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Estado de Minas

Praças do Centro de BH ganham novos nomes à revelia da prefeitura

Sem que a população percebesse, feministas 'trocaram' nomes de praças como as da Estação e Sete, com referências a mulheres que fizeram história. iniciativa divide opiniões entre frequentadores


postado em 15/05/2013 06:00 / atualizado em 15/05/2013 07:07

 

Logradouros dos mais conhecidos da capital mineira, no Centro da cidade, ganharam novas denominações à revelia da administração municipal(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Logradouros dos mais conhecidos da capital mineira, no Centro da cidade, ganharam novas denominações à revelia da administração municipal (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)


Não se espante caso alguém, um belo dia, o informe que o obelisco no Centro de Belo Horizonte fica na Praça Oito de Março, e não na Sete de Setembro. Ou que a rodoviária fica em frente à Praça Patrícia Galvão, e não à Rio Branco. O GPS pode até marcar Praça Rui Barbosa, mas quando chegar lá, você vai se deparar com a Praça Olga Benário. Ainda que na informalidade, endereços conhecidos da capital mineira mudaram de nome em homenagem a datas e personalidades importantes na luta pelo direitos da mulher. Adesivos foram pregados sobre as placas dos locais com a nova identificação e têm dado o que falar.

“A praça é do povo. Não tem nada disso de ter outro nome”, protesta Nilton Domingos, de 38 anos, frequentador assíduo da Praça Rio Branco, a Praça da Rodoviária, rebatizada com o nome da escritora e jornalista Patrícia Galvão, a Pagu, modernista, comunista e defensora de um papel mais ativo da mulher na sociedade brasileira. Funcionário de uma banca de revistas na Praça Sete há 25 anos, Isnaldo Brito, de 48, ficou de queixo caído ao saber da nova data que nomeia o cruzamento das avenidas Amazonas e Afonso Pena. “Oito de março? Isso não faz sentido! Não tinha reparado que mudou”, diz.

(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
A iniciativa partiu de militantes de movimentos feministas para divulgar a história de revolucionárias que marcaram a história e provocar uma reflexão na sociedade. “Queríamos criar um impacto visual e trazer essas figuras para nossas ruas, pois muitas vezes elas acabam esquecidas. As pessoas que se perguntam que nomes são esses e acabam resgatando a ideia de luta”, conta uma das idealizadoras, Larissa Costa, de 26 anos, da Marcha Mundial das Mulheres.

O primeiro adesivo foi colado no ano passado, em 8 de março, quando se comemora o Dia Internacional da Mulher, na Praça Sete. As placas continuam lá, e este ano, a turma resolveu expandir a proposta, batizando outros endereços só com o nome das heroínas do movimento feminista. “Em cada local, discutimos uma temática que tem relação com a história da homenageada”, diz. A Praça Raul Soares, reduto do público LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais), recebeu o nome Brenda Lee, travesti assassinada em 1996, em São Paulo, e que era conhecida como “o anjo da guarda dos travestis”.

(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Quem passa por ali já não encontra mais os adesivos. “Há menos de um mês, um casal ficou meio perdido por aqui porque não encontrava a Praça Raul Soares, mas só a Praça Brenda Lee. Aí, depois disso, eles tiraram”, conta um policial que faz ronda no local. O militar se mostra inclusive informado sobre o assunto. “Tem até um instituto em São Paulo com o nome Brenda Lee”, diz. Ele está se referindo à casa fundada pela homenageada em 1984 para dar apoio a portadores do vírus da Aids.

Escrava

O nome da escrava Luísa Mahin, importante figura nos movimentos contra a escravidão, está bem esquina da Rua da Bahia com o Viaduto de Santa Tereza, no Centro, onde militantes discutiram sobre o preconceito racial em março. Apesar da identificação, Raimundo Nestor, de 67, prefere continuar chamando o local de Rua da Bahia, mas fica desconfiado. “Será que mudou mesmo?”, pergunta o vendedor, que trabalha todo santo dia em frente ao local.

Na correria do dia a dia, poucos são os que percebem a mudança, já que os adesivos reproduzem com perfeição o padrão das placas. Quem se sensibiliza com a causa aprova a iniciativa. “Certamente é uma forma de chamar atenção para as mulheres”, diz a estudante Alice Melgaço, de 17. A garota está na Praça da Estação, onde o nome do político Rui Barbosa saiu de cena para dar lugar ao de Olga Benário, que participou da Intentona Comunista de 1935 e, deportada para a Alemanha nazista, morreu em um campo de concentração.

Alice defende a troca de nome e ainda dá sugestões. “Poderíamos ter alguma praça chamada Tarsila do Amaral”, sugere, em referência à pintora precursora do movimento modernista no país. Mas a iniciativa do Movimento Feminista não se ateve a homenagens póstumas. Maria da Penha nomeia a Praça Afonso Arinos, em frente à Faculdade de Direito, no Centro de BH. A farmacêutica cearense que ficou paraplégica por causa das agressões do marido, Marco Antônio Heredia, inspirou a criação da Lei 11.340, de 2006, contra a violência doméstica. “Esperamos que, ao olhar para essas placas, as pessoas pelo menos pensem nessas questões”, afirma Larissa.

 

 

QUEM É QUEM

Olga Benário

Chamada no Brasil de Olga Benário Prestes, Maria Bergner nasceu em 1908, na Alemanha, em uma família judia. Comunista, lutava contra as desigualdades sociais. Participou, ao lado de Luís Carlos Prestes, da Intentona Comunista de 1935. Com o fracasso da revolução no Brasil, os dois foram presos e separados. Grávida, Olga foi deportada à Alemanha nazista. A filha do casal, Anita, nasceu num campo de concentração e foi entregue a sua avó paterna. Em 1942, Olga morreu executada numa câmara de gás.

Brenda Lee
Travesti brasileiro, seu nome de batismo era Cícero Caetano Leonardo. Brenda Lee nasceu em 1948, em Pernambuco, e se mudou para São Paulo aos 14 anos. Dedicou a vida a ajudar os travestis e portadores do vírus HIV. Foi assassinada em 1996, mas sua casa de apoio continua ativa.

Maria da Penha
Farmacêutica cearense, é marco da luta da violência contra as mulheres. Em 1983, levou um tiro do marido enquanto dormia e ficou paraplégica. Depois de se recuperar, sofreu mais agressões. Em razão dessa luta, em 2006, foi criada a Lei 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha, que coíbe a violência doméstica.

Luísa Mahin
Natural de Costa Mina, na África, Luísa Mahin nasceu no início do século 19 e foi trazida para o Brasil como escrava. Participou de levantes de escravos que sacudiram a então província da Bahia, como a Revolta dos Malês (1935) e a Sabinada (1837–1838).

Patrícia Galvão
Jornalista, escritora, tradutora e professora, Patrícia Rehder Galvão, a Pagu  (1910–1962), foi uma das grandes figuras do modernismo brasileiro e defendeu papel mais ativo das mulheres. Seu livro Parque Industrial, de 1933, foi considerado o primeiro romance a ter operários como protagonistas no país.

 


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