“Amor”

“Começava a clarear quando o pequeno mamute, com pouco mais de um mês de vida, se afastou da mãe. Movido pela curiosidade inocente dos pequenos, se atreveu pela superfície instável de um lago congelado e, quando o gelo cedeu, o filhote se viu em apuros, sufocado pela lama acumulada no leito do rio que ali desaguava. O pequeno mamute se debateu em vão: quanto mais se esforçava para soprar a lama pelas trompas, mais os sedimentos avançavam em direção à traqueia e aos brônquios. Sem conseguir respirar, cedeu, exausto, e sucumbiu no fundo do lago.

Mais ou menos quarenta e dois mil anos depois, numa manhã luminosa na península de Yamal, na Sibéria, o pastor de renas Yuri Khudi notou um volume estranho numa das margens do rio Yuribei. Parecia ser o corpo de um animal do tamanho de um cachorro grande, e quando se aproximou ainda não fazia ideia da descoberta arqueológica que estava testemunhando – de olhos abertos, com a tromba e parte dos pelos ainda espalhados pela carcaça, a múmia do bebê mamute emergira do degelo do permafrost quase como se tivesse se afogado poucas horas antes. Encaminhado às autoridades russas, o achado deslumbrou os cientistas, que puderam realizar exames minuciosos graças ao estado de preservação do fóssil – as primeiras tomografias revelaram tratar-se de um filhote, com um ou dois meses, pesando cinquenta quilos, e que ainda guardava no estômago sinais do leite materno, sugerindo que o corpo poderia ter se conservado tão bem por conta da colonização de bactérias produtoras de ácido láctico. Descobriu-se, ainda, que era uma fêmea, e a batizaram com o nome da esposa do pastor que a resgatou, Lyuba, que em russo significa amor.

Se não tivesse se aventurado pelo lago, a pequena mamute poderia ter vivido sessenta anos ou até mais, e sua história provavelmente terminaria com a de sua época. Mas a grande aventura estava por vir: o acidente que abreviou sua vida fez com que ela atravessasse dezenas de milhares de anos e chegasse até aqui para contar histórias do seu mundo ao mundo que ela não conheceu. No Museu Shemanovskiy, em Salekhard, na Rússia, a pequena mamute ainda está caminhando naquele tempo congelado. Quem sabe ainda sonhe com vidas que poderiam ter acontecido.”

Depoimentos das editoras 

Ana Elisa Ribeiro

“Temos a alegria de publicar a Silvana Tavano desde o primeiro romance, que nos chegou por meio de uma das maiores agências literárias do país. Nossa tarefa é ler os originais e analisar se está dentro do que queremos para o selo editorial, se nos toca como leitoras e editoras. A escrita da Silvana era claramente a de uma autora experiente. ‘Ressuscitar mamutes’ veio um tempo depois, num processo de que participamos mais, dialogamos com ela e tivemos a alegria de ver o livro nascer, crescer e ser reconhecido pelo maior prêmio para literaturas de língua portuguesa. É um orgulho enorme.”

Rafaela Lamas

“Além de conhecer muito bem a história narrada em ‘Ressuscitar mamutes’, tive o privilégio de acompanhar a história do livro como objeto editorial: o caminho que o texto percorreu até chegar às livrarias e às mesas de cabeceira dos leitores, a bonita construção entre autora e editora que lhe deu forma. Nesse sentido, não me surpreendi ao ver o livro figurar nas listas dos prêmios São Paulo e Jabuti e vencer o Oceanos. Como editores, é uma alegria ver um livro realizar plenamente o seu potencial. Desde o início, reconhecemos, no texto da Silvana, uma literatura de altíssima qualidade, e dedicamos a ele nosso melhor trabalho editorial. É justo - e muito feliz - que o resultado desse trabalho tão sério, da autora e da editora, seja agora amplamente reconhecido.”

“Ressuscitar mamutes”

De Silvana Tavano

Autêntica Contemporânea

120 páginas

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R$ 64,90

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