Jornal Estado de Minas

INELEGIBILIDADE

Futuro político de Bolsonaro começa a ser decidido pelo TSE nesta semana

Jair Bolsonaro vive semana decisiva para seu futuro na política. Nesta quinta-feira (22/6),  ele começa a ser julgado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em caso sobre a reunião com embaixadores para atacar as urnas eletrônicas em julho do ano passado. Com chance de terminar com o ex-presidente inelegível até 2030, o julgamento deve movimentar o cenário político do país nas próximas duas semanas. 





Caso condenado, o ex-presidente perde imediatamente o direito de concorrer a cargos eletivos mesmo ainda podendo recorrer da decisão. Bolsonaro e o general Walter Braga Netto, candidato a vice na chapa que buscava a reeleição, são alvos de uma ação movida pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT). A medida questiona o uso da estrutura da presidência para atacar o sistema eleitoral durante reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada em julho do ano passado.

O julgamento acontece nesta quinta e tem mais duas sessões marcadas na próxima semana, nos dias 27 e 29. Caso a ação seja julgada procedente, Bolsonaro torna-se inelegível por oito anos a partir da data das últimas eleições. O ex-presidente ainda pode tentar recorrer, mas os recursos não anulam o efeito imediato da decisão, como explica o advogado com atuação na área eleitoral e mestre em Direito Público pela PUC-MG, Fabrício Souza Duarte.

“Bolsonaro tem direito a recursos. Um dos recursos cabíveis nesse caso seria um embargo de declaração para esclarecimento de alguma dúvida do acórdão. Esse embargo é dirigido ao próprio TSE. Também cabe acionar o STF (Superior Tribunal Federal) com um recurso extraordinário. Esses recursos não têm efeito suspensivo, decidido pelo TSE, ele já se torna inelegível a partir de então. Também não há um prazo determinado para que as cortes analisem os pedidos de recurso do ex-presidente”, explica.



Leia mais: Julgamento que pode tornar Bolsonaro inelegível deve durar até o fim do mês

A ação direcionada à candidatura de Bolsonaro e Braga Netto aponta que, na reunião com os embaixadores, o ex-presidente violou a lei 9.504/97. Entre as irregularidades listadas estão o desvio de finalidade de poder para fins eleitoreiros; o uso da condição de presidente da República para reunir representantes de países estrangeiros e difundir fake news contra o processo eleitoral; e o uso das redes oficiais do Planalto e da TV Brasil para veicular a reunião.

Quem julgará Bolsonaro


A composição do TSE está definida após alterações nas últimas semanas devido ao fim de mandatos dos integrantes. O ex-presidente é alvo de ação que investiga violações legais em reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada em julho do ano passado.

Dos sete integrantes do TSE responsáveis pelo julgamento de Bolsonaro, cinco foram indicações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A composição da corte é determinada legalmente por períodos específicos, portanto, não trata-se de uma definição apenas para esse julgamento.





O TSE é composto por três nomes advindos do Supremo Tribunal Federal (STF) escolhidos pelos membros da corte; dois ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), também determinados internamente; e dois juristas escolhidos pelo presidente da República a partir de lista tríplice feita pelo STF.

Os ministros do STF participantes do julgamento são Alexandre de Moraes, nomeado por Michel Temer em 2017; Cármen Lúcia, nomeada por Lula em 2006; e Kassio Nunes Marques, indicação de Bolsonaro em 2020. Os nomes do STJ na corte são Benedito Gonçalves e Raul Araújo Filho, ambos indicados por Lula em 2008 e 2010, respectivamente. O atual presidente da República é também responsável pela nomeação dos dois juristas, André Ramos e Floriano de Azevedo.

Como acontecerá o julgamento


A previsão é que o trâmite seja finalizado dentro prazo das três sessões marcadas até a semana que vem. O processo pode atrasar, porém, porque os ministros podem pedir vista, solicitando mais tempo para analisar a ação. Os pedidos determinam período de 30 dias prorrogáveis por mais 30 para que o tema volte à pauta.





O julgamento é iniciado pelo corregedor-geral da Justiça Eleitoral e relator do caso, Benedito Gonçalves, que fará a leitura do relatório do caso. Logo após, a palavra é passada aos advogados do PDT, que terão, cada um, 15 minutos de sustentação oral para apresentar seus argumentos. Em seguida, o mesmo tempo é concedido para a argumentação da defesa. O Ministério Público Eleitoral é o próximo a se manifestar. 

Após concluídas as etapas, o ministro Benedito Gonçalves apresenta seu voto. Os demais ministros também votam na seguinte ordem: Raul Araújo, Floriano de Azevedo Marques, André Ramos Tavares, Cármen Lúcia, Nunes Marques e Alexandre de Moraes.

