O ex-presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, de 82 anos, iniciou radioterapia para tratar o câncer de próstata agressivo com metástases ósseas divulgado em maio deste ano. Paralelamente, Biden vai receber terapia hormonal. O anúncio foi feito no último sábado (11/10) por um porta-voz do ex-presidente à agência AFP.

Segundo a equipe médica, o tratamento tem como objetivo controlar o avanço da doença e aliviar sintomas após o diagnóstico de um adenocarcinoma prostático com escore de Gleason 9 (grupo de grau 5), o mais alto grau de agressividade.

O que é radioterapia?

A radioterapia é uma das três principais modalidades de tratamento contra o câncer, ao lado da cirurgia e das terapias sistêmicas com medicamentos. No câncer de próstata, pode ser indicada em diferentes fases da doença: desde o tratamento inicial e curativo até o controle de sintomas em estágios mais avançados.

“Mesmo em casos avançados, a radioterapia pode desempenhar um papel fundamental no controle da doença”, explica Erick Rauber, radio-oncologista e diretor de comunicação da Sociedade Brasileira de Radioterapia (SBRT).

“Ela pode ser indicada tanto para o tratamento localizado na próstata quanto para as áreas com metástases ósseas, com o objetivo de aliviar sintomas, retardar a progressão do câncer e melhorar a qualidade de vida do paciente”, complementa.

De acordo com o radio-oncologista, os ossos são os locais mais comuns de disseminação do câncer de próstata, e a radioterapia é frequentemente usada para tratar essas lesões metastáticas, controlando a dor e prevenindo fraturas ou complicações neurológicas.

Além da função paliativa, o tratamento também é utilizado com intenção curativa, seja como terapia principal em tumores localizados, seja como complemento pós-cirurgia. “A radioterapia tem papel fundamental no tratamento do câncer de próstata. Estudos recentes mostram que técnicas como a radioterapia hipofracionada e a ultrahipofracionada, com menos sessões e doses mais concentradas, mantêm alta eficácia e reduzem efeitos colaterais”, revela Erick.

Quando a radioterapia é recomendada?

A American Cancer Society (ACS) orienta que a radioterapia pode ser o tratamento inicial do câncer de próstata localizado, com taxas de cura comparáveis às da cirurgia radical. Em tumores localmente avançados - quando o câncer extravasa a cápsula prostática ou invade as vesículas seminais (glândulas do sistema reprodutor masculino), a radioterapia pode ser combinada a terapias hormonais.

Já em casos metastáticos, como o de Biden, o tratamento pode ter objetivo paliativo ou de controle local, reduzindo a dor e preservando a função óssea.

Após a cirurgia, a radioterapia pode ser aplicada de forma adjuvante (quando há risco de células residuais) ou de resgate (em caso de elevação do PSA, o marcador do câncer de próstata).

“Hoje damos preferência à radioterapia de resgate precoce, iniciada assim que o PSA começa a subir de forma consistente após a cirurgia, pois ela mantém boa eficácia e reduz o risco de recidiva”, destaca Elton Teixeira Leite, radio-oncologista e diretor científico da SBRT.

Desigualdade

As modalidades mais utilizadas no câncer de próstata são a radioterapia de feixe externo e a braquiterapia, em que pequenas sementes radioativas são implantadas diretamente na próstata. Entre as técnicas de feixe externo, a radioterapia de intensidade modulada (IMRT) se consolidou como um avanço tecnológico importante. 

“A IMRT permite ajustar com precisão a intensidade dos feixes de radiação, poupando órgãos vizinhos como bexiga e reto, e oferecendo melhores resultados clínicos com menos efeitos adversos”, afirma Elton Teixeira.

Contudo, ainda que a IMRT esteja incorporada ao Rol de Procedimentos da ANS (tratamentos disponíveis em planos de saúde) para diferentes tipos de câncer, incluindo o de próstata, o mesmo avanço ainda não chegou integralmente ao Sistema Único de Saúde (SUS).

“Se os pacientes do sistema público tivessem acesso à alta tecnologia, estaríamos investindo em tratamentos potencialmente mais eficazes, com menos complicações e maior custo-efetividade para o sistema”, afirma o radio-oncologista.

Segundo um levantamento da SBRT, apenas 51% dos serviços públicos de radioterapia no país dispõem de equipamentos capazes de realizar IMRT. O cenário é agravado pela defasagem de aceleradores lineares e pela carência de profissionais qualificados.

Câncer de próstata no Brasil

O Instituto Nacional do Câncer (Inca) estima que o Brasil deve encerrar 2025 com cerca de 70 mil novos casos de câncer de próstata. A neoplasia é a segunda mais comum entre homens, atrás apenas do câncer de pele não melanoma.

No Brasil, cerca de 75% dos pacientes dependem exclusivamente do SUS para tratamento, o que representa mais de 53 mil homens por ano. Estima-se que a radioterapia seja indicada em cerca de 60% desses casos, ou seja, mais de 32 mil pacientes com câncer de próstata deveriam ter acesso à radioterapia anualmente.

Entretanto, dados do DataSUS levantados pela SBRT em 2023 mostram que apenas 22.541 pacientes realizaram radioterapia para câncer de próstata naquele ano. O déficit, de cerca de 10 mil homens sem tratamento anual, revela um dos maiores gargalos do sistema público de saúde.

“O SUS ainda remunera os tratamentos oncológicos com base apenas no tipo de tumor, sem considerar a complexidade ou a tecnologia empregada. Isso desestimula o uso de técnicas modernas como a radioterapia IMRT, que são mais precisas e geram menos efeitos colaterais”, enfatiza Erick Rauber.

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