Ao indicar Jorge Messias para o Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reforça – mesmo que não admita – mantém o estigma de transformar a mais alta Corte de Justiça do país numa instância cada vez mais política. O gesto tende a partidarizar ainda mais o ambiente interno e a alimentar disputas ideológicas que fragilizam a autoridade institucional dos ministros. Em vez de transmitir segurança jurídica e estabilidade democrática, o Supremo se vê frequentemente arrastado para o centro de conflitos partidários, num momento em que a Justiça deveria ser o eixo de equilíbrio nacional.


A origem dessa percepção não está apenas na disputa contemporânea. Ela tem raízes históricas e atravessa diferentes governos, à direita e à esquerda. A Constituição de 1988 conferiu ao presidente da República a prerrogativa de escolher ministros do STF, com aprovação do Senado, sob o critério formal de “notável saber jurídico e reputação ilibada”. Entretanto, a prática política nem sempre respeita isso. Assim como houve indicações que, de fato, honraram o espírito da lei, também houve aquelas nas quais prevaleceram o favoritismo, a gratidão pessoal ou a conveniência de ocasião.


Houve escolhas guiadas por méritos acadêmicos e jurídicos indiscutíveis. Eros Grau, indicado por Lula em 2004, era reconhecido pela vasta produção acadêmica e pela trajetória respeitada como professor de direito. Também se insere nessa linhagem Teori Zavascki, indicado por Dilma em 2012, magistrado de perfil técnico, discreto e respeitado por sua atuação no Superior Tribunal de Justiça. Esse reconhecimento ajuda o Supremo a sustentar decisões complexas sem sofrer acusações de parcialidade política.


Também houve escolhas percebidas como gesto de proximidade pessoal, proteção política ou recompensa. Nomeados sem carreira na magistratura nem produção acadêmica. Movimentos explícitos de transformar a Corte em espaço de projeção de quadros políticos de primeira linha. Essas situações ampliam a percepção de aparelhamento, mesmo quando não há intenção declarada de interferência.


É nesse contexto que a escolha de Jorge Messias reacende o debate sobre a fronteira entre a legitimidade constitucional do presidente e o risco de erosão da independência simbólica do Supremo. Messias é um jurista com sólida formação técnica, porém seu papel de articulador jurídico do Planalto e defensor público das posições do presidente faz com que sua indicação seja lida, inevitavelmente, como ato político.


Não se trata de contestar suas credenciais formais, mas de reconhecer que a crescente politização do STF enfraquece sua autoridade perante a sociedade, alimenta narrativas conspiratórias e transforma julgamentos constitucionais em batalhas de opinião pública. O Supremo, que deveria ser o espaço máximo de imparcialidade, corre o risco de se tornar refém das paixões políticas do momento. Num país ainda traumatizado por tentativas de ruptura institucional, isso significa aumentar a instabilidade em vez de reduzi-la.

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