Tratado como escravo em pleno século 21, o maranhense Marinaldo Soares Santos é um dos trabalhadores cuja história é contada em "Servidão" -  (crédito: Reynaldo Zangrandi/divulgação)

Tratado como escravo em pleno século 21, o maranhense Marinaldo Soares Santos é um dos trabalhadores cuja história é contada em "Servidão"

crédito: Reynaldo Zangrandi/divulgação

Documentário sobre o trabalho escravo na Amazônia, “Servidão”, dirigido por Renato Barbieri, estreia nesta quinta-feira (25/1) em Belo Horizonte. O cineasta também abordou o tema no premiado longa “Pureza” (2002), com Dira Paes, contando a história de Pureza Lopes Loyola e sua jornada em busca do filho, desaparecido depois de deixar o Maranhão em busca de trabalho. Ela o encontrou, muito tempo depois, em uma fazenda mantida à custa da chamada escravidão moderna.

 

A data de estreia do documentário é homenagem ao Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, criada em homenagem aos três fiscais e seu motorista assassinados em 28 de janeiro de 2004, na cidade mineira de Unaí, vítimas de emboscada ao investigar denúncias de trabalho análogo à escravidão.

 

“No ano passado, depois de 19 anos de muita luta da sociedade, da família e da Justiça, finalmente os mandantes foram presos”, afirma o cineasta Renato Barbieri, referindo-se aos fazendeiros Norberto e Antério Mânica, responsáveis pela Chacina de Unaí.

 

“Comecei a desenvolver o projeto de 'Pureza' e fiz muitas pesquisas no Sul do Pará e no Maranhão. A pesquisa foi se ampliando e quando percebi, tinha um acervo de personagens, conteúdos e locações muito maior do que a que precisaria para o filme. Foi assim que surgiu a ideia do documentário”, explica Barbieri.

 

 

“Servidão” deu importantes subsídios para o roteiro de “Pureza”, com cenas que reproduzem o cenário de escravidão contemporânea. Numa delas está o trabalhador Marinaldo Soares Santos, cujo rosto aparece no cartaz do novo documentário.

 

Este maranhense foi resgatado três vezes por equipes encarregadas de combater o trabalho escravo. Em entrevistas à imprensa, disse que considerava “normal” sua situação porque “era pobre”. Maltratado, vivia em condições sub-humanas, obrigado a beber a água destinada aos animais.

 

 

Negra Li: a voz do negro

 

Impactante, “Servidão”, narrado pela cantora Negra Li, traz depoimentos de trabalhadores rurais submetidos à escravidão moderna e de pessoas que lutam contra essa prática no país.

 

“A gente tinha uma parte do roteiro mais conceitual, filosófica, falando sobre a escravidão no Brasil, da mentalidade escravagista. Achei que deveria ter alguém influente, da negritude. Vi na Negra Li exatamente o que eu procurava”, diz Barbieri.

 

Pioneira do rap nacional, desde muito jovem a cantora paulista vem denunciando a desigualdade social e o racismo.

 

Em quatro décadas de carreira, Renato Barbieri tem profunda ligação com o cinema de cunho social. Além de “Servidão” e “Pureza”, ele assina também “Atlântico Negro – Na rota dos orixás”, documentário sobre as origens africanas da cultura brasileira.

 

“Espero, de verdade, um despertar de consciência coletiva a partir do filme. Cinema é janela importantíssima para gerar discussão, sensibilidade e empatia usando a arte como elemento político. O filme nasce como uma grande peça de resistência para nutrir e expandir o debate público. Acredito que a gente só vai conseguir erradicar o trabalho escravo do Brasil quando a sociedade brasileira assumir esta pauta como prioritária para o país”, conclui Renato Barbieri.

 

“SERVIDÃO”


Brasil, 2024. Documentário de Renato Barbieri. Em cartaz no UNA Cine Belas Artes 3, às 15h20.