Uma das principais medidas indicadas para evitar os casos de feminicídio é sensibilizar as mulheres a procurarem as autoridades de segurança já nos primeiros sinais de violência. Uma atitude importante. Não suficiente. Há, inclusive, o risco de o pedido de ajuda acirrar a ira do abusador, avalia, em entrevista, o promotor de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT) Daniel Bernoulli. A mesma lógica pode se repetir quando a denúncia parte de parentes e vizinhos, também recorrentemente mobilizados para não se calarem diante desses casos de violência.


Outro caminho comumente indicado é acirrar a resposta aos criminosos. Solução que, por si só, também não ameniza essa dramática realidade. No último domingo (24/12), o presidente do Tribunal de Justiça do DF, desembargador José Cruz Macedo, assegurou que, naquele momento, “todos os autores de feminicídio em Brasília estavam presos ou mortos”. Em menos de 48 horas, foram registrados dois novos assassinatos de mulheres cujos suspeitos são homens que elas tinham ou tiveram algum tipo de relacionamento.


Ao comentar os crimes mais recentes, Bernoulli relatou que, quando o MPDFT inicia um processo penal de feminicídio, inclui qualificadoras que aumentam “consideravelmente as punições a esses assassinos, em casos de condenação”. Não há “qualquer tolerância”, enfatizou o promotor.


Ainda assim, as mortes não param de crescer. No primeiro semestre deste ano, o Brasil registrou 722 feminicídios, o maior número para um primeiro semestre contabilizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Em 2019, no início da série histórica, foram 631 casos.


Frear essa chaga social, portanto, vai além de projetos direcionados apenas aos personagens diretos dos crimes: vítima, família e agentes do governo, como profissionais da segurança e da Justiça. Essas são, indiscutivelmente, medidas importantes de combate à violência contra a mulher. Porém, há que se considerar — e, principalmente, estruturar — ações de maior amplitude, como a formação de uma sociedade que compreenda o feminicídio como um ato de horror e atrocidade.


Para vítimas e familiares, já o é. Para muitos criminosos, não. Um dos sinais dessa visão deturpada é o entendimento dado aos femicídios nos presídios brasileiros, avalia Cruz Macedo. Presos “agridem autores de crimes sexuais, que precisam ficar separados”. Não têm a mesma reação com os condenados por feminicídio, o que, na avaliação do desembargador, indica que a naturalização da violência contra a mulher acontece em decorrência do machismo. Vale lembrar que, neste ano, o governo Lula não concedeu o indulto de Natal a apenados por agressão ou morte de suas companheiras. Não há, porém, a mesma conduta em saidões de presos em outras épocas festivas.


O presidente do TJDFT sugere como mais uma medida de combate ao feminicídio a adoção de campanhas que mostrem “a situação real desses crimes”, como ficam os autores, as mulheres e os órfãos. Mobilizar escolas e famílias para a construção de uma cultura de paz e tolerância também é um caminho com efeito a longo prazo. Igrejas e outros grupos de convivência podem, e devem, impulsionar esses valores. Assim como os produtores de conteúdo, tanto profissionais quanto amadores, que retratam e ajudam a construir a forma como percebemos as diferenças de gênero e lidamos com elas. A lista de respostas é longa e complexa. Mas, mais do que nunca, urgente e necessária. 

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