Lavoura de cana em Minas -  (crédito: Diego Vargas/Seapa)

Lavoura de cana em Minas

crédito: Diego Vargas/Seapa

O terceiro levantamento da safra de 2023/2024 feito pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) apontou Minas Gerais como o segundo maior produtor de cana-de-açúcar do Brasil, abaixo de São Paulo. De acordo com os dados mais recentes, a produtividade atingiu média de 84.829 quilos por hectare, um salto expressivo em comparação aos 78.786 quilos/hectare atingidos na safra de 2022/2023. O desempenho resultou em uma produção total de 80,2 milhões de toneladas, superando em 13,6% as 70,5 milhões de toneladas da temporada anterior.

 

Os dados foram coletados de 29 de outubro a 11 de novembro do ano passado por técnicos da Conab, que analisam informações como área de cultivo, produtividade, além da produção da lavoura e subprodutos como etanol e açúcar, o que permite uma visão mais detalhada sobre a safra atual. A previsão para o quarto levantamento, que representa o balanço total da safra, tem divulgação prevista para 18 de abril, quando provavelmente será comprovado o melhor desempenho da série histórica mineira, com início em 2005/2006.

 

Entre outros municípios, o aumento da produtividade da lavoura foi festejado em Campo Florido, no Triângulo Mineiro, onde o engenheiro agrônomo João Bosco Brandão Salomão, de 49 anos, mantém sua produção. Ele é da primeira geração a produzir cana-de-açúcar na família, que era produtora de cereais, e mantém a plantação, em sua maioria, em terrenos arrendados. “Nessa safra de 2023/2024, a gente observou um aumento de produtividade excelente. Tanto que batemos recorde de produtividade em algumas áreas”, afirma.

 

 

De acordo com o produtor, o desempenho estadual e pessoal se deve, entre outros fatores, a uma aplicação cada vez maior de tecnologia na lavoura. “É algo em que há algum tempo a gente já vem trabalhando, e envolve a construção de um perfil de solo de maneira mais tecnificada usando traços culturais como a adubação correta e aplicação de corretivos apropriados. Tudo isso permite um maior aprofundamento da raiz e aumento da produção”, explica. Para o produtor, isso tem representado um tempo cada vez maior dentro do escritório, onde são feitos os planejamentos e estudos a serem aplicados no campo.


Chuva ocorreu na medida ideal

 

Colheita na Usina Coruripe

Colheita na Usina Coruripe

Usina Coruripe
 


Além de maior uso de tecnologia no campo, o também engenheiro agrônomo Rodrigo Piau, de 47, aponta um fator imprevisível como um dos principais aliados na marca histórica alcançado pelo setor canavieiro mineiro: as chuvas. Ele faz parte da Associação dos Fornecedores de Cana da Região de Campo Florido (Canacampo), responsável por fornecer cana-de-açúcar à filial da Usina Coruripe na região. “Nossa região sempre foi conhecida por manter uma boa produção de cana, mas o fator climático foi essencial para essa última safra. A umidade veio na medida e no tempo ideal, o clima foi extremamente favorável. É algo que não temos controle, mas foi um ponto principal”, afirma. A Canacampo também bateu recorde na última colheita, chegando a moer 4.774.000 de toneladas de cana-de-açúcar.

 

Entre as melhorias tecnológicas aplicadas no campo, Rodrigo destaca a sistematização do plantio, um bom manejo de pragas, aplicação equilibrada de produtos químicos e biológicos e foco na qualidade da colheita como fatores essenciais para o aumento da quantidade de cana-de-açúcar produzida.


Mais produção, mais empregos


Além do recorde na produtividade, a alta produção de cana-de-açúcar em Minas Gerais multiplicou empregos no setor. De acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), divulgado pelo Ministério do Trabalho e Emprego, o cultivo mineiro de cana em 2023 representou crescimento de 20% na geração de empregos no setor em comparação com 2022, totalizando a abertura de 540 vagas com carteira assinada.

