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Estado de Minas

Igreja de São Francisco de Assis, em Mariana, é interditada mais uma vez

Segundo templo mais visitado de Mariana, Igreja de São Francisco de Assis é lacrada pela prefeitura com base em laudo do Iphan. Cobertura e estrutura estão comprometidas


postado em 30/05/2012 06:00 / atualizado em 30/05/2012 07:07

A imponência e a beleza da Igreja de São Francisco pedem socorro. Iphan diz que tudo será restaurado, mas não há data para o início das obras(foto: Iphan/Divulgação)
A imponência e a beleza da Igreja de São Francisco pedem socorro. Iphan diz que tudo será restaurado, mas não há data para o início das obras (foto: Iphan/Divulgação)
Mariana – Nem missas, nem festas religiosas, muito menos visitação pública. A Prefeitura de Mariana, na Região Central, interditou a Igreja de São Francisco de Assis, do século 18, que compõe com a Igreja de Nossa Senhora do Carmo e a Casa de Câmara e Cadeia, na Praça Minas Gerais, no Centro Histórico, um dos cartões-postais mais simbólicos e bonitos do estado. A secretária municipal de Cultura e Turismo, Walkíria Carvalho, disse ontem que a medida foi tomada a partir de um laudo do Instituto do Patrimônio Histórico e Nacional (Iphan), que apontou problemas na cobertura e estrutura do prédio. Esta é a segunda vez que a construção é fechada. A primeira foi em abril de 2009, por determinação judicial, quando o templo teve portas lacradas e ficou longe dos cultos e dos olhos dos turistas.

O laudo feito pelo engenheiro Luiz Mauro de Rezende, da Superintendência do Iphan em Minas, mostra comprometimento da estrutura de madeira existente na capela-mor, devido à ação de umidade do solo e infestação de cupins, bem como infiltração de águas pluviais nas abóbadas do coro e corredores laterais. Já no arco do cruzeiro há trincas nas cimalhas, revelando movimentação estrutural, enquanto na cobertura foi identificado um abatimento, sugerindo instabilidade e deterioração intensa. E mais: elementos como forros e pisos estão com degradação da estrutura, também originada pela ação de cupins e umidade. O comprometimento dos forros, registra o documento, abrange até a camada pictórica, de grande valor artístico, com risco de formação de lacunas e perda da leitura dos elementos figurativos.

De acordo com a chefe do Iphan em Mariana, arquiteta Raquel Alves Ferreira, o laudo recomenda a execução de um projeto para restauro integral do imóvel e ainda, como medida preventiva, a interdição e proteção dos elementos decorativos e integrados, “para salvaguardar este acervo de inquestionável valor artístico e histórico”. O Conselho Municipal de Patrimônio aprovou o uso de recursos do Fundo Municipal de Preservação para contratar um projeto de restauração, com licitação a cargo da prefeitura local.

Diante da necessidade urgente dos serviços, Walkíria explica que uma arquiteta vai elaborar o projeto de restauro, o qual será bancado pela prefeitura. Todo o serviço de recuperação também ficará a cargo da municipalidade, adianta a secretária, explicando que, por enquanto os custos da obra não estão orçados, muito menos estipulado o prazo que a igreja, a segunda mais visitada de Mariana – a primeira é a Catedral da Sé, na Praça da Sé – ficará fechada.

Antes resistente ao fechamento do templo barroco, a Ordem Terceira de São Francisco de Assis vê agora a necessidade urgente de obras. O presidente ou ministro da associação centenária, professor João Vicente de Souza, destaca a interdição como fundamental e que o problema maior está no deslocamento da cimalha (arremate superior da parede). “Depois da primeira interdição, não fizeram nada. Agora estamos confiantes que o serviço vai sair”, afirma João Vicente. O bem cultural e religioso, construído entre 1763 e 1789, é tombado pelo Iphan desde 1938. No sábado, véspera da Festa do Divino Espírito Santo, dava gosto ver as guardas de congado dançando em frente à igreja, mas a tristeza era evidente ao olhar para o templo e vê-lo com as portas trancadas. No passado, segundo testemunhas, um pedaço de madeira caído do teto teria machucado uma pessoa,  que foi levada para o hospital.

