Steve e Ai St Juliana perderam a filha Hana, de 14 anos, no ataque — segundo eles, ela era gentil e sempre se preocupava com os outros -  (crédito: BBC)

Steve e Ai St Juliana perderam a filha Hana, de 14 anos, no ataque — segundo eles, ela era gentil e sempre se preocupava com os outros

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Os pais de um atirador de 15 anos que abriu fogo e matou quatro alunos em uma escola em Michigan, nos Estados Unidos, foram condenados na terça-feira (9/4) a uma pena de 10 a 15 anos de prisão por homicídio culposo.

Trata-se de uma decisão histórica — é a primeira vez que pais são condenados por um massacre cometido pelo filho nos EUA.

James e Jennifer Crumbley, pais do atirador Ethan Crumbley, haviam sido condenados por homicídio culposo em julgamentos separados no início deste ano, e a sentença de ambos foi anunciada na terça-feira.

A juíza Cheryl Matthews afirmou que a pena refletia o fracasso dos pais em impedir o massacre.

"Não se espera que eles [os pais] sejam médiuns. Mas estas condenações não se referem a uma educação ruim. Dizem respeito a atos que poderiam ter parado um trem desgovernado", disse ela ao tribunal.

 

 

"A oportunidade bateu repetidamente (à porta), cada vez mais alto, e foi ignorada."

Os promotores alegaram que o casal havia ignorado sinais claros de que a saúde mental do filho havia piorado — e lembraram que foram eles que compraram para Ethan a arma usada no ataque.

A sentença significa que os Crumbleys são elegíveis à liberdade condicional após cumprirem 10 anos de prisão, mas não podem ser detidos por mais de 15 anos se a liberdade condicional for negada.

Ambos manifestaram pesar pelo ataque cometido pelo filho, que está cumprindo pena de prisão perpétua sem possibilidade de liberdade condicional.

Ethan tinha 15 anos quando matou, em 2021, com uma pistola semiautomática quatro estudantes na Oxford High School: Tate Myre, de 16 anos; Hana St Juliana, de 14; Madisyn Baldwin, de 17; e Justin Shilling, de 17. Outras sete pessoas também ficaram feridas no ataque à escola.

Fotografias, cartas e objetos em homenagem a Hana
BBC
Steve e Ai St Juliana perderam a filha Hana, de 14 anos, no ataque — segundo eles, ela era gentil e sempre se preocupava com os outros

Na terça-feira, os pais dos estudantes mortos, deram depoimentos carregados de emoção perante o tribunal.

Nicole Beausoleil, mãe de Madisyn Baldwin, dirigiu-se diretamente aos pais de Ethan.

"Quando você estava comprando uma arma para seu filho e deixando-a destrancada, eu estava ajudando (minha filha) a terminar a inscrição para a faculdade", afirmou Beausoleil, com os olhos marejados.

"Você decidiu que criar seu filho não era uma prioridade", ela acrescentou.

"E por causa disso, perdi minha filha."

Jill Soave, mãe de outra vítima, Justin Shilling, foi a segunda a falar. Ela observou que seu "horror e trauma são difíceis de expressar em palavras".

Mas olhou diretamente para James e Jennifer Crumbley enquanto criticava os pais por sua "omissão" ao não impedir uma tragédia "completamente evitável".

"Se pelo menos eles tivessem feito alguma coisa, qualquer coisa, para mudar o curso dos acontecimentos", ela disse.

No mês passado, Steve St Juliana, pai de Hana, disse que o processo contra os Crumbleys era "apenas o primeiro passo" para lidar com a violência armada nos EUA.

"Nossas crianças morrem diariamente em massacres e fazemos muito pouco a respeito", acrescentou.

"Podemos colocar pessoas na Lua, podemos construir arranha-céus, monumentos gigantescos como a Represa Hoover — e não somos capazes de manter nossos filhos seguros nas escolas."

James Crumbley ouvindo a sentença
Bill Pugliano/Getty Images
James Crumbley durante seu julgamento, em março, quando foi condenado por homicídio culposo

Em julgamentos separados, os promotores acusaram os Crumbleys de ignorar os sinais de alerta sobre a crise de saúde mental do filho. E os acusaram de serem negligentes ao comprar uma arma para ele — e não armazená-la adequadamente.

Eles foram considerados culpados de quatro acusações de homicídio culposo, uma para cada estudante que Ethan assassinou.

Durante o anúncio da sentença na terça-feira, a promotoria disse que James Crumbley mostrou "total falta de remorso", depois de ler uma transcrição carregada de palavrões de uma ligação que ele fez da prisão. Eles alegaram que James havia feito ameaças de morte contra o promotor principal do caso durante o telefonema.

Os advogados dele discordaram, e disseram que seu cliente apenas "desabafou" e usou uma linguagem "raivosa" e "não respeitosa".

O pai do atirador enfatizou seu arrependimento em uma declaração antes da audiência — e afirmou mais tarde ao tribunal que gostaria de ter agido de forma diferente.

"Não consigo expressar o quanto gostaria de saber o que estava acontecendo com ele ou o que iria acontecer, porque eu absolutamente teria feito muita coisa de forma diferente."

Jennifer Crumbley
Reuters
Jennifer Crumbley foi condenada em fevereiro pelos atos do filho

Jennifer Crumbley também compartilhou seu pesar com as famílias das vítimas.

"Hoje estou aqui não para pedir perdão, porque sei que isso pode estar fora de alcance, mas para expressar minhas mais sinceras desculpas pela dor que foi causada", disse ela no tribunal.

A advogada de James Crumbley, Mariell Lehman, disse que não havia evidências de que seu cliente estivesse ciente dos planos do filho.

Os advogados de defesa também argumentaram que não havia precedente legal para este caso — e que era inapropriado responsabilizar os pais por cada pessoa que o filho matou.

Os promotores discordaram, assim como a juíza.

Na manhã do massacre, os pais de Ethan abreviaram uma reunião na escola sobre um desenho perturbador que o filho havia feito para ir trabalhar — e se recusaram a levá-lo para casa.

Os funcionários da escola mandaram Ethan de volta para a sala de aula sem verificar a mochila dele, que continha uma arma.

Uma investigação independente alegou no ano passado múltiplas falhas no sistema escolar, incluindo a decisão de permitir que Ethan voltasse à sala de aula.

Em resposta, o distrito escolar se comprometeu a rever e melhorar suas práticas e políticas.