Jornal Estado de Minas

APROVADA

Área de escape do Anel: especialistas avaliam funcionamento como positivo

A área de escape do Anel Rodoviário de Belo Horizonte foi usada pela primeira vez na tarde de terça-feira (16/8) por um caminhão que perdeu os freios. Inaugurada pela prefeitura da capital, em 1º de agosto, ela foi planejada para evitar acidentes no trecho que é considerado como o mais perigoso da rodovia que corta a capital: a chamada descida do Bairro Betânia, na Região Oeste.





 

 

No local são frequentes os engavetamentos envolvendo caminhões sem controle e as mortes causadas por eles. Especialistas avaliam que a 'estreia' foi positiva, mas que ela é uma medida paliativa e outras soluções devem ser pensadas para o Anel Rodoviário. 


O motorista do caminhão, Devanilton Maciel de Brito, conversou na terça-feira com agentes da BHTrans que atuaram na retirada do veículo e disse que a área de escape evitou um acidente de maior gravidade. 
 
"Caso não tivesse ela aqui, poderia ter ocasionado um desastre, como já aconteceu em vários outros (acidentes), em que morreram várias pessoas." O veículo transportava 26 toneladas de minério. 





Brito afirma que o freio do caminhão falhou e graças à caixa de retenção, saiu ileso do acidente. "Sai sem um arranhão." 

A área de escape fica na altura do km 541, no sentido Vitória (ES), entre a rodovia BR-040 e o trevo do Betânia, próximo do acesso ao Bairro Buritis, também na Região Oeste.

Desafio e procedimento em caso de ocorrência

O diretor de Sistema Viário da BHTrans, José Carlos Mendanha, avalia o episódio de terça-feira como positivo. "Nosso desafio é contar para os motoristas que eles têm uma chance. Eles devem sempre verificar as condições do veículo antes e quando estão dirigindo, as condições de estabilidade e de freio." Ele reforça que se o motorista sentir alguma falha, não deve hesitar e entrar na área de escape. "Você está poupando o seu patrimônio, sua vida e não envolve outras vidas no problema."  

Mendanha estima que na maioria das vezes, não haverá grandes transtornos para o motorista que precisar usar a área de escape. Explica ainda que o local é uma espécie de raia de piscina, cheia de pequenas pedras de argila expandida, semelhantes às usadas em vasos de plantas. "Elas são ásperas e soltas. Se você pisa, o pé afunda igual areia movediça. Então, o veículo vem em alta velocidade com atrito em um piso liso. Ao entrar na área, a tendência dele é afundar." As pedras de argila ajudam na frenagem do veículo que para. 
 
 

O diretor explica que a BHTrans tem uma câmera de monitoramento localizada antes do local. No Centro Integrado de Operações de Belo Horizonte (COP-BH), as equipes têm acesso a essas imagens e fazem o acompanhamento do trânsito. "Entrou um veículo, temos o procedimento operacional que deve ser feito. Primeiro, eles acionam as equipes da regional Oeste/Barreiro, a Polícia Militar Rodoviária e a Via-040 (concessionária que administra um trecho da rodovia)." 
 
Quando as equipes chegam ao local, elas interditam e avaliam as condições do motorista. Além disso, decidem que tipo de reboque usar e acionam o sistema para retirar o veículo. O próximo passo, é fazer a recomposição da caixa de retenção. "Usamos um soprador ou uma vassoura para varrer e afofar (a argila), para que continue com as mesmas características de antes do acidente." 

Mendanha ressalta que será necessária uma manutenção com o passar do tempo. "A argila vai quebrando. A recomendação é de uma verificação anual, mas já identificamos que toda vez que ela é recolocada não há a mesma posição de prensagem. Por isso, de dois em dois meses, é preciso dar uma afofada para que ela se torne permeável."





Outra medida é um painel que avisa aos motoristas se a rampa está liberada ou ocupada. O diretor diz que a faixa tem espaço para até três caminhões, embora a ocupação máxima não seja recomendada. "Depende de onde o caminhão vai parar e esperamos que a coincidência infeliz não aconteça." O histórico mostra uma média de onze acidentes por ano, em ambos os sentidos da via.   

Ele destaca que esta é a sexta área de escape construída no Brasil e a primeira operada pelo poder público. Observa ainda que o grande problema no local são os caminhões que transportam minério. "São muitos, trabalham pesados, muitos são de particulares e não têm manutenção, além de ser uma carga mais difícil de remover."

A retirada do veículo na terça-feira foi feita após as 22h, com menos trânsito, e levou cerca de 2h30min para ser feita. Mendanha diz que a média das demais concessionárias no Brasil é de 3h30min. "Vamos desenvolver tecnologia para fazer em menos tempo, melhorar a sinalização, se necessário."

O diretor avalia que o tipo de acidente que acontece em outros trechos é diferente da descida do Bairro Betânia. Assim, outras áreas de retenção não seriam recomendáveis para evitar os acidentes. "Não são para esta característica de falha mecânica de freio. É de comportamento e acho que o órgão responsável pela fiscalização (DNIT) tinha que desenvolver uma lógica de fiscalização de velocidade por trecho. Não adianta o motorista frear no radar e acelerar em seguida."





Mendanha destaca ainda que outra alternativa seria uma checagem de frenagem, muito usada no Canadá, em que há um radar na lateral da pista que meça a velocidade e permita apenas 20km/h. "O motorista faz um teste no freio e, se ele percebe algum problema, pode parar por ali mesmo. É uma testagem sem ter que parar totalmente o veículo."

Medida paliativa e busca de outras soluções

O professor José Elievam Bessa Júnior, do Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia da UFMG, avalia que a área de escape funcionou como deveria. "O caminhão utilizou a área adequadamente, parou a uma distância pequena e evitou um acidente que poderia ser muito grave, o que é mais importante."

Porém, segundo ele, ainda é cedo para determinar se o objetivo com a construção do local foi alcançado. "É um episódio só, não podemos usar apenas um evento para determinar se alguma coisa funciona ou não. É bem provável que outros episódios devam acontecer e outros caminhões utilizem a área de escape." 

O professor ressalta que não tem acesso aos dados, mas tem a percepção de que os acidentes aconteciam em um trecho mais abaixo do local onde a área de escape foi construída. "No entanto, o caminhão vem perdendo o freio antes e o motorista, provavelmente, percebe com antecedência. Essa deve ser a razão da escolha desse local onde a área de escape se encontra hoje, uma vez que o motorista já percebe que os freios vão esquentar e, assim, entra no local." 

Ele ressalta ainda que essa é uma medida paliativa e não resolve os problemas de acidentes no Anel. "A área de escape não pode ser encarada como a única solução para o Anel Viário. É interessante avaliar o que ela pode proporcionar de segurança para o local, mas há outras coisas que podem ser feitas, com a obtenção de dados consistentes, consultando especialistas, para poder diminuir o número de acidentes graves no trecho. O sucesso de uma solução não pode ser um impeditivo para se pensar em outras alternativas."

O professor frisa que o mais importante é que, a cada episódio, os responsáveis avaliem se o local funcionou adequadamente, com a liberação do local com a máxima celeridade.