Chassis, motor, pneus... quase mil peças foram montadas para restaurar este veículo blindado de 1942 equipado com canhão e dar-lhe uma segunda vida por ocasião do 50º aniversário da Revolução dos Cravos em Portugal. "É emocionante ver o veículo em que estava naquele dia. Sabia que depois disso Portugal não seria o mesmo", recordou José Afonso de Oliveira, psicólogo aposentado de 73 anos.


Em 25 de abril de 1974, liderou a tripulação de um Humber de fabricação britânica em uma das colunas que convergiram para Lisboa para depor uma ditadura de 41 anos. "Eles poderiam ter me prendido, mas o regime já estava morrendo", disse à AFP este ex-subtenente, um dos 5 mil soldados que participaram do golpe de Estado.


Poucos dias antes das comemorações desse dia histórico, Oliveira visitou a oficina onde há dois anos um pequeno grupo de entusiastas restaura veículos blindados da época. "É um verdadeiro quebra-cabeças", afirmou António Carvalho, engenheiro de 41 anos que dedica parte do seu tempo livre a este restauro. O Humber permanece desarmado. As peças continuam à espera da montagem nas prateleiras desta oficina militar nos arredores de Lisboa.

 

José Afonso Pedrosa de Oliveira, de 73 anos, foi chefe militar dos veículos durante a Revolução dos Cravos

AFP


Reconstituição histórica


"Felizmente, um inglês nos ajuda enviando-nos manuais e peças raras através da embaixada de Portugal em Londres", explicou este homem apaixonado por história, membro da Associação Portuguesa de Veículos Militares Antigos. Para os eventos oficiais de quinta-feira, 15 veículos participarão na reconstrução histórica da coluna liderada por um dos heróis da Revolução dos Cravos, o capitão José Salgueiro Maia, falecido em 1992.

 

No mesmo armazém encontra-se uma réplica do Chaimite "Bula", um dos veículos blindados de fabricação portuguesa que ficou famoso por transportar Marcelo Caetano, o ditador deposto que substituiu António Salazar alguns anos antes.
Os veículos de transporte de tropas, utilizados nas guerras coloniais que Portugal travou na África entre 1961 e 1974, tornaram-se ícones de um golpe de Estado sem derramamento de sangue. O outro símbolo, o cravo vermelho, era apenas uma flor sazonal oferecida espontaneamente aos soldados que a colocavam no canhão de seu fuzil.


Ao chegarem a Lisboa, a situação tornou-se tensa quando se depararam com uma unidade militar leal ao regime. "Quase atiraram em nós", disse Antonio Gonçalves, outro soldado daquele grupo de insurgentes. "Recebemos ordens para responder ao fogo, se necessário", mas os homens que se encontravam na frente finalmente se renderam, contou este ex-soldado de 74 anos.
Depois de uma primeira parada na Praça do Comércio, às margens do rio Tejo, a coluna dirigiu-se ao quartel da gendarmaria onde Caetano se refugiara com alguns dos seus ministros. Cercados por milhares de pessoas que vieram apoiá-los, os militares iniciaram negociações com os representantes do regime, que estavam sitiados.

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