Romeu Zema se reuniu com o ministro Fernando Haddad para discutir a dívida do estado com a União -  (crédito: GABRIEL VARGAS/GOVERNO DE MG)

Romeu Zema se reuniu com o ministro Fernando Haddad para discutir a dívida do estado com a União

crédito: GABRIEL VARGAS/GOVERNO DE MG

O governo de Minas Gerais vai pedir ao Supremo Tribunal Federal (STF) a prorrogação dos efeitos da liminar que suspende a cobrança da dívida do estado com a União, hoje em torno de R$ 160 bilhões. A medida foi anunciada ontem pelo governador Romeu Zema (Novo) após um dia de reuniões em Brasília. Ele esteve com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e depois com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), e se mostrou receptivo à proposta apresentada para sanar os débitos do estado. Ainda assim, não descartou o Regime de Recuperação Fiscal (RRF), em tramitação na Assembleia Legislativa, como opção para omo alternativa para o débito bilionário.

Em entrevista coletiva após reunião com Haddad, Zema falou sobre a prorrogação dos efeitos da liminar do STF. Esta foi a medida concreta anunciada por ele após as reuniões na capital federal em que se mostrou disposto a acatar propostas como a federalização de empresas estatais. O governador disse que espera que o Supremo atenda ao pedido e que o governo federal se junte ao estado na solicitação.

“Temos uma questão que é o prazo do dia 20 de dezembro. Passamos isso aqui para o ministro Haddad. Ele também já tinha um conhecimento prévio dessa proposta do presidente Pacheco. Nós estaremos encaminhando hoje ainda um ofício para o Ministério da Fazenda para que o mesmo, juntamente com a nossa Secretaria de Fazenda e Advocacia Geral, avaliem um modo para que, em conjunto, tanto o governo de Minas quanto o governo federal possam, no Supremo Tribunal Federal, estudar uma forma de prorrogar esse prazo. Eu saio daqui extremamente satisfeito e esperançoso de que quem sabe o meu sucessor não tenha de lidar com um problema que já custou tanto aos 20 milhões de mineiros”, disse Zema.

MARÇO

A extensão do prazo deverá atender ao período apresentado por Haddad ao governo estadual para que a equipe técnica do Ministério da Fazenda formule uma proposta concreta a partir do projeto costurado com deputados estaduais e Rodrigo Pacheco. Segundo Zema, o ministro pediu até o fim de março do ano que vem para formalizar o projeto.

Caso não ocorra a prorrogação, parcelas da dívida já começarão a ser cobradas no ano que vem. As cifras totais do débito mineiro com a União hoje são de cerca de R$ 160 bilhões. Na mesma entrevista, o secretário de Governo de Zema, Gustavo Valadares, disse que, como não há garantia de que o pedido será atendido pelo STF, o projeto de adesão ao Regime de Recuperação Fiscal seguirá tramitando na Assembleia Legislativa.

Enquanto nós não tivermos uma mudança com relação ao prazo, ao deadline que o Supremo Tribunal Federal impôs ao estado de Minas Gerais, nós não desistiremos do regime, muito menos da sua tramitação. Os dois projetos que tratam do regime na Assembleia, o projeto do regime em si e o do teto de gastos continuam a sua tramitação. Estamos trabalhando para que até o final da próxima semana estejam os dois prontos para serem apreciados em plenário”, disse Valadares.

No momento, o projeto do RRF está parado na Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária (FFO) do Legislativo mineiro e só deve voltar à pauta na próxima terça-feira. O regime determina uma série de medidas de austeridade econômica e é a principal opção de Zema para a situação fiscal do estado desde seu primeiro ano à frente do governo mineiro, em 2019.

ATIVOS

Nas duas reuniões de ontem, Zema se mostrou disposto a aceitar uma das propostas do plano de Pacheco: a federalização de ativos como a Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig), a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) e a Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) como forma de abater o valor da dívida.

Durante a entrevista, acompanhado do secretário Gustavo Barbosa, o governador disse ver a ideia com bons olhos, mas adotou tom cauteloso. Ambos disseram que todas as medidas devem ser analisadas com cuidado pela equipe técnica do estado, reiterando a necessidade de prorrogação dos efeitos da liminar do Supremo Tribunal Federal. “Tudo é muito embrionário nesse momento. Falar qualquer coisa aqui agora seria querer adivinhar o futuro. Tudo será analisado e discutido. O que existe no momento são propostas que podem ou não ser viáveis”, afirmou o chefe do Executivo estadual.

FEDERALIZAÇÃO

Em entrevista coletiva logo após se reunir com Romeu Zema, Rodrigo Rodrigo Pacheco falou sobre a aceitação de um dos pontos do projeto costurado junto a deputados estaduais e ministros do governo federal. Segundo ele, o governo Zema já se mostrava inclinado a privatizar ativos da Codemig, da Cemig e da Copasa. Na visão do senador, quem já planejava ceder o controle das empresas à iniciativa privada não teria problemas com a hipótese de uma federalização.

