar a Copasa a ampliar sua captação em cerca de 8,5% para manter o abastecimento de Belo Horizonte e da Grande BH. O volume normal, de 15 mil litros por segundo, foi ampliado pela concessionária primeiramente em 717,6 (+5%) nas captações regulares, e precisou receber outros 500 (+3,5%) de reservatórios da mineradora Anglogold Ashanti, como as lagoas dos Ingleses, Miguelão e Codornas, suspensos ontem, devido à previsão de chuvas.


Mas nem toda essa operação e as campanhas educativas da Copasa, com alertas como “se não poupar, vai faltar” e “para não racionar vai ter de economizar”, têm sido suficientes para impedir cenas de desperdício na capital mineira. A Copasa afirma que não tem atribuição legal para multar o desperdício, dependendo de lei específica, mas BH já teve, em seus primórdios, instrumentos legais para coibir o desperdício, punindo o bolso do consumidor.

Com a mangueira, depois de lavar dois veículos na porta da empresa, uma mulher usa o jato para limpar as paredes da garagem, o piso e a rampa, empurrando os flocos de sabão para o passeio, como se a água pressurizada fosse um rodo. A cena de desperdício registrada na Rua Bandeirantes, no Bairro Mangabeiras, Região Centro-Sul, repetiu-se ontem em outros edifícios e residências da região. Naquele mesmo bairro, um clínica de estética mantém uma cascata vertendo água sobre uma pedra que contém o logotipo do negócio.

Lavajatos submergem veículos em rolos que lançam água para todos os lados. No Sion, o rastro de água desperdiçada, que desce pelas laterais das ruas, leva até porteiros e faxineiras de prédios que usam mangueiras de alta pressão como se fossem vassouras e rodos, para facilitar a limpeza das portarias e irrigação dos jardins. “É um absurdo isso. O certo é usar um balde, pano úmido. Para não dizer a água das chuvas”, disse uma moradora da vizinhança, a nutricionista Tatiana Rubens, de 31 anos, que conta ser frequente esse tipo de atitude nas residências e condomínios próximos.

A capital mineira já teve duas legislações que previam multa para quem gastava água com desleixo, em 1908 e em 1948, ambas suspensas após a Copasa assumir o abastecimento. Ainda tramitam na Câmara Municipal outras três leis, que, desde 2009, esperam apreciação para definir sistemas mais eficientes de consumo em edificações e atividades econômicas.

A primeira lei contra o desperdício foi promulgada há 106 anos, pelo então prefeito Benjamin Jacob, e estava dentro de um texto que previa uma série de outras autuações para procedimentos diversos. Era no segundo artigo que a lei tentava promover a economia de água, mesmo sem ser muito específica. “Fica o prefeito autorizado a estabelecer multas até 50 mil réis para os casos provados de desperdício de água, tanto na zona urbana como na suburbana, podendo em caso de reincidência ser a multa elevada a 100$000”, dizia a legislação, que só foi revogada em 1993.

Já a última lei que tentou disciplinar o consumo de recursos hídricos na capital foi publicada 40 anos depois e logo em sua justificativa descrevia uma situação grave de desabastecimento que a capital enfrentava. “Tendo em vista a escassez de água e, afim de evitar o desperdício, fica criada uma taxa especial para prevalecer no decurso de dois anos”, começa o texto, que define como desperdício todo aquele consumidor que usasse água acima da média do ano anterior. A taxa cobrada sobre quem gastava demais era de dois cruzeiros por mil litros ou fração, e era cobrada juntamente com a taxa de água. Essa lei, sancionada pelo então prefeito Otacílio Negrão de Lima, foi revogada também no ano de 1993.

INEVITÁVEL O racionamento e a cobrança pelo desperdício são uma questão de tempo na opinião do biólogo e professor do Laboratório de Gestão Ambiental de Reservatórios (LGAR) da UFMG Ricardo Motta Pinto Coelho. “Se algo não for feito em breve, o colapso no abastecimento será inevitável. O uso racional da água pode prevenir isso, mas não descarto a necessidade de ações como racionamento ou cobrança pelo abuso no consumo e desperdício. Nossas outorgas estão acima do volume que os mananciais suportam por não preverem a seca e a degradação”, afirma o especialista.