O promotor da comarca, Antônio Carlos de Oliveira, já pediu à Justiça, com base em outro laudo do Iphan, a interdição da Casa do Conde de Assumar, localizada atrás da Igreja de São Francisco e pertencente à irmandade. O local abriga um comércio e,  de acordo com o promotor, também oferece riscos. Segundo o superintendente do Iphan em Minas, Leonardo Barreto de Oliveira, a interdição busca, além da preservação do patrimônio, garantir a segurança dos devotos e visitantes.

Primeira interdição

Em março de 2009, a Igreja de São Francisco de Assis teve as portas lacradas, com proibição de atividades religiosas e visitação pública, até que fossem executadas obras para garantir a estabilidade da estrutura e a segurança dos visitantes, conforme determinou a juíza Lúcia de Fátima Magalhães Albuquerque Silva. Na época, o pedido de interdição partiu do Ministério Público estadual, por solicitação do escritório regional do Iphan. Relatório do instituto federal revelou que os danos eram consequência do excesso de umidade proveniente de infiltrações e do ataque intenso de cupins. Destacando que o perigo era “desabar e matar alguém”, o promotor de Justiça Antônio Carlos de Oliveira, na ação proposta, citou o boletim de ocorrência do Corpo de Bombeiros Militar, datado de 5 de janeiro de 2009, que constatou agressões às pinturas do Mestre Ataíde, que foi sepultado na igreja.

Em abril, o templo foi reaberto à visitação, com base no laudo de um perito, embora o então juiz da comarca, Antônio Carlos Braga, não tenha afastado eventuais problemas na estrutura e de proteção do acervo, que precisavam ser resolvidos: “Apenas estou reconhecendo que, conforme conclusão do perito, ‘inexiste risco de desabamento total ou parcial’, fato que, entendo, justifica a revogação da liminar.”

Arte do Mestre Ataíde

Em 5 de julho de 1761, a Venerável Ordem Terceira de São Francisco da Penitência decidiu edificar sua igreja e recebeu autorização do bispo diocesano dom Frei Manuel da Cruz. Inicialmente, a escolha foi pelo projeto do padre José Lopes Ferreira da Rocha e execução do arquiteto José Pereira dos Santos . Mas outro foi proposto pelo arquiteto José Pereira Arouca, que arrematou  a “obra de pedra e cal da igreja”. Dois anos depois, em 15 de agosto, a pedra fundamental foi lançada. Ao lado de Arouca, também enterrado na igreja, trabalharam o marceneiro Manuel Duarte de Oliveira, o carpinteiro Manuel da Silva Benevente e o entalhador Luiz Pinheiro.

A primeira missa foi celebrada em dezembro de 1777, quando começou uma série de intervenções. Em 1794, a igreja foi entregue concluída pelo irmão Miguel Teixeira Guimarães, administrador da obra. No período de 1791 a 1825, entre os oficiais que edificaram e ornamentaram a igreja estava o pintor Manuel da Costa Ataíde, figura notável do barroco mineiro e responsável pelo douramento do retábulo do altar-mor, do trono, do tabernáculo e do altar de Santa Isabel . Os painéis do forro da sacristia e do teto do corpo da igreja são de autoria desconhecida, embora haja dados a respeito de um pagamento efetuado em 1816-1817 pelas pinturas da sacristia . Diferentes pintores contribuíram na execução das obras , como Francisco Xavier Carneiro, professor que examinou as obras de Ataíde, João Lopes Maciel, José Luís de Brito, José Joaquim do Couto, Francisco Moreira de Oliveira e João Nepomuceno Correa e Castro.

Outro artista renomado que trabalhou na capela de São Francisco foi Francisco Vieira Servas, considerado um dos mais importantes da fase áurea dos retábulos e imagens religiosas da Capitania de Minas. Servas recebeu pelo trabalho do novo trono do altar-mor, no início do século 19. Os ferreiros também contribuíram para a edificação.


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