 

Segundo Caio César Coimbra, subsecretário de Política e Economia Agropecuária da Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa), o aumento da quantidade de produto no mercado gera também a necessidade de mais pessoas trabalhando em toda a linha de produção. “A colheita da cana é majoritariamente mecanizada. Mas vai haver mais trabalhadores em toda a cadeia de processamento. Com a cana se faz etanol, açúcar ou se gera energia. Então, com mais produto no mercado, mais pessoas trabalham na produção, no geral. E para o consumidor final é muito bom também, já que, com maior quantidade de produto disponível, o preço cai. É a lei da oferta e da demanda”, explica.

 

De acordo com ele, os municípios mineiros produtores de cana são os principais beneficiados, com melhoria em várias esferas. “Com mais dinheiro na economia da cidade, há mais coleta de impostos, e isso acarreta melhorias na educação, na saúde, no transporte etc. Gera um índice de desenvolvimento humano maior e melhor qualidade de vida. Além disso, maior produção e geração de empregos afeta de maneira positiva a economia geral do estado”, enumera.

 

O engenheiro agrônomo e produtor João Bosco Brandão Salomão viu na própria plantação o que as estimativas do Caged e o subsecretário Caio César Coimbra apontaram. “Esse aumento na produtividade, com certeza demanda mais pessoas, porque acaba aumentando também o nível de tratamento do canavial”, explica. Mas ele afirma que tem encontrado dificuldade para encontrar mão de obra qualificada. “Por causa disso, estamos contratando pessoas novas e fazendo uma formação aqui dentro da fazenda mesmo. Isso tem se aplicado a operadores de trator, operadores de colhedora e motoristas canavieiros. Nossa contratação nesta safra aumentou consideravelmente”, afirma.


Para manter a produção em alta


Iniciativas do estado e da Associação das Indústrias Sucroenergéticas de Minas Gerais (Siamig) são apontadas como promissoras para manutenção da alta produtividade no setor. Neste ano, o Triângulo Mineiro vai ganhar a primeira usina de biometano, gás natural renovável produzido a partir da vinhaça, resíduo orgânico da cana, biocombustível considerado eficiente e de baixo impacto ambiental. “Além do açúcar, do etanol e da biodiversidade de energia elétrica produzida, nós teremos esse novo produto, gerando oportunidades em Minas Gerais”, afirma o empresário do setor e presidente da Siamig, Mário Campos.

 

A instalação da planta começou em outubro de 2022, no município de Tupaciguara, com um investimento inicial de R$ 30 milhões pela ZEG Biogás. A capacidade produtiva será de 4 milhões de metros cúbicos de biometano por ano, porém com potencial para atingir até 16 milhões de metros cúbicos anuais, com um aporte total estimado em R$ 120 milhões.

 

A expectativa é que o biocombustível substitua o diesel na frota agrícola da Usina Aroeira, contribuindo para a redução da pegada de carbono. A proposta visa aproveitar a vinhaça para fins próprios e comerciais. A venda do biometano tem previsão de início em abril.

 

A Lei 24.652 sancionada pelo governador Romeu Zema (Novo) também promete estimular a produção de cana-de-açúcar no estado, ao instituir a Política Estadual de Incentivo ao Consumo de Etanol. O objetivo é fomentar o uso do combustível renovável e fortalecer o agronegócio e o setor sucroenergético.

 

A nova lei estabelece que entidades e órgãos públicos devem priorizar o abastecimento de veículos flex com álcool, o que se aplica também à frota adquirida com recursos de emendas parlamentares. Incentiva também a criação de microdestilarias de base associativa, estimulando os agricultores associados a usar o etanol.

 

Mesmo com esses incentivos, o engenheiro agrônomo Rodrigo Piau entende que é necessário se manter conservador em relação às projeções para a próxima safra. “O clima que a gente vem sentindo no final de 2023 e início de 2024 é bem diferente do que