“Falamos da Copasa, da Cemig e da Codemig e sempre houve nitidamente uma disposição, inclusive, de venda desses ativos para a iniciativa privada. Então, nada impede também que se faça uma federalização, eventualmente em melhores condições para o estado, como uma forma de pagamento da dívida. O governador Romeu Zema se mostrou sensível e com disposição para poder evoluir dessa forma”, afirmou o parlamentar.

“Acho que é uma medida muito sustentável e inteligente do governo de, ao invés da gente prorrogar e jogar o problema para o futuro e para as próximas gerações, a gente tentar, nessa geração agora, resolver o problema de Minas Gerais [...] aquele que está disposto a vender para a iniciativa privada pode estar disposto a entregar para outro ente federado para solucionar um problema grave do estado”, completou Pacheco.

A dívida de Minas Gerais com a União é uma pauta recorrente em Brasília desde a semana passada. Na quinta-feira, Rodrigo Pacheco se reuniu com o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, com o presidente da Assembleia Legislativa, Tadeu Leite, e com líderes de blocos do Parlamento mineiro para elaborar a proposta alternativa ao Regime de Recuperação Fiscal apresentada na última terça-feira (21/11) ao presidente Lula e, ontem a Romeu Zema.

APOSTA

Desde seu primeiro mandato, Zema tem no Regime de Recuperação Fiscal sua aposta para lidar com o endividamento do estado. Após uma primeira legislatura sem avanços no Legislativo, o governador conseguiu, em outubro deste ano, enviar o plano do RRF à Assembleia para votação. A proposta, no entanto, recebe fortes críticas da oposição e é recebida com desconfiança mesmo por membros da base governista.

O Regime de Recuperação Fiscal é uma alternativa prevista na Lei Complementar 159/2017, que determina uma série de medidas de austeridade econômica para unidades federativas que desejam renegociar dívidas com a União. No plano de Zema para adesão ao RRF, os pontos mais criticados são a previsão de apenas dois reajustes salariais aos servidores, de 3% cada, nos nove anos de vigência do regime; e o fato de que não está previsto o pagamento dos débitos com a União durante o período. Com a adição do serviço da dívida, uma soma da amortização, encargos e juros, o valor devido saltaria dos atuais R$ 160 bilhões para R$ 210 bilhões em 2032, segundo a Secretaria de Estado de Fazenda.

Sob efeito de liminar do Supremo Tribunal Federal, Minas não pagou a dívida com a União nos últimos cinco anos. O efeito da medida se encerra ao fim de 2023, por isso, o governo do estado corre contra o tempo para evitar que parcelas pesadas dos débitos comecem a sair dos cofres mineiros a partir de janeiro. Só durante a gestão de Zema, o valor devido teve um salto de 36%.

PROPOSTAS

A proposta costurada por Pacheco junto a deputados estaduais e ministros do governo federal conta com quatro medidas centrais para tentar solucionar as dívidas dos estados, tendo como base a situação mineira. O primeiro ponto é a federalização de empresas estatais como a Codemig, a Cemig e a Copasa. O valor das empresas seria abatido do débito e o estado teria direito a uma cláusula no contrato que prevê a recompra dos ativos em até 20 anos.


O segundo ponto é a cessão à União do crédito ao qual o estado terá direito pelos acordos de reparação com as mineradoras responsáveis pelas tragédias de Mariana e Brumadinho. Este repasse dos créditos, de acordo com a proposta, deve ser feito mediante condição de que os recursos sejam integralmente aplicados em Minas Gerais.


A terceira medida é usar os R$ 8,7 bilhões obtidos via acordo de compensação pelas perdas da Lei Kandir, celebrado no STF para abater no valor da dívida. O último ponto é a instituição de um novo Refis [Programa de Recuperação Fiscal] para os estados, concebido pelo governo federal e o Congresso Nacional, que institui uma regra geral para os estados devedores que desejam quitar seus compromissos com a União.

A fúria do PP

A bancada mineira do PP está furiosa com o secretário-chefe da Casa Civil, Marcelo Aro. Ontem, os deputados Pinheirinho (PP-MG) e Ana Paula Junqueira (PP-MG) abandonaram uma reunião com o governador Romeu Zema (Novo), ao descobrir que o articulador do Executivo mineiro estaria presente na sala. Sem oferecer nenhuma explicação, os dois parlamentares se retiraram do local. E não é apenas com o PP, partido ao qual ele é filiado, que Marcelo Aro vem causando conflitos. Encarregado das negociações do governo em Brasília, o secretário, que é ex-deputado federal, também tem irritado grande parte da bancada mineira na capital federal.


Aro foi selecionado por Zema devido à sua experiência em Brasília. No entanto, nos bastidores, a falta de comprometimento do governo com os deputados tem sido tema de discussão. Há a sensação de que o governador raramente se faz presente para as negociações, enviando sempre Aro para resolver os problemas. Na ótica de alguns parlamentares, Aro precisa deixar de ser o "mensageiro" de Zema, e o governador precisa retomar os compromissos assumidos durante a campanha eleitoral.