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Estado de Minas

Acidente sob suspeita volta a ser investigado após mais de dois anos em Minas

Devido a indícios de assassinato, Polícia Civil reabre, quase três anos depois, inquérito que investiga morte de estudante de direito em capotagem de veículo no Noroeste de Minas


postado em 01/09/2012 06:00 / atualizado em 01/09/2012 07:06

"Agora tenho certeza, não foi acidente. Vou lutar até o fim contra a impunidade, até esgotar todos os recursos. Estou um pouco aliviado em saber que as investigações continuam", Eduardo Siqueira Moreira Soares, empresário, pai da vítima (foto: Élio Rizzo/Esp. CB/D.A Press/)


Dois anos e sete meses depois da morte da universitária Isabella Maciel de Macedo e Moreira, de 23 anos, em Buritis, no Noroeste de Minas, a Superintendência da Polícia Civil decidiu reabrir inquérito diante da suspeita de que a jovem não foi vítima de acidente de trânsito, mas de assassinato. Desde o início, o pai dela, o empresário Eduardo Siqueira Moreira Soares, de 50, ex-funcionário de uma montadora de automóveis e com experiência em acidentes de trânsito, suspeitou de algo errado e desconfiou das explicações do namorado da filha, o engenheiro Amir Miguel de Souza Filho, de 26, motorista da caminhonete Mitsubishi L200 Triton que teria capotado numa estrada vicinal, depois de cair numa vala, em 31 de janeiro de 2010.

O empresário contratou dois peritos de juizados cíveis e da Polícia Civil de Minas para análises técnicas e comparação das avarias no veículo com as lesões no corpo da vítima. O laudo concluiu que as características dos danos na caminhonete demonstram “que eles foram produzidos com a participação proposital e dolosa do elemento humano”.

Ainda de acordo com o laudo, a que o Estado de Minas teve acesso, a ausência de manchas de sangue no interior do veículo, associada à integridade das estruturas ali existentes, levaram os peritos a concluir que houve agressão contra a vítima em local externo ao veículo e não determinado pelos documentos dos autos, segundo revela relatório encaminhado à Superintendência da Polícia Civil. “Imperioso reafirmar, portanto, que os ferimentos na vítima Isabella também não foram decorrentes do semicapotamento intencionalmente tramado da caminhonete L200”, completa o laudo.

Diante de indícios de que não houve acidente, o chefe do Departamento de Investigações (DI), delegado Wagner Pinto de Souza, designou uma equipe de policiais para investigar o caso em Buritis. Amir será ouvido em Brasília (DF). “Estou apenas aguardando o inquérito para mandar minha equipe para Buritis. Inclusive já designei um delegado e ele está autorizado pela Superintendência da Polícia Civil”, disse Wagner Pinto, que analisou os laudos encomendados pelo pai da vítima, mas prefere não se manifestar sobre o caso.

Poucas provas

O delegado de Buritis, Pedro Henrique Cunha, por considerar o caso enigmático, solicitou uma equipe especializada em homicídios da capital para continuar as investigações. “O inquérito está no segundo volume e é extremamente emblemático, envolvendo pessoas de muitas posses em Buritis”, afirmou. Segundo ele, o acidente somente chegou ao conhecimento da Polícia Civil quatro dias depois. “Perdemos muitas provas. A sensação que a gente tem é de que alguém pegou o carro e tombou de propósito. Há testemunhas que viram o carro com os vidros depois do acidente e eles foram quebrados. A caminhonete não teve uma batida forte e o rapaz não sofreu nada. Em tese, é um homicídio doloso no trânsito, mas maquiaram todas as provas. O caso é extremamente obscuro e o inquérito não é fácil”, disse o delegado.

Ainda de acordo com o policial, a estudante de direito quase teve o braço direito decepado, mas no carro havia apenas uma gota de sangue, no teto, do lado direito do carona, “do tamanho de uma tampa de garrafa PET”. “A pessoa pegou essa menina e a jogou num hospital. Somente avisaram a família no dia seguinte. Quando pai dela chegou, ela já estava morta e não havia ninguém da família do rapaz. Há um monte de questionamentos e todo mundo que teve acesso ao inquérito ficou muito intrigado com as lacunas”, disse Pedro Cunha, que é o terceiro a presidir o inquérito, a ser comandado agora pelo delegado Frederico Abelha, da Homicídios da capital.

Engenheiro nega crime

Amir Miguel ainda mora Brasília. Procurado ontem, ele não quis comentar o caso. Mostrou-se surpreso com a informação de que a polícia vai retomar as investigações. Em depoimento à polícia de Buritis, em novembro de 2010, ele contou que no dia do acidente administrava a fazenda do pai, onde conferiu cercas e pastos enquanto Isabella lia um livro na sede. Disse que eles brincaram com o cachorro e que não tiveram nenhuma discussão sobre o relacionamento. Ele contou ainda que, por volta das 22h, foram a uma lanchonete em Buritis e apenas ela tomou bebida alcoólica e os dois namoraram até o início da madrugada. Segundo ele, na volta à fazenda, a 10 quilômetros da cidade, o carro capotou uma única vez ao passar por uma vala numa estrada de terra, ficando com as rodas para cima.

Amir afirmou ainda ter saído do carro para ver o estado de Isabella, que estava com uma fratura exposta no antebraço esquerdo. “Ela parecia desacordada, mas ao chamá-la ela recobrou a consciência e disse que sentia muitas dores”, afirmou ele à polícia.

O engenheiro explicou ter prestado socorro à namorada e que ficou sabendo da morte 15 minutos depois de ela dar entrada no hospital de Planaltina (DF). Contou ainda que seus pais e uma irmã foram ao hospital e o pressionaram a procurar atendimento em outro local, pois o médico de plantão havia saído e ele estava com a cabeça ferida. “Se não fosse por isso, eu teria permanecido no local”, afirmou à polícia. Ele ainda negou que tenha retirado o veículo da estrada e disse que o serviço foi feito pela seguradora. O advogado de Amir, Délio Fortes Lins e Silva Júnior, não foi localizado.

 

Pai acredita em montagem

Inquérito mostra muitas contradições na morte de Isabella Maciel de Macedo e Moreira em capotagem de carro em Buritis(foto: Élio Rizzo/Esp. CB/D.A Press/Reprodução)
Inquérito mostra muitas contradições na morte de Isabella Maciel de Macedo e Moreira em capotagem de carro em Buritis (foto: Élio Rizzo/Esp. CB/D.A Press/Reprodução)
O empresário Eduardo Silveira disse que sempre desconfiou que a filha Isabella Maciel foi assassinada e desde então decidiu  montar o quebra-cabeça. “Agora tenho certeza, não foi acidente. Vou lutar até o fim contra a impunidade, até esgotar todos os recursos. Estou um pouco aliviado em saber que as investigações continuam. Não estou querendo vingança. Quero desmascarar uma farsa. Acho que a minha filha descobriu algo muito grave e foi morta. Apagaram todas as fotografias da máquina dela. Ela era muito esperta e estava se formando em direito naquele ano. Eles tinham terminado o namoro uma semana antes e ela foi ao encontro dele na fazenda”, disse o pai.

O empresário conta que por volta das 7h de 31 de janeiro de 2010 recebeu um telefonema da ex-mulher, Anastásia Maciel de Macedo e Moreira, dizendo que a filha havia sofrido um acidente de trânsito em Buritis, onde tinha ido visitar o namorado na fazenda dos pais dele. Consta no inquérito que Isabella foi levada em estado grave para o Hospital Regional Planaltina (DF), mas o pai desconfia que ela já estava morta há mais tempo .

O pai conta que estranhamente Amir desapareceu depois de deixar a namorada no hospital, sem prestar qualquer esclarecimento do que havia ocorrido. Ele também estranhou o fato de que ninguém da família do rapaz tenha procurado sua família para dar explicações. “Ficamos sem saber a razão da morte ou se houve negligência no atendimento médico”, disse.

Segundo Eduardo, quando a Polícia Civil de Planaltina procurou a família de Amir, foi informada que o carro acidentado estava numa agência de veículos, em Brasília, à disposição da seguradora. “A família não soube informar a respeito de qualquer providência que tenha sido adotada na delegacia de Buritis (MG) ou sequer procurou saber se medida semelhante havia sido adota neste Distrito Federal”, informa o relatório policial.

A caminhonete foi apreendida para perícia e devolvida ao dono. Depois, Amir foi intimado duas vezes e não compareceu à delegacia. O advogado dele, Délio Fortes Lins e Silva Júnior, alegou na época que seu cliente estava abalado psicologicamente, mas não apresentou atestado médico. Três semanas depois, o engenheiro foi à delegacia.

Amir disse ter ligado do celular para o gerente da fazenda do pai, o zootecnista Fabrício Barros de Oliveira, e ele foi socorrê-los com uma picape. Ele contou  que levou a namorada na carroceria até o posto de atendimento médico de Buritis, mas os dois foram encaminhados a  hospital da cidade. O médico teria enfaixado o braço de Isabella e os orientou a procurar o Hospital de Base de Brasília, para cirurgia ortopédica, mas eles foram para Planaltina numa ambulância.

Um vigilante do Hospital Regional de Planaltina contou à polícia que a vítima chegou com o namorado e que ele, ao saber da morte, ficou “ensandecido” e bateu a cabeça contra o poste, o que teria provocado os ferimentos. O vigilante disse ter percebido que Amir estava embriagado.

Nas considerações finais da Polícia Civil de Planaltina, consta que Isabella morreu em razão das lesões decorrentes do acidente de trânsito. “Entretanto, conclui-se que Amir Miguel de Souza Filho, ao dirigir sob efeito de bebidas alcoólicas, assumiu o risco de produzir o acidente que deu cabo da vida da jovem Isabella Maciel de Macedo e Moreira”, relatou o delegado Edvaldo dos Reis Inácio. Para ele, o fato de Amir ter abandonado o corpo no hospital demonstra “elevado desprezo pela vida humana” e deixa claro que a conduta só se justifica em razão de ele temer ser autuado em flagrante por embriaguez. O delegado determinou que o expediente fosse encaminhado à delegacia de Buritis, sugerindo o interrogatório de várias testemunhas, e requisitou o exame indireto pelo prontuário médico de Amir, para certificar se realmente ele estava embriagado.

 

Peritos experientes

Um dos responsáveis pela novo laudo do acidente em Buritis, o engenheiro Paulo Ademar, que morreu há três semanas em acidente de carro, era perito criminal da Polícia Civil desde 1978. Era também perito oficial de juízos cíveis de BH e do interior, professor de investigação de acidentes relacionados à engenharia legal na Academia da Polícia Civil (Acadepol), pós-graduado em engenharia de segurança do trabalho e professor de segurança do trabalho de cursos de pós-graduação da Fumec e UFMG. Era ainda examinador licenciado do Detran e membro do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia (Ibape). O outro responsável pelo laudo, Ricardo Simões, é perito de juizados cíveis e criminais de Minas, pertence à Polícia Civil e é professor de física em diversas instituições de ensino, inclusive da Acadepol, onde é titular da cadeira de perícias de trânsito. 


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