Ao final de 2023, o Congresso Nacional aprovou uma Reforma Constitucional Tributária, cuja implementação integral está prevista para o ano de 2027. A motivação para tal reforma residia na suposta falta de clareza do atual sistema tributário, que considero um verdadeiro manicômio. No entanto, é preciso fazer uma análise crítica e profunda sobre as implicações dessa reforma, que parece estar direcionada ao cerne do Sistema Constitucional Tributário em vigor, ao invés de abordar os problemas na legislação tributária em si.


O novo modelo constitucional tributário proposto pela reforma revoga três tributos federais (IPI, PIS e COFINS), além do ICMS estadual e do ISS municipal. Em seu lugar, será instituído um Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), desdobrado em um Imposto sobre Bens e Serviços no âmbito federal (CBS) e nos demais entes federativos (IBS).


O Brasil possui um sistema constitucional tributário exemplar, cujas bases foram estabelecidas pela Emenda 18/65 à Constituição de 1946 e mantidas e ampliadas nas Cartas Magnas subsequentes. Uma das principais virtudes desse sistema é a clareza e a solidez de suas normas, que dedicam um capítulo específico ao sistema tributário e estabelecem princípios gerais e específicos, como legalidade estrita, anterioridade, vedação à tributação confiscatória e prioridade da tributação sobre o patrimônio e a renda.


Além disso, a Constituição estabelece uma clara partilha de competências tributárias entre os entes federativos, evitando a bitributação e pluritributação, o que contribui para a segurança jurídica e a previsibilidade no sistema tributário.


As inúmeras emendas constitucionais e distorções na legislação tributária existentes apresentam desafios significativos. Muitas emendas são consideradas inconstitucionais, pois contrariam princípios fundamentais estabelecidos na Constituição, como a tributação de fatos futuros e a diferenciação na tributação de determinados bens e atividades econômicas.


A carga tributária no Brasil, que alcançou 32% do PIB em 2023, é elevada e injusta, especialmente considerando a tributação sobre medicamentos e o consumo, que impacta de maneira desproporcional a população de baixa renda. Além disso, a distorção na partilha dos fundos de participação, que privilegia determinadas regiões em detrimento de outras, revela uma grave desigualdade e falta de equidade no sistema tributário brasileiro.


É evidente a necessidade de uma reforma tributária que promova uma redução de despesas e uma maior conformidade com o Sistema Constitucional Tributário vigente. É fundamental que qualquer reforma tributária seja pautada pela legalidade e transparência, garantindo a justiça fiscal e o respeito aos direitos fundamentais dos cidadãos.


Como nos lembra Ruy Barbosa, a lei - ou, neste caso, a Constituição - deve ser o alicerce sobre o qual se constrói o ordenamento jurídico de uma nação. Sem ela, não há solução possível para os problemas que enfrentamos. Assim, é imprescindível que qualquer mudança no sistema tributário brasileiro esteja alinhada com os princípios e valores consagrados em nossa Carta Magna. 

 

 

 

Eduardo Jardim

Mestre e doutor em Direito do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, advogado militante, parecerista, palestrante, conferencista e professor emérito da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Professor do Instituto Brasileiro de Estudos Tributários - Ibet. Membro da Academia Paulista de Letras Jurídicas, Cadeira n. 62. É membro e vice-presidente do Instituto Brasileiro de Estudos de Direito Administrativo, Financeiro e Tributário - Ibedaft