Precedente dá indícios negativos a Bolsonaro


Às vésperas do início do julgamento que pode torná-lo inelegível, mesmo Jair Bolsonaro não nutre grandes esperanças sobre a possibilidade de ser inocentado pelo TSE. Histórico recente da corte tem decisões que pesam contra o ex-presidente em casos parecidos envolvendo divulgação de informações falsas sobre o processo eleitoral.





A ação do PDT aponta violações constitucionais na reunião com embaixadores, quando o então presidente fez uma apresentação com ataques ao sistema eleitoral brasileiro. Jurista entrevistado pelo Estado de Minas recorda de decisão recente do TSE que determinou a cassação de um parlamentar por motivos semelhantes.

Fernando Francischini foi eleito deputado federal pelo PSL no Paraná em 2018. Em 2021, o TSE cassou o mandato do parlamentar e o tornou inelegível por abuso de poder político. A condenação se deu após declarações em que o paranaense dizia que as urnas eletrônicas estavam adulteradas para impedir o registro de votos em Bolsonaro na eleição presidencial. 

Para o advogado com atuação na área eleitoral e mestre em Direito Público pela PUC-MG, Fabrício Souza Duarte, o caso de Francischini é um precedente que aponta para a condenação de Bolsonaro no julgamento desta semana. 





“Acredito que, pelos precedentes do tribunal nas últimas eleições a ação deve ser julgada procedente. Temos que lembrar que a ação se dá porque foram dirigidas críticas e acusações contra o sistema eleitoral brasileiro. O TSE julgou um caso parecido, que foi o caso do deputado Fernando Francischini, do Paraná, e entendeu que ele desqualificou o sistema eleitoral brasileiro em uma live. Ele perdeu o mandato e se tornou inelegível. Por essa análise, é provável que o Bolsonaro seja condenado”, analisou.

No último sábado, durante evento do Partido Liberal (PL) em Jundiaí-SP, Bolsonaro comentou sobre o julgamento. O ex-presidente disse estar tranquilo, mas não esperar uma absolvição no caso.

"Obviamente não quero perder os direitos políticos. A gente quer continuar vivo contribuindo com o país. (...) Nós temos esse problema agora. Até mesmo uma condenação de inelegibilidade porque me reuni com embaixadores antes do período eleitoral. Vamos enfrentar isso no dia 22 agora. Já sabemos que os indicativos não são bons, mas eu estou tranquilo", afirmou.





A reunião com embaixadores


A ação pela qual Bolsonaro será julgado no TSE nesta semana não é a única pela qual o ex-presidente tem seus direitos políticos em jogo. Há, ao menos, outros 15 casos que podem o tornar inelegível pela corte. O mestre em Direito Público, Fabrício Souza Duarte, explica que, embora as penas não sejam cumulativas, cada nova possível condenação dificulta a viabilidade de sucesso dos recursos.

“É importante lembrar que essa é a primeira das ações que ele vai responder no TSE. Em todos os casos, as penas não se somam. Ele seria sempre condenado a oito anos de inelegibilidade. A questão é que a situação fica mais difícil de conseguir reverter mais de uma condenação”, comentou.

O caso da reunião com os embaixadores motiva a ação da vez e já foi responsável por uma condenação de Bolsonaro na Justiça Eleitoral. O TSE já multou o ex-presidente em R$ 20 mil pela mesma ocasião.





Em 18 de julho de 2022, às portas do início oficial do período eleitoral, Bolsonaro reuniu dezenas de embaixadores no Palácio da Alvorada. Em apresentação com tradução para o inglês o então presidente reiterou para as autoridades estrangeiras os ataques que fez reiteradamente às urnas e ao judiciário durante seu mandato. Entre os magistrados mais citados estavam os ministros do STF Alexandre de Moraes, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso.

Sem apresentar provas de fraudes nas urnas, Bolsonaro repetiu teorias como a do suposto ataque hacker ao TSE durante as eleições de 2018. Em tom de ameaça, o ex-presidente disse que o Brasil só teria paz caso o tribunal adotasse medidas para mudar o funcionamento das urnas.

Com divulgação nas redes oficiais do governo federal e transmissão pela TV Brasil, a apresentação foi amplamente divulgada. Meses depois, foi alvo da Justiça Eleitoral. Em agosto o YouTube retirou o vídeo com o discurso de Bolsonaro do ar. A Procuradoria Geral Eleitoral solicitou ao TSE que a gravação fosse banida da internet.

Vale lembrar que, ao longo do processo, o TSE avançou sobre outras pautas além da reunião com os embaixadores. Consta nos autos, por exemplo, a ‘minuta do golpe’, documento encontrado com o ex-ministro da Justiça de Bolsonaro, Anderson Torres, em que era cogitado o decreto de Estado de Defesa na Justiça Eleitoral. O próprio Torres, além de outros ex-ministros como Carlos Alberto Franco França e Ciro Nogueira foram ouvidos ao longo do caso.