Parte do mal-estar entre a cúpula do Congresso e o Palácio do Planalto se formou na maré das críticas à atuação dos presidentes das duas casas legislativas nas redes sociais e nas ruas, com as manifestações contra a anistia e ao PL da dosimetria, ambos parados na Câmara. A onda que se formou na internet sob o slogan “Congresso inimigo do Povo” causou estragos significativos na imagem do Parlamento. Pressionados pelas postagens, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), no Senado, e Hugo Motta (Republicanos-PB), na Câmara, identificam digitais do governo nessa mobilização, que inclui perfis alinhados ao Planalto.
O incômodo em relação a hashtag que bombou nas redes teve desdobramentos. Nesta semana, em confronto com o governo devido à indicação do ministro Jorge Messias (Advocacia-Geral da União) para o uma vaga no STF (Supremo Tribunal Federal), Alcolumbre reclamou do alto da mesa diretora do Senado, em um pronunciamento com tapas na mesa e pausas eloquentes na fala. Ele informou que a difamação do Parlamento nas redes será investigada pela Polícia Legislativa do Senado e da Câmara e que, em breve, os políticos “patrocinadores” serão expostos.
“É justo o Congresso brasileiro ser tratado e patrocinado por autoridades do Brasil como um Congresso inimigo do povo?”, questionou. “A Polícia Legislativa do Senado está investigando, a Polícia Legislativa da Câmara está investigando e logo mais vamos trazer a público aqueles que fizeram aquelas agressões contra o Congresso”, disse.
Incômodo antigo
O presidente do Senado, no mesmo discurso, reclamou que a hashtag “Congresso inimigo do Povo” passou a ser usada para caracterizar sua indignação em relação a indicação de Messias em vez de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), nome indicado por ele para a vaga. “A presidência está vivendo nos últimos dias como se quisesse usurpar [do presidente da República] a prerrogativa de indicar”, reclamou.
A indignação de Alcolumbre com o uso da frase foi a mesma sentida por Motta quando ele privilegiou assuntos da oposição na pauta da Câmara. Em vez de acelerar o trâmite de propostas de interesse do Planalto, como a isenção do IR (imposto de renda) para pessoas que ganham menos de R$ 5 mil, Motta pautou a urgência para a anistia aos condenados pela tentativa de golpe de Estado e mandou construir a proposta de revisão da dosimetria aplicada pelo STF aos condenados. O presidente da Câmara virou alvo preferencial das manifestações que ganharam as ruas de todos país com a frase “Congresso inimigo do povo”.
Em uma das suas efêmeras reconciliações com o governo, em setembro desse ano, na solenidade de sanção do Plano Safra, diante do presidente Lula, Motta tentou rebater a pecha de “inimigo”, mostrando que as leis sancionadas fizeram parte das “pautas positivas” que ele fez andar na Câmara. Na ocasião, indicou que o Congresso era “amigo do povo”. “Fiz questão de incluir na pauta da Câmara dos Deputados esses projetos. O Congresso tem sido amigo do povo. Esse compromisso, mesmo em meio a tantas divergências, reforça o nosso compromisso”, afirmou.
Aceno
Apesar da insatisfação com a campanha contra o Congresso e com a indicação, Alcolumbre, nesta sexta-feira, 5, demonstrou uma abertura para uma reaproximação com Lula. Em evento no Amapá, ele se dirigiu ao ministro da Saúde, Alexandre Padilha, por meio de quem enviou um “agradecimento” ao presidente. “Padilha, muito obrigado. Leve meus agradecimentos, pessoal e institucional, ao presidente da República, que tem nos apoiado e apoiado o Amapá a todo instante”, afirmou ele, ao discursar.
É necessário ponderar, no entanto, que o grau irritabilidade de Alcolumbre com a frase que viralizou nas redes se assemelha ao de Motta e, portanto, tem potencial de azedar novamente o clima.
