Jornal Estado de Minas

VITALidade

Nosso tempo é finito, mas a história que construímos não


A fascinação humana pela imortalidade e pela juventude eterna é tão antiga quanto nossa própria civilização. Temos na mitologia inúmeras narrativas que nos alertam sobre as consequências de desejar a eternidade sem compreender suas implicações.



O mito de Eos e Tithonus é um tal aviso. Eos, encantada pelo mortal Tithonus, suplicou aos deuses que lhe dessem a dádiva da imortalidade. No entanto, ao negligenciar o pedido para que ele permanecesse jovem para sempre, assim como ela, involuntariamente ela o condenou ao envelhecimento eterno, de modo que sua benção se mostrou muito mais como uma maldição.

O Livro bíblico do Eclesiastes nos lembra que existe um momento na vida para cada propósito sob o céu. Há uma ordem natural no universo que, quando desrespeitada, pode resultar em consequências indesejáveis.

Em nossa busca frenética para vencer a morte e o envelhecimento, muitas vezes acabamos por ignorar a beleza que existe na transitoriedade da vida. As flores, dotadas de uma beleza muito efêmera, nos coloca para pensar sobre a impermanência: o fato da flor ter uma vida curta nos convida a apreciar suas formas, cores e cheiros pelo máximo de tempo possível, valorizando cada momento da sua rápida existência.





Somos mais capazes de apreciarmos cada instante de nossas vidas quando entendemos que somos seres para a morte¸ como dizia Heidegger. Para o filósofo alemão, a consciência sobre a nossa finitude é de primordial importância para compreendermos nossa própria existência. Ao nos confrontarmos com nossa própria extinção, acabamos por buscar significado e propósito em nossas vidas, de modo que a finitude não é algo a ser temido, mas sim abraçado, pois só ela nos dá a perspectiva necessária para apreciarmos nossas vidas em plenitude.

Se temos a consciência de que somos seres finitos, nos responsabilizamos de modo mais genuíno por nossa existência. É sob os auspícios da finitude que nossa consciência confere dignidade e valor às nossas vidas. A finitude é uma experiência intrínseca à nossa condição humana e nossa mortalidade, longe de ser uma maldição, é o que nos possibilita dar significado, urgência e profundidade em nossas vidas.

Em nossas sociedades, há uma busca incessante pela juventude eterna e uma luta é travada contra o envelhecimento, isto por meio de procedimentos estéticos, dietas milagrosas e uma série de tratamentos antienvelhecimento. Enquanto a medicina e a tecnologia avançam, apresentando soluções temporárias para frear o tempo, devemos nos questionar até que ponto essa juventude que buscamos preservar não é muitas vezes desperdiçada na incessante buscar de manter-se jovem.




A beleza do envelhecimento, muitas vezes negligenciada, reside na sabedoria e na experiência, que só vêm com o passar dos anos. Cada fase da vida tem sua própria essência e beleza. Se a juventude é marcada pelas descobertas e pelas primeiras experiências, a maturidade traz reflexão, compreensão e uma capacidade de apreciar a vida de modo mais profundo. 

Em sociedades que glorificam a juventude como sendo o ápice da existência, geralmente há um temor irracional do envelhecimento. Esse medo, alimentado pela indústria da beleza e pelas mídias sociais, muitas vezes desvia nossa atenção daquilo que é genuíno em nossas vidas; e com isto corremos o risco de viver em constante estado de insatisfação, sempre buscando a próxima solução para nos mantermos sempre jovens. 

Ao nos confrontarmos com o espelho do tempo e com nossa finitude, devemos nos perguntar o que realmente define nossa essência. A juventude não está apenas na aparência, mas no espírito que carregamos conosco, nas lições aprendidas, nos laços criados e nos sonhos que ainda desejamos realizar. A verdadeira juventude está na capacidade que temos de nos reinventarmos todos os dias, de aprender continuamente e de amar apaixonadamente, independentemente da idade.

Ao invés de temermos o inevitável avanço dos anos, devemos celebrar as experiências que ele nos traz, reconhecendo que cada ruga conta uma história, cada cicatriz é um testemunho de resistência e cada sorriso é um lembrete de que a vida, em todas as suas fases, é uma dádiva a ser apreciada em sua totalidade.