Benediktbeuern, cidade da Baviera, século 12. Em um mosteiro católico, monges pobres e errantes (passados para a história como goliardos) escreveram uma série de poemas satíricos e eróticos, que refletiam o espírito transgressivo e provocador de tais clérigos. Desafiando a inquisição, teceram versos em alusão aos jogos de azar, bebida e sexo.





Esses poemas só foram encontrados em 1847 pelo estudioso de dialetos Johann Andreas Schmeller. Ele reuniu os 254 textos que encontrou e publicou com o título de "Carmina Burana" (que em latim significa “Canções de Benediktbeuern”).

Passado quase um século, em 1936, o compositor alemão Carl Orff, ao ler “Carmina Burana”, decidiu musicar alguns dos poemas. O resultado, a cantata homônima, ficou mundialmente conhecido. O primeiro movimento, “Oh fortuna”, inclusive, é uma das músicas mais tocadas em filmes e séries.

A peça de Carl Orff, portanto, será apresentada pelo Coral Lírico de Minas Gerais, nesta terça (11/4) e quarta-feiras, no Grande Teatro Cemig Palácio das Artes, marcando a estreia do argentino Hernán Sanchéz como maestro titular. A apresentação integra a série Concertos da Liberdade. Com ingressos esgotados para a quarta, foi aberta sessão extra, na terça, às 20h30.



Peça, que faz alusão a jogos de azar, bebida e sexo, será apresentada pelo Coral Lírico de Minas Gerais


SOLISTA 

Natural de Buenos Aires, Sanchéz tem longa trajetória na música. Como tenor, integrou o Coro Nacional Juvenil e os corais estáveis do Teatro Argentino de La Plata e do Teatro Colón. Já como solista, participou de óperas como “A flauta mágica”, de Mozart; “Madama Butterfly”, de Giacomo Puccini; “Romeu e Julieta”, de Prokofiev; e “La bohème”, também de Puccini. Contudo, uma de suas peças preferidas é justamente “Carmina Burana”.

“É uma obra que está a favor do ser humano composta numa época em que você só podia pensar através de Deus”, explica o maestro. “Ela tem um espírito mais romântico, no qual o homem decide sua própria vida, com Deus ou sem Ele. Por isso, o texto é declamado de maneira imperiosa, com números que chegam ao paroxismo”, emenda.

Composta para ser tocada por uma grande orquestra – a versão de “Carmina Burana” escrita por Carl Orff exige todos os instrumentos de corda, percussão, sopro, metais e madeiras –, a peça será apresentada pelo coral em formato pouco conhecido do grande público: apenas com dois pianos e seis instrumentos de percussão.





Esse arranjo diferente, explica Sanchéz, foi composto por Wilhelm Killmayer, aluno de Carl Orff. “Essa versão é muito interessante porque responde perfeitamente ao que precisa. A peça não perde nada. Escuta-se de outra maneira, claro, mas o espírito da obra continua lá”, garante.

FORÇA NA VOZ 

Os solos vocais ficarão por conta da soprano Melina Peixoto, do tenor Júlio Mendonça e do baixo/barítono Lício Bruno. Um dos piano será tocado por Fred Natalino. Haverá ainda participação do Coral Infantojuvenil do Palácio das Artes nos movimentos “Tempus est iocundum” e “Cour d'amours”.

Comparada com outras peças para coral, como os requiems de Mozart e de Brahms ou a “Missa em si menor”, de Bach, “Carmina Burana” costuma ser considerada uma obra fácil de ser montada. Contudo, para o novo regente do Coral Lírico, esse pensamento não passa de um equívoco.





“‘Carmina Burana’ é escrita de uma forma declamatória, como em sílabas. Isso é muito difícil de fazer, porque ninguém estuda canto dessa forma. Além disso, a força que os músicos devem ter na voz no começo e no final da peça é muito maior do que a necessária no ‘Requiem de Mozart’ ou na ‘Missa em si menor’. Assim, creio que a qualidade vocal necessária para conseguir o som e essa forma de declamar, desesperada pela humanidade, não é qualquer coro amador que consegue ter”, ressalta.

NAZISMO 

Ainda que seja um clássico incontestável da música erudita, “Carmina Burana” foi associada ao regime nazista por causa do sucesso absurdo que ela teve justamente entre os nazistas.

Carl Orff, inclusive, ganhou a pecha de ter contribuído com o regime em função disso e também de outros acontecimentos mais complexos e delicados da história dele – em carta póstuma, Orff se arrepende por ter sido “omisso” com os amigos judeus durante o holocausto.

Fato é que a cantata rompeu os limites da Alemanha e permanece atual ainda hoje. Afinal, jogos, bebida e sexo continuam como força motriz do prazer humano.

“CARMINA BURANA”
• Concerto do Coral Lírico de Minas Gerais.
• Nesta terça-feira (11/4), às 12h (concerto gratuito, porém reduzido, com menos peças da cantata), e quarta-feira (12), às 20h30 (esgotado)
• Grande Teatro Cemig Palácio das Artes (Av. Afonso Pena, 1.537 0 Centro).
• Ingressos à venda  para sessão extra na terça, às 20h30, por R$ 20 (inteira, plateia 1), R$ 15 (inteira, plateia 2) e R$ 10 (inteira , plateia superior), na bilheteria ou pelo fcs.mg.gov.br. Meia-entrada na forma da lei.
•Informações pelo site ou pelo telefone: (31) 3236-7400.

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