Jornal Estado de Minas

Entidade do MPF pede saída de procurador que considera eleição de Bolsonaro ''obra divina''


Membros do Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF) enviaram ao procurador-geral da República, Augusto Aras, um memorando em que pedem que ele considere “se é oportuno e conveniente” que o subprocurador Eitel Santiago de Brito, secretário-geral do MPF, continue no cargo.


A ação ocorreu após ele acusar as forças-tarefas de atuação ilegal e declarar que a eleição do presidente Jair Bolsonaro “foi uma obra divina”. Esse é o mais novo capítulo da crise interna do órgão, marcada por questionamentos sobre a independência de Aras à frente do cargo.

O ofício foi encaminhado após Eitel Santiago, braço-direito do procurador-geral, conceder entrevista à emissora CNN Brasil afirmando que “as forças-tarefas do MPF funcionam, por vezes, de forma ilegal” e que prisões na Lava-Jato foram usadas “como instrumento de tortura” para forçar delações premiadas.

Também durante a entrevista, ele disse que os adversários do presidente da República “precisam compreender que foi Deus o responsável pela presença de Bolsonaro no poder”.

“Faz-se absolutamente imperativo assinalar a discordância e o profundo desconforto que tais colocações do secretário-geral Eitel Santiago de Brito Pereira — verbalizadas ao arrepio de suas funções administrativas — estão causando no seio da instituição, implicando, em muitos aspectos, indevida ingerência na esfera de atuação de outros órgãos que compõem o Ministério Público Federal”, afirmam os subprocuradores Nicolao Dino de Castro e Costa Neto, Nívio de Freitas Silva Filho, José Adonis Callou de Araújo Sá e Luiza Cristina Fonseca Frischeisen.


Segundo eles, a fala de Brito sobre “atuação ilegal” das forças-tarefas, incluindo a Lava-Jato, “alimenta, de maneira perigosa e indevida”, dúvidas quanto à legalidade da atuação do Ministério Público Federal e afeta “seriamente a imagem da instituição”.

Os subprocuradores afirmam que Eitel Santiago “distanciou-se das fronteiras de seu cargo” e realizou juízo de valor sobre a ação da Procuradoria, sugerindo, “de forma equivocada”, que a Secretaria-Geral poderia exercer função de controle das medidas criticadas.

“Por fim, o secretário-geral do Ministério Público Federal manifesta, de um lado, desapego à premissa que o Estado é laico, confundindo sua fé pessoal religiosa com assuntos de atuação instituição do MPF”, criticam. “Por outro lado, explicita posição de apoio politico-partidário, o que se afigura inadequado com o exercício de alta função na administração superior do Ministério Público Federal.”


Eitel Santiago é um nome de confiança de Aras. No entanto, passou um período aposentado e se envolveu em atividades político-partidárias. Ele chegou a se filiar ao PSL, partido que elegeu Bolsonaro. As informações são de que o subprocurador está de licença médica, se recuperando após contrair covid-19 e não tem previsão para voltar às atividades.

“Diligência”


A entrevista do secretário-geral foi concedida em meio à crise interna dentro da PGR envolvendo a força-tarefa da Lava-Jato, que acusa a subprocuradora Lindôra Araújo, aliada de Aras, de conduzir uma “diligência” para obter informações sigilosas da operação. A PGR nega.

Aras já declarou que continuará em busca dos dados sigilosos, apontando que decisões passadas do então juiz Sergio Moro na Lava-Jato e da juíza substituta Gabriela Hardt, da 13ª Vara Federal de Curitiba, autorizam o compartilhamento dessas informações. Em ofício enviado em maio, o PGR pediu às forças-tarefa da Lava-Jato para enviarem cópias de dados eleitorais, de câmbio, de movimentação internacional, além de relatórios de inteligência financeira, declarações de Imposto de Renda e base consolidadas de informações.


Em resposta, a Lava-Jato Paraná afirmou que as decisões de Moro e Hardt “não permitem que o compartilhamento ou acesso aconteça sem objeto específico ou indicação das provas e procedimentos cujo compartilhamento é pretendido”.

Divergência

O embate ganhou novo capítulo após o CSMPF receber um projeto que propõe a unificação das forças-tarefas em uma única Unidade Nacional Anticorrupção (Unac). Uma das medidas previstas no texto em discussão é a centralização das bases de dados da Lava-Jato por uma secretaria ligada à PGR.