As lições da geração 9.0

Se a história do mundo fosse escrita pelas crianças, certamente seria de um jeito bem diferente do que se conhece: teria muitos capítulos com diálogos, páginas marcadas pela amizade, parágrafos inteiros de atenção ao próximo e linhas de amor fraterno. No ponto final, a esperança da paz e boas notícias. Mesmo conectada em tempo integral, a novíssima geração tem um olho na evolução tecnológica e outro nos problemas do presente e nas ameaças ao futuro. E, embora com pouca idade, vai fundo nas questões contemporâneas, imaginando um planeta mais feliz. Quer história melhor para contar?

Num bate-papo com nove alunos, todos com 9 anos, da Escola Municipal Mestre Ataíde, no Bairro Betânia, na Região Oeste de Belo Horizonte, fica bem claro que a comunicação é vital a qualquer momento, desde que acompanhada de cuidados com a Terra e seus habitantes. No aniversário de 90 anos do Estado de Minas, nada melhor do que ouvir, e agora ler, o pensamento de meninos e meninas que, sorriso aberto, imprimem confiança e força ao amanhã. Eles falam de violência, política, família, compaixão, esportes, saúde, solidariedade e estão certos de que, quanto mais informação de boa fonte, no impresso ou no meio digital, melhor para todo mundo. Bem-vindos, portanto, ao futuro!

Ao acompanhar os passos das crianças, um painel no corredor da Escola Municipal Mestre Ataíde, com 1,1 mil alunos de 6 a 14 anos, do 1º ao 9º ano do ensino fundamental, indica a preocupação dos diretores, coordenadores e professores com a leitura, a atualidade e a evolução da humanidade. Em letras garrafais num fundo amarelo, entremeadas de borboletas, está a frase “Vamos juntos escrever o futuro”. Nada mais salutar e emblemático, na era de tanta velocidade nas informações, do que presenciar esse interesse pela união e pelo conhecimento e desejo de confiar em tempos melhores.

Diante do painel, quase um cartão de visitas para se conhecer a escola, fundada há 46 anos e dirigida por Darley Antônio Leal e Lino do Carmo (vice), o grupo de alunos do quarto ano, todos com 9 anos, posa para uma foto especial. Sorridentes, estão Fabiano dos Santos Figueiredo, Ana Gabriela Dias Chagas, Nayane Caroline Miranda, Anna Luíza dos Reis Sabino, Alice Vitória Maia, João Victor Lourenço, Arthur Fernando Antunes Vieira, Thiago Henrique Moreira dos Santos e Melissa Rafaela Pereira Mota. Como não poderia deixar de ser, eles se abraçam, depois levantam as mãos, jogam beijos e deixam claro que têm atitude. E boas propostas para “escrever o futuro”.

Desde bem pequena, Melissa sabe que seus caminhos passam pela arte. “Acho que vou ser dançarina”, revela, para num átimo de segundo, numa postura tão própria da tenra idade, mudar a direção e jogar tudo para o alto: “Ou policial”. Imaginando-se de sapatilha e tutu ou de farda, ela começa a traçar uma linha reta para direcionar os sonhos. “Este mundo está maluco”, dispara com doçura a menina de trancinhas amarradas com fitas de cores diferentes. Para ajudar a colocar nos eixos os descaminhos planetários, ela põe fé no fim da desigualdade social. E crê piamente nas ações educativas, leitura de livros e idas ao teatro como saída. “Gosto muito de assistir a peças teatrais; minha mãe me levou uma vez.”

A coordenadora pedagógica da escola, Jaqueline Anália Maciel Bessa, observa que a unidade de ensino conduz o projeto Leituras em Conexões, a fim de estimular o gosto pelos livros e a presença na biblioteca. Os alunos trabalham na produção de textos, incluindo reportagem em jornais impressos, e se debruçam sobre assuntos atuais, como temas transversais, nas aulas de português, história e outras disciplinas. O teatro também está em pauta, mais exatamente nas “sextas culturais” promovidas nessa unidade do Bairro Betânia. A escola estrutura um programa para dinamizar o uso das novas tecnologias em sala de aula, independentemente da faixa etária.

Depois da visita ao painel, a turma se dirige para uma sala de aula, e, num círculo, se posiciona sobre este mundo com tantas diferenças e complexidades, em especial para quem está praticamente no começo da vida. Nayane gosta do universo tecnológico, mas tem ideias definidas sobre o uso exagerado de computadores, tablets, celulares e outros equipamentos. “Se for para pesquisas da escola, fica mais interessante”, pondera a garota. A exemplo da coleguinha Melissa, Nayane pretende ser policial e tem uma segunda opção: jogadora de vôlei.

Sonho e Realidade

Thiago confessa o amor pelos esportes e, sem pensar duas vezes, avisa que vislumbra seu futuro entre o futebol e o basquete. “E ele joga bem”, avaliam os amigos. Se correr tudo bem, ele quer ser craque do time do coração, o Cruzeiro. Na avaliação do menino, os caminhos do futuro passam necessariamente pelo respeito aos pais. Se for assim, será um gol de placa. E melhor será se terminarem as brigas das torcidas, que levam o terror aos estádios, mancham o esporte e contaminam o ambiente com o pior da violência urbana.

Planejando ser médico ou youtuber – ou quem sabe os dois juntos? –, Arthur também concorda na questão do respeito. “Quando o futuro chegar, o respeito precisa estar entre nós. E no presente também”, recomenda com seriedade, para, na sequência, trazer duas palavras que dão mais sentido à discussão: “Precisamos de luz e fé”.

Ao lado, Ana Gabriela faz questão de realçar a excelência da leitura para compreensão de todos os problemas, e busca de soluções. Disposta a ajudar as pessoas, a estudante surpreende ao apontar seu papel no futuro: líder de torcida. Lideranças à parte, vai estudar medicina. E quem disse que a garotada não se preocupa com a política? “Precisamos de bons governantes”.

Ciente de que se tem “coisas ruins acontecendo, há muitas coisas boas também no mundo”, João Victor acha importante o papel da imprensa para denunciar e também divulgar boas iniciativas. Na internet, sabe que é essencial se afastar de conteúdos que se propagam planeta afora induzindo os jovens à morte, a exemplo do Baleia Azul. A impunidade preocupa o garoto, que quer seguir a carreira de médico-cirurgião ou de militar da Aeronáutica, e vê a necessidade de os criminosos pagarem pelos seus atos.

O bate-papo com os meninos vai ficando cada vez mais animado até que Fabiano traz à tona a palavra compaixão, sem dúvida alguma uma das mais fortes da conversa. O menino, disposto a ser policial ou motorista escolar, tem convicção da urgência em ajudar o ser humano. Afinal, não se pode pensar no futuro, na comunicação e na tecnologia se não houver “ajuda aos pobres, às pessoas carentes”, aqueles que dormem nas ruas.

A arte volta à cena no momento em que Anna Luíza revela que, quando era bem pequena, as pessoas de casa achavam que ela seria pintora. Hoje, o sonho é ser modelo. Também admiradora dos livros, Anna Luíza destaca que consulta sistematicamente os dicionários, uma forma de descobrir novas palavras e conhecer seu significado.

Decidida a ser professora, médica ou atriz, Alice também declara seu amor pela leitura, que, na sua opinião, abre as portas para o mundo do diálogo, promove o entendimento e, claro, joga luz sobre as trilhas para o futuro.