Três meses depois de a Operação Carbono Oculto revelar a extensão financeira do crime organizado, em um esquema que mantinha uma ampla cadeia de negócios ilícitos com venda de combustível e o envolvimento de fintechs em plena avenida Faria Lima, o país tomou conhecimento de um novo ardil. A operação Poço de Lobato trouxe à luz um esquema de sonegação fiscal e lavagem de dinheiro novamente no setor de combustíveis, além de evasão de divisas e ocultação de patrimônio. O alvo da vez é o grupo Refit, apresentado à nação como um dos maiores devedores do Fisco: R$ 26 bilhões em impostos não recolhidos.


É importante sublinhar os valores envolvidos nas duas operações. Os agentes da Carbono Oculto identificaram que a facção criminosa investigada movimentou cerca de R$ 50 bilhões entre 2020 e 2024, por meio de uma engenhosa rede que incluía empresas de fachada, lavagem de dinheiro e uso de fundos de investimento. No caso da Poço de Lobato, as atividades ilícitas também giram na casa dos bilhões de reais, e as diligências indicam uma relação entre o grupo Refit e o esquema construído pelo Primeiro Comando da Capital. Na quinta-feira, mais de R$ 10 bilhões em bens dos envolvidos foram bloqueados pelas autoridades.


Além de revelar uma nova fronteira de crimes econômicos, a operação Poço de Lobato reforçou, de forma empírica, a urgência de aprovar a legislação a um tipo de contraventor: o devedor contumaz. Trata-se de empresas criadas com o intuito deliberado de sonegar impostos. As autoridades do Fisco estimam cerca de mil contribuintes com essa conduta criminosa, entre as mais de 20 milhões de empresas no Brasil. “É uma pequena minoria, mas que causa um estrago enorme em determinados setores”, afirmou o secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas.


Para punir esses sonegadores profissionais e proteger os contribuintes honestos, o governo defende a aprovação de uma legislação capaz de fornecer instrumentos adequados de repressão. É com esse propósito que o Senado, no início de setembro, aprovou o projeto de lei complementar 125/2022, que institui o Código de Defesa do Contribuinte. De autoria do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a proposta define como devedor contumaz aquele contribuinte que, em âmbito federal, acumula dívida injustificada superior a R$ 15 milhões e correspondente a mais de 100% do seu patrimônio conhecido. Há também tipificações para devedores em nível estadual e municipal.


De setembro até aqui, passaram-se quase três meses. Somente na semana passada, pressionado e impressionado pelo volume da criminalidade tributária praticada no Brasil, o presidente da Câmara dos Deputados anunciou o nome do relator do PLP 125. Há uma expectativa de que o tema seja definido na reunião de líderes da Casa desta semana. Descontando-se o oportunismo rasteiro de resgatar um tema que estava esquecido no Legislativo somente após mais uma operação de peso contra grupos sob fortes suspeitas de grave contravenção fiscal, espera-se que os deputados atuem, pelo menos desta vez, em favor do interesse do país.


Está evidente que a asfixia financeira e o combate à sonegação são instrumentos poderosos contra o poder do crime organizado, muito mais prejudiciais às facções do que uma carnificina em praça pública. n

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