(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas CRACK. DESESPERO COMPULSÓRIO

Cresce número de famílias que recorrem à Justiça em Minas para internar dependentes

Aumento é de 51% dos pedidos para que parentes sejam hospitalizados para ficar longe da pedra. Escalada ocorre apesar de a internação ser considerada última solução por MP e Defensoria e de ser negada na maioria das ações


postado em 10/05/2013 06:00 / atualizado em 10/05/2013 06:53

Dependentes na Lagoinha: demanda não encontra capacidade de resposta na saúde nem na Justiça(foto: Beto Magalhães/EM/D.A Press %u2013 17/4/13)
Dependentes na Lagoinha: demanda não encontra capacidade de resposta na saúde nem na Justiça (foto: Beto Magalhães/EM/D.A Press %u2013 17/4/13)

 

Mesmo com a média de internações compulsórias de dependentes de crack se mantendo estável em Minas nos últimos meses – 19 a cada 30 dias –, cresce o número de pessoas que batem às portas da Justiça pedindo hospitalização de usuários por via judicial. Enquanto 117 ações dessa natureza foram ajuizadas pela Defensoria Pública de Minas em 2012, 59 já foram propostas somente nos quatro primeiros meses deste ano, um aumento médio mensal superior a 51%. O crescimento, de acordo com o coordenador da Defensoria Especializada em Saúde, Bruno Barcala, espelha a corrida por atendimento. “A população está mais esclarecida sobre a rede de serviços. Com isso, a procura e o número de ações aumentaram”, diz.

Com os que buscam a intervenção dos defensores chegam relatos de insuficiência de vagas para atender a demanda da internação no estado. E o problema é maior do que indicam as estatísticas, porque nem todos os pedidos de hospitalização são levados adiante pela Defensoria e, dos que chegam ao Judiciário, pelo menos a metade é negada.

“As informações que chegam à Defensoria, seja por familiares de pessoas que chegaram a ser internadas ou até mesmo por profissionais da saúde, dão conta de que a rede não contempla a necessidade de internações”, afirma. O pior: a demanda cresce a cada dia. Apesar da procura em alta por internações, pesquisas feitas no Brasil mostram que a medida tem apenas 3% de efetividade no tratamento, como já afirmou o especialista em segurança pública Robson Sávio, coordenador do Núcleo de Estudos Sociopolíticos da Pontifícia Universidade Católica de Minas.

Outro problema enfrentado pelas famílias que esperam da Justiça aval para internar um parente dependente de crack é o baixo índice de deferimento de pedidos. De acordo com o defensor Bruno Barcala, apenas de 40% a 50% dos pedidos passam pelo crivo dos juízes. No restante, eles são indeferidos por falta de convencimento do magistrado de que a internação compulsória seja a melhor saída para o paciente. Barcala afirma que entre os defensores a prática também é de buscar soluções para o tratamento do dependente químico que nem sempre passem pela hospitalização por via judicial. “A internação compulsória é o último caminho. O tratamento pode ser via ambulatório, voluntário ou involuntário, por ordem médica”, ressaltou.

Na Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde de Belo Horizonte, a média de ações ajuizadas por mês ta
mbém mostra que a internação compulsória não é o caminho mais acessado. De acordo com o promotor Bruno Alexander Vieira Soares, coordenador do setor, são cerca de 20 pedidos do tipo recebidos por mês, mas apenas dois se transformam em ações judiciais. Isso ocorre, segundo ele, porque a internação só é indicada por esgotamento dos tratamentos em meio aberto. Além disso, é preciso que haja um laudo médico indicando a necessidade de hospitalização. “Nem todas as famílias têm o documento”, diz.

O representante do MP destaca a necessidade de um tratamento completo e intersetorial, que acompanhe o paciente também após a internação compulsória, para que não haja recaídas. Por outro lado, ele cobra a ampliação da rede de tratamento. “Não temos unidades de acolhimento, nem leitos para desintoxicação em hospitais gerais, o que está previsto na legislação.”

