O degelo na Groenlândia e Antártica altera a velocidade de rotação da Terra mais rapidamente do que o previsto, a ponto de afetar o cálculo do tempo universal, que determina o bom funcionamento das redes de informática, aponta um estudo divulgado nesta quarta-feira (27).

Desde 1967, o Tempo Universal Coordenado (UCT) é estabelecido por meio de relógios atômicos ultrassensíveis, que marcam a hora de todo o mundo e garantem a precisão das infraestruturas digitais e de comunicação, como a navegação por satélite.

Por razões históricas, foi mantida a sincronia entre o UCT e o tempo astronômico, calculado a partir da velocidade de rotação da Terra, que não é constante. A partir de 1972, decidiu-se compensar as irregularidades adicionando segundos intercalares ao tempo atômico, para que coincidisse com o tempo astronômico.

Os segundos intercalares são inseridos cada vez que a defasagem entre as duas medições se aproxima de 0,9 segundo. O último ajuste remonta a 2016, segundo Duncan Agnew, autor de um dos estudos sobre o tema, publicado na revista Nature.

A aceleração do movimento de rotação da Terra, no entanto, traz um problema inverso, pois fará com que o tempo astronômico se antecipe ao atômico, o que obrigaria dentro de alguns anos a introduzir um segundo intercalar negativo.

A novidade preocupa os especialistas em metrologia, uma vez que a introdução de um segundo intercalar negativo traria "problemas sem precedentes em um mundo cada vez mais conectado”, aponta Patrizia Tavella, do Escritório Internacional de Pesos e Medidas (BIPM), em um comentário anexo do estudo.

A incerteza provém do fato de que os programas de informática que integram segundos intercalares “supõem que os mesmos são sempre positivos”, explica Duncan Agnew, do Instituto de Geofísica da Universidade da Califórnia, em San Diego.

- Terra desacelera -

Em parte devido a essa nova situação, metrologistas de todo o mundo concordaram em suprimir o segundo intercalar até 2035. A partir desse ano, planejou-se permitir que a diferença entre a hora atômica e a rotação da Terra aumentasse para um minuto. 

Segundo a Nature, no entanto, essa programação pode ser comprometida pelo aquecimento global, devido à aceleração do degelo na Groenlândia e Antártida, que Agnew mediu com observações de satélite.

Desde a década de 1990, o derretimento do gelo desacelera a rotação da Terra, assim como o fazem as marés provocadas pela força gravitacional que a Lua e o Sol exercem sobre o planeta, contrabalançando a aceleração natural.

“Quando o gelo derrete, a água se espalha por todo o oceano, o que altera a distribuição de fluidos na superfície e no interior da Terra”, detalha o cientista.

O efeito de desaceleração provocado pelo degelo foi sugerido no fim do século XIX e é medido desde a década de 1950, ressalta Duncan Agnew. "A novidade do meu trabalho é mostrar a extensão do impacto do degelo na rotação da Terra, uma mudança nunca vista", explica.

A desaceleração é tamanha que poderia atrasar até 2029 uma eventual transição para o segundo negativo, segundo previsões. Sem os impactos do aquecimento global, isso provavelmente ocorreria em 2026.

Esse adiamento dá um respiro aos metrologistas, que terão "mais tempo para decidir se 2035 é a melhor data para suprimir o segundo intercalar ou se ele deve ser abandonado antes", comentou Patrizia Tavella.

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