O ambientalista e idealizador do Projeto Manuelzão, de conservação do Rio das Velhas, Apolo Heringer Lisboa também avalia que medidas mais severas sejam necessárias em breve. “Não foram feitas ações de conservação dos mananciais, a revitalização do Rio São Francisco, por exemplo, traria mais qualidade e quantidade de água a bacias que abastecem a Grande BH.”

Leis que não saem do papel

A chegada de uma massa polar no estado já contribuiu para um clima ameno na capital e interior e melhora a qualidade do ar, com elevação da umidade. Depois da marca recorde do ano de 36,6°C em Belo Horizonte, no domingo, ontem a máxima foi de 31,6°C. O meteorologista Ruibran dos Reis, do ClimaTempo, explica que a chuva de baixa intensidade na noite anterior e madrugada reduziu a temperatura máxima na capital, que pode cair mais até o fim de semana, chegando a 28°C. Em Minas, quem mora nas regiões Norte e Noroeste ainda enfrenta hoje e amanhã forte calor. Ontem, a máxima no estado foi de 40,8°C em São Romão, no Norte.

“Entre amanhã (hoje) e quinta-feira vai chover em boa parte do estado. Em BH, desde julho não chove continuamente. E assim vai prevalecer até dezembro. Antes disso, serão chuvas de baixa e média intensidade, em áreas isoladas. Mas a chegada da massa fria e outros sistemas vindos do Oceano Atlântico vão amenizar o calor, que, nos últimos dias, bateu recordes históricos, como os 41,6° C registrados em Ituiutaba e Campina verde, no Triângulo”, analisou Reis.

O meteorologista prevê que no decorrer da semana a temperatura na Região Central varie entre 18° e 28°C. Segundo ele, no domingo, quando ocorre a votação do segundo turno para eleição da Presidência da República, apesar de algumas nuvens, não vai chover. No Sul de Minas podem-se registrar mínimas de 12°C, com máxima de 36°C. No Triângulo, depois de máxima acima de 41°C, com a estabilização da massa fria, os termômetros não devem passar dos 34°C.

Para Ruibran, as chuvas nos próximos dias não serão suficientes para reverter os efeitos da seca nos mananciais dos principais rios e nem recompor reservatórios. O maior volume de chuvas, segundo ele, será em dezembro com 30% a mais que a média para o período no Noroeste, Zona da Mata e Região Central. Em janeiro, as regiões Oeste, Sul e Triângulo Mineiro terão 15% a mais da média de chuva. “Para recuperar o baixo nível dos rios e represas seriam necessárias três estações chuvosas. No próximo ano, fevereiro e março será de pouca chuva, a exemplo do que ocorreu este ano”.

CALOR INTENSO Estudos científicos mostram que a temperatura do ar em Minas, especialmente em BH, vem subindo nos últimos 100 anos. “No passado, as pessoas vinha à capital cuidar da saúde porque o clima era frio e úmido. Depois da década de 1980 houve um aumento significativo da temperatura do ar e queda da umidade relativa. Neste mês, a umidade relativa chegou a 13%”, assinala Ruibran.

As temperaturas desde janeiro estão ligeiramente acima da média histórica. Segundo o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), no relatório de 2007, as atividades antropogênicas são as responsáveis pela elevação do calor no planeta. Nos últimos 100 anos a temperatura da Terra subiu em torno de 0,8 graus. As coletas de dados em BH começaram em 1912 e a menor temperatura observada foi em 1979, de 3,1°C no mês de junho. Nos últimos anos 20 anos a mínima não ficou abaixo de 8°C. Nas décadas de 1920, 30, 40 e 50, as máximas na capital eram em torno de 34°C. O recorde é de 37,1°C, em outubro de 2012.


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)