Recaída e agressão

"Não sei mais o que faço. Já não durmo e só terei alívio quando souber que Carolina está internada em um local seguro e com ajuda para se ressocializar", Sônia Cristina Moreira, mãe de Carolina Moreira, primeira mineira ser internada compulsoriamente, que voltou às drogas e foi agredida a facadas em uma briga com outros usuários (foto: Túlio Santos/EM/D.A Press )
A experiência de quem já passou pelo tratamento imposto por decisão judicial demonstra que, sozinha, a internação, na maioria dos casos, não é capaz de combater o vício. Um dos exemplos mais recentes foi a última recaída da usuária de crack Carolina Moreira, de 26 anos. Moradora do Bairro Boa Vista, Leste de Belo Horizonte, a jovem já passou por mais de 70 internações. Ela foi a primeira mineira a ter o pedido de hospitalização compulsória deferido pela Justiça, em outubro de 2011. Mas, sem conseguir emprego, voltou para as ruas. Na quarta-feira, Carolina foi esfaqueada depois de fugir do Centro de Referência em Saúde Mental (Cersam), no Bairro Santa Tereza, também na Região Leste, e se envolver em uma briga com outros dependentes. Agora a mãe dela, Sônia Cristina Moreira, de 44, tenta novamente apoio da Justiça para interná-la, mas quer também um suporte para manter a filha longe das drogas quando voltar para casa.

Foram nove meses de desintoxicação em uma clínica em Atibaia (SP). Para a mãe, ao voltar a BH jovem parecia recuperada. Ganhou peso, saltando de 39 quilos para mais de 60 e, animada, só pensava em trabalhar e construir uma relação de afeto com a filha, então com 3 anos. No entanto, dois meses se passaram e as oportunidades de trabalho não vieram. Sônia conta que a filha começou a ficar inquieta e um dia, ao sair para participar de um grupo de apoio, não voltou. “Ela não aguentou ficar sem uma ocupação. ‘Caiu’ e desde então é uma luta diária para tentar tirá-la dessa vida”, lamenta a mãe.

Na tarde de ontem, Sônia acompanhava a filha, que, depois de receber 10 facadas e passar a noite no Pronto-Socorro do Hospital João XXIII, foi encaminhada novamente ao Cersam. “Não sei mais o que faço. Já não durmo e só terei alívio quando souber que ela está internada em um local seguro e com ajuda para se ressocializar”, diz. Segundo a gerente do Centro de Referência Leste, Maria Tereza Granha Nogueira, a internação compulsória não tem efeito se não for feito um trabalho posterior. “No caso dela, a equipe de saúde mental tentou dar continuidade ao tratamento quando ela voltou de São Paulo, mas ela faltava às consultas e não conseguíamos encontrá-la em casa. Tudo isso dificulta a recuperação.”
 
Sem solução

A Secretaria de Estado de Saúde confirma a falta de leitos para atender a demanda por internação compulsória e diz não haver solução imediata para o problema. “O estado tem encontrado dificuldades, porque o Ministério da Saúde não autoriza a abertura de leitos”, alega a coordenadora estadual de Saúde Mental, Tanit Sarnur. Segundo ela, a situação é agravada por decisões judiciais que estipulam o período de internação. “Essa avaliação tem de ser feita pela equipe médica. Com as determinações dos juízes, temos casos de pacientes com condições de receber alta que continuam ocupando vagas.”

 

 

 

Saiba mais

Tipos de internação

Segundo o artigo seis da Lei Federal 10. 216/01, as internações de dependentes químicos se dividem em três tipos:

 Voluntária: aquela que se dá com o consentimento do usuário

 Involuntária: aquela que se dá sem o consentimento do usuário e a pedido de terceiros

Compulsória: aquela determinada pela Justiça, mas que depende de laudo médico


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)