Jornal Estado de Minas

JUVENTUDE REVERSA

O mercado das mídias exige regulamentação, o inadmissível é a censura


Motivado por dois processos que podem mudar a internet no Brasil, o Supremo Tribunal Federal (STF) finalizou uma audiência pública, entre os dias 28 e 29 de março, que discutiu a responsabilidade civil de provedores na internet e a maneira como as plataformas (Facebook, Youtube, Twitter, etc) devem atuar para remover conteúdos ofensivos de suas redes.



Um desses casos judiciais é o de uma dona de casa, Lourdes Paviotto Correa, que descobriu que alguém havia criado um perfil falso em seu nome no Facebook. O impostor usava seu perfil para ofender os seus familiares e amigos em sua cidade, Capivari (SP), de 56 mil habitantes. O outro processo é o de uma professora, Aliandra Cleide Vieira, de Belo Horizonte, que descobriu que tinha uma comunidade com o nome “Eu odeio a Aliandra” no Orkut, atual Google, com comentários maldosos dos seus “odiadores” da época do ensino médio.
Passados quase dez anos, os pedidos de Lourdes e de Aliandra para que as empresas retirem de circulação os conteúdos ofensivos e para que sejam indenizadas por danos morais ainda se arrastam.

A discussão não é apenas sobre conteúdos, mas principalmente sobre o modelo de negócios das big techs. Google, Apple, Meta, etc, estão presentes o tempo todo em nosso dia a dia e ganham bastante dinheiro com a propagação de desinformação pela internet. Durante a sua rotina nas plataformas, quantas fake news você recebeu?
Quantas vezes você já se deparou com discursos de ódio ou conteúdos ilícitos? Quantas desinformações científicas do tipo “a terra é plana” ou “as vacinas são inócuas”? Como garantir a liberdade de expressão de cada um de nós frente aos monopólios de gigantes de tecnologia que visam ao lucro acima de tudo? 

Influenciadores e políticos que se utilizam de manipulação da informação para o engajamento de audiência - sempre com o objetivo de obterem alguma vantagem enganando as pessoas - também precisam ser responsabilizados. A desinformação desintegra a paz social, gerando ódio e violência. E ainda há um efeito multiplicador, pois cada vez mais notícias falsas são propagadas para se combater notícias falsas. 



A discussão sobre a regulamentação das mídias é antiga. Em 1823, foi promulgada no Brasil o que poderíamos considerar como sendo a “primeira lei da mídia”, que versava sobre liberdade de imprensa e seus abusos. Temos, ainda, o Código Brasileiro de Telecomunicações, de 1962, que disciplina as concessões de rádio e TV, além de uma série de normas que compõem o ordenamento jurídico brasileiro, as quais estabelecem direitos, deveres e mecanismos judiciais aplicáveis no âmbito das redes sociais.
Esse conjunto de normas jurídicas integra o chamado Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), o Código Civil Brasileiro (Lei 10.406/2002), o Código Penal Brasileiro (Dec-Lei 2.848/40) e a própria Constituição Federal. São diplomas antigos e nem por isso a liberdade de expressão foi prejudicada.

Os casos de Lourdes e de Aliandra, contudo, têm servido de pretexto para se alardear o dilema: a regulação das atividades empreendidas pelas empresas de comunicação (o que inclui as plataformas da internet) implica na supressão da liberdade de expressão, que é um direito de cada um de nós?

Todo mercado exige regulamentação, o inadmissível é a censura. Ninguém discorda sobre a necessidade de modernizar a legislação atual do setor de radiofusão, dominado por poucas famílias, e do combate a notícias falsas, ao assédio, ao bullying e à desinformação nas redes sociais. A tecnologia evolui em uma velocidade muito maior que a legislação e as redes estão em constante evolução, sendo que algumas mais antigas podem ser substituídas por outras mais novas.



O debate sobre a regulamentação das mídias está colocado na agenda pública, mas estamos longe da solução do problema. Muitos de nós ainda desconfiam da necessidade de se mudar as regras atuais, certamente preocupados em não deixar que as novas regras maculem o direito à liberdade de expressão. Quais, então, seriam as alternativas para a construção de novas leis e regras? Há várias formas de responsabilizar e mitigar os danos causados pelos criminosos e infratores que não implicam em restrições à liberdade de expressão ou em matar as redes para abolir as fakes News. A sociedade deve se mobilizar, pois o tema, de grande repercussão social, requer muita discussão, com a participação de todos os setores interessados. Poderes de Estado não devem atuar sozinhos. 
Os leitores certamente estão se perguntando o porquê de eu estar falando de regulamentação da mídia num espaço voltado principalmente para a defesa do bem-estar dos idosos. O que nós, idosos, temos particularmente a ver com isso? Segundo especialistas, os idosos são os maiores difusores de fake news e também os mais suscetíveis à prática de crimes “on-line”.  Isso não é uma conduta exemplar por parte desses idosos, convenhamos. Todos nós, de qualquer geração, podemos e devemos agir de alguma maneira para atenuar a disseminação da desinformação e dos discursos de ódio, isso independentemente de haver ou não regulamentação da mídia.

As dicas a seguir podem ser úteis: 

1- QUEM compartilhou isso? As pessoas muitas vezes compartilham sem verificar se é verdade. Só porque seu amigo compartilhou, não significa que seja verdade.
2- QUAL é a fonte? Rastrear a fonte original vai ajudá-lo a decidir se a informação é de confiança.
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4- QUANDO e ONDE isso foi publicado? Você pode dizer quando e onde isto aconteceu? As informações podem ter sido alteradas. Certifique-se de que o que leu ou ouviu está atualizado. 

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