O flagelo que se instalou na maior cidade do país é uma demonstração eloquente de como o poder público e a sociedade precisam levar a sério a emergência climática. A tragédia no Rio Grande do Sul já havia alertado: grandes concentrações urbanas, como São Paulo, sofrerão impactos cada vez maiores de fenômenos climáticos extremos. Planejamento, prevenção e respostas ágeis são necessidades urgentes não apenas para a administração paulista, mas para gestores de todo o Brasil.
O drama paulistano começou na quarta-feira, quando um ciclone extratropical varreu a maior metrópole do país. Ventos de 100 km/h puseram abaixo uma quantidade impressionante de árvores e deixaram um rastro de prejuízo. Mais de 400 voos foram cancelados nos aeroportos de Congonhas e Guarulhos, os dois mais movimentados do Brasil. Passadas mais de 60 horas do evento climático extremo, centenas de milhares de paulistanos estavam sem energia elétrica. O apagão atingiu 2,2 milhões de consumidores nas primeiras horas, com prejuízos de toda ordem nas residências e comércios da capital paulista.
Como de hábito, a calamidade foi seguida por troca de acusações. O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, defendeu uma intervenção federal na empresa concessionária, a Enel. O governador Tarcísio de Freitas bateu na mesma tecla. A empresa, por sua vez, acusa a administração municipal de não cumprir a obrigação de podar as árvores. E não deu prazo para restabelecer o fornecimento de energia em São Paulo.
Esse quadro caótico torna evidente o despreparo das grandes cidades brasileiras para uma realidade incontornável: a emergência climática. Segundo a revista científica Com Ciência, editada pela Unicamp em parceria com a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), o Brasil registrou, de 2019 a 2024, mais de 10 mil eventos climáticos agressivos, como vendavais, tornados e chuvas intensas. Esses episódios resultaram em mais de 1,1 mil mortes e R$ 67 bilhões em prejuízos, de acordo com o Atlas Digital de Desastres no Brasil. Mais preocupante, alertam os cientistas, é que esses fenômenos se tornaram cada vez mais frequentes.
O que acontece neste momento na capital paulista é um problema global. Estudos científicos indicam que as 100 cidades mais populosas do mundo estão cada vez mais afetadas pelos efeitos da instabilidade ambiental. Nos espaços urbanos, ocorre o que os especialistas chamam de “chicote climático”, com alternância de longas secas e severas inundações.
Está claro, pois, que o poder público e a iniciativa privada precisam encontrar soluções conjuntas para mitigar os efeitos deste “novo normal”. As medidas passam necessariamente por investimentos vultosos em infraestrutura, de modo a deixar menos vulneráveis serviços públicos essenciais. Demandam também uma participação mais ativa da sociedade, que precisa cobrar de governantes e fornecedores de serviço garantias para evitar, ou ao menos mitigar, os danos provocados por eventos extremos.
Há poucas semanas, a COP30 de Belém alertou para o mundo a urgência de ações concretas contra a crise climática. Seja na Amazônia, seja em São Paulo, passou da hora de o país dar respostas mais efetivas a uma realidade que só tende a piorar.