O nigeriano Seun Kuti diz que o palco representa um

O nigeriano Seun Kuti diz que o palco representa um porto seguro para ele

crédito: Alexis Mayron/divulgação

Filho caçula de Fela Kuti (1938-1997), mais importante músico que a África viu nascer, Seun Kuti retorna a Belo Horizonte quase uma década depois de estrear no Sesc Palladium. Agora como principal atração do Chacoalha, faz show nesta noite n'A Autêntica.

 

A festa, durante a Semana da Consciência Negra, também terá o Iconili, banda (ou “mini big band à mineira”, como o grupo se define) com franca influência do afrobeat. Hoje bissexto nos palcos da cidade, o combo instrumental vai contar com a participação da cantora Augusta Barna. Abrindo os trabalhos, a DJ Black Josie.

 

 

Aos 40 anos, Seun soma mais de 30 em cima de um palco. Tinha em torno de 8 quando surgiu no Africa Shrine, clube que Fela tinha em Lagos, Nigéria. Estreou ao lado do pai e de sua Egypt 80, banda com uma dúzia de músicos que acompanhava Fela.

 

Com a morte do pai, Seun, que na época já empunhava o saxofone na Egypt 80, tornou-se seu herdeiro natural. Ainda adolescente, seguiu com a banda de Fela, ao contrário do irmão 20 anos mais velho, Femi Kuti, que já comandava seu próprio grupo, Positive Force.

 


Homenagem ao pai

 

Atualmente, dos músicos que acompanharam Fela, uns cinco ainda estão na ativa, conta Seun. Mas apenas o baixista Kunle Justice, líder da Egypt 80, está com ele no Brasil. Nesta noite, vai se apresentar ao lado de nove instrumentistas. Como em todos os shows desde o início da carreira sem o pai, ele começa a apresentação com uma canção de Fela.

 

“Sempre faço assim. É uma maneira de mostrar respeito ao meu pai”, diz Seun, que também vai tocar suas próprias músicas. “Estar em um palco, para mim, é a forma mais avançada de estar com a música. Quando você toca ao vivo para um público, tudo vale. Não se pode começar de novo, voltar, repetir, como se faz no estúdio. Diante disso, o palco é o lugar onde posso ser mais verdadeiro com a música. Sempre foi meu porto seguro”, acrescenta.

 

Não há como comparar pai e filho, o próprio Seun afirma. “Não só a música, como a arte em geral, são questões muito subjetivas. Comparar é uma coisa que veio do capitalismo, onde tudo é motivo de competição. Comparação é uma forma de competição. Ser o mais rápido, o mais forte, o número 1, tudo isso vem do capitalismo. Não acho que minha música seja melhor do que a do meu pai, ou a dele melhor do que a minha. Só acho que a minha música cresceu independente da dele.”

 

Seun já se apresentou algumas vezes no Brasil. “A grande conexão entre a música africana e a brasileira é o que me impressiona mais. Quando ouço música brasileira, acho muitas similaridades com a nossa. Além disso, tenho grandes amigos, como Seu Jorge, Karol Conká, Iza e Carlinhos Brown. Assim como vocês, temos boas praias, bom clima. E tem a herança do colonialismo”, afirma, com ironia. “Tem gente que não sabe, mas muito da cultura afro-brasileira vem do iorubá, que é da Nigéria, meu povo.”

 

Fela Kuti

Fela Kuti impactou a música do século 20 com sua mistura de jazz, funk, rock psicodélico e música africana

AFP

 

Música e política

 

Criador do afrobeat – genial mistura das tradições africanas com funk, jazz e rock psicodélico, que permite longas improvisações em músicas hipnóticas que facilmente atingem os 20 minutos –, Fela Kuti, também saxofonista, pianista e vocalista, não entrou para a história apenas pela arte.

Sua trajetória beira o extraordinário. Ativista político e dos direitos humanos, lutou contra a opressão militarista em seu país e criou, nos anos 1970, a República Kalakuta, comuna nos arredores de Lagos que chegou a declarar independência da Nigéria. Viveu ali com a família – filhos e um número incontável de mulheres. Tentou se candidatar a presidente, mas não conseguiu. Tornou-se o Black President, também nome de um de seus quase 80 álbuns.

Assinou Fela Ransome-Kuti até o final da década de 1970, quando mudou para Fela Anikulapo Kuti. Em iorubá, anikulapo significa “aquele que capturou a morte e a colocou na bolsa”. A expressão é ligada à ideia do poder de controlar a morte. Fela, no entanto, sucumbiu à Aids aos 58 anos.

 

SEUN KUTI & EGYPT 80


Show nesta quinta-feira (23/11), com abertura da casa às 21h. A Autêntica (Rua Álvares Maciel, 312, Santa Efigênia). Também se apresenta o Iconili, com participação de Augusta Barna e DJ Black Josie. Ingressos a partir de R$ 90. À venda na bilheteria (das 11h às 15h) e no link https://autentica.byinti.com/#/event/seunkuti