Jornal Estado de Minas

TIRO LIVRE

Assédio a repórter da ESPN em Flamengo x Vélez, vergonha nacional

O feminismo deveria estar na grade escolar de todo o Brasil. Antes que você torça o nariz para essa afirmação, saiba que talvez o faça por não entender e até não ter sido ensinado sobre o assunto. E isso apenas reforça a tese que abre esta coluna. Ainda: antes que alguém pergunte o que isso tem a ver com a seara esportiva, respondo: tem muito a ver. Demais. Porque é a base para o respeito à mulher, inclusive aquela que frequenta arenas esportivas, a lazer ou a trabalho.



A cada caso de agressão a uma mulher, em qualquer situação, é preciso enfatizar a necessidade de sermos, todos, feministas. 

No Brasil recente tem havido um grande esforço em distorcer o conceito de feminismo e, especialmente, em pregar a desinformação, depreciando-o. Como se o movimento estivesse atrelado a questões pejorativas, numa tentativa de deslegitimá-lo e desdenhar de todas as conquistas advindas dele. 

A essência do feminismo nada mais é que a igualdade entre homens e mulheres, em todos os aspectos – social, político e econômico. Graças ao feminismo as mulheres hoje podem fazer coisas básicas, das quais foram alijadas no Brasil, como votar e até mesmo praticar esportes! 

Muita gente não sabe, mas, em 14 de abril de 1941, o presidente Getúlio Vargas baixou um decreto-lei que proibia as mulheres de praticarem esportes que não fossem "adequados a sua natureza".

Durante a Ditadura Militar, o Conselho Nacional de Desportos (CND) listou os esportes exclusivo dos homens: lutas de qualquer natureza, futebol, futebol de salão, futebol de praia, polo aquático, rúgbi, halterofilismo e beisebol. 

Apenas em 1979 o decreto caiu. Em 1983, o futebol feminino foi regulamentado. Somente em 1988 foi formada a primeira Seleção Brasileira Feminina.



Tudo isso atrasou não só o desenvolvimento do esporte no país como teve impacto direto no comportamento de torcedores que até hoje vemos em estádios, de assédio sexual.

Mulheres agredidas pelo simples fato de estarem naquele ambiente. Como se não pertencessem àquele espaço.

Nesta semana, tivemos mais um capítulo do machismo em sua forma mais abjeta. Jéssica Dias, repórter da ESPN, foi assediada durante uma transmissão ao vivo por um torcedor do Flamengo quando trabalhava para mostrar, no Maracanã, a movimentação da torcida antes do jogo Flamengo x Vélez Sarsfield, pela Copa Libertadores.

Ela estava concentrada em exercer sua profissão quando foi beijada pelo homem, que acabou preso.

Assédio sexual é crime. É preciso que essa informação seja levada a toda parte e haja mais punição para quem se sente autorizado a agredir uma mulher. Nenhum homem tem direito de tocar em uma mulher, de beijá-la, sem consentimento.



É humilhante para uma mulher viver esse tipo de situação. E muitos ainda acharam graça, desdenharam do desrespeito à jornalista.

A cena não é inédita. No Mineirão mesmo, neste ano, houve uma onda de assédio a torcedoras que, cada vez mais, se indignam e buscam seus direitos. O assunto já foi tratado na coluna Tiro Livre. É preciso expor esses criminosos, denunciá-los. Fazer barulho. Mostrar que está errado. Sempre, em qualquer lugar.

Daí a importância vital de se ensinar o feminismo desde a infância. Para que os meninos cresçam sabendo respeitar, sob quaisquer circunstâncias, as mulheres. Que saibam que elas não são um objeto, submissas, passivas. E ensinar as meninas a entenderem seus direitos, a buscá-los e a repudiar qualquer forma de assédio, de agressão, física e psicológica.

Isso começa dentro de casa. Com aquele integrante da sua família que faz piadinhas machistas (racistas, etc) e minimiza discussões sérias sobre esses temas. Ao normalizar isso dentro de casa ele está normalizando agressões de toda sorte, em qualquer lugar. 

Muita gente se sente receosa de defender o feminismo, mas os machistas não se constrangem de destilar seu preconceito e ignorância, inclusive em rede nacional.

Por isso, nunca é demais lembrar a esse tipo de torcedor/homem: as mulheres não estão no estádio (e em outros lugares) por você ou para você. Elas estão lá apesar de você.