No ano em que tentará o quarto mandato no Palácio do Planalto, Lula terá como desafio fazer com que seu governo intensifique entregas que consolidem alguma identidade à sua terceira passagem pela Presidência e fortaleçam sua condição de favorito nas urnas de 2026.
A administração do petista chegou ao poder com o mote da defesa da democracia e da reconstrução nacional, mas caminhava sem uma marca clara até meados de 2025. Foi quando ganhou de presente de Eduardo Bolsonaro o argumento da soberania nacional, encampado em meio às articulações de Eduardo com o governo Donald Trump contra o Brasil e o STF.
O discurso da soberania serviu para reaglutinar o governo e a esquerda, desgastar o bolsonarismo e devolver fôlego a Lula nas pesquisas, cujos resultados se converteram de reprovação crescente para retomada na aprovação ao presidente. Para o próximo ano, no entanto, tudo isso já estará há tempos mais do que superado e precificado. É preciso mais e Lula sabe disso.
“O ano de 2026 será um ano de muita entrega. Eu quero que cada ministro, cada ministra, tenha clareza de que o próximo ano é o ano de a gente colher tudo o que nós plantamos nesses três anos. É o ano de inaugurar obras, é o ano de consolidar programas”, disse o petista em 17 de dezembro, na última reunião ministerial do ano, na Granja do Torto.
Segundo dados apresentados por Rui Costa no mesmo dia, o Novo PAC ainda tem por executar cerca de 30% do R$ 1,3 trilhão em investimentos previstos até 2026. Aposta do governo para estimular a economia, o programa, diga-se, cheira a naftalina de gestões petistas anteriores e passou longe do protagonismo de outrora.
Na pauta econômica do governo, como é corrente desde 2023, a redução de juros, atualmente em 15%, seguirá sendo uma bandeira em 2026, assim como os olhos voltados ao preço dos alimentos, sobretudo em um ano eleitoral. Fernando Haddad deve deixar o Ministério da Fazenda até fevereiro. Dario Durigan, secretário-executivo da pasta, tem sido cotado para a sucessão de Haddad, que pretende coordenar a campanha de Lula, mas é visto no PT como um ativo eleitoral para São Paulo.
Além da economia, habitualmente protagonista de disputas nacionais, outro fator deve ganhar peso na eleição presidencial: a segurança pública. Segunda maior preocupação dos brasileiros, atrás apenas da Saúde e à frente da Economia, conforme o Datafolha, a segurança não é de responsabilidade direta do governo federal, mas pressiona o Planalto e eriça a oposição em momentos de crise, a exemplo da megaoperação policial que deixou 121 mortos no Rio de Janeiro, em outubro. Para se contraporem ao governo petista, governadores que planejam disputar a Presidência têm apostado em um discurso de endurecimento contra o crime à la Nayib Bukele.
No Congresso, com o qual Lula encerra 2025 estremecido, o presidente entrará em 2026 em um momento de aparar arestas com Davi Alcolumbre e Hugo Motta. O petista, afinal, tem uma indicação ao STF pendente no Senado, a de Jorge Messias, chefe da Advocacia-Geral da União. Mas também deverá articular no Legislativo bandeiras eleitorais pela reeleição, como o fim da escala 6×1.
O movimento de redução de danos, na seara propriamente eleitoral, também se estenderá à relação do Planalto com o Centrão, do qual Alcolumbre e Motta são expoentes. Alguma proximidade com os partidos de centro ajudará Lula na formação de palanques fortes nos estados — não só pensando em governos estaduais, mas especialmente para tentar frear a volúpia do bolsonarismo por cadeiras no Senado, de olho em retaliações contra o STF a partir de 2027. A Casa renovará dois terços das vagas em 2026.
Entre os potenciais desgastes eleitorais para Lula, um em especial, ainda incipiente, tem potencial de gerar intensas dores de cabeça ao presidente: as fraudes no INSS e suas implicações sobre Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha, primogênito do petista.
Investigações da Polícia Federal rastrearam relações e negócios entre Antônio Carlos Camilo Antunes, o Careca do INSS, rosto do escândalo, com a empresária paulistana Roberta Luchsinger, amiga de Lulinha. Roberta foi alvo de mandados de busca e apreensão na fase mais recente da Operação Sem Desconto. O filho de Lula e o Careca do INSS estiveram no mesmo voo da Latam de Guarulhos para Lisboa, na primeira classe, em novembro de 2024.
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No âmbito do governo, outra fonte de problemas para Lula pode surgir ao norte, em meio à ofensiva dos Estados Unidos contra a Venezuela de Nicolás Maduro. O petista pode se ver em 2026 diante da necessidade de buscar alguma mediação entre Donald Trump e Maduro. Os Estados Unidos têm aumentado a pressão em uma ofensiva contra o regime venezuelano, sob alegações de combate ao narcotráfico. O ditador historicamente foi um aliado de Lula e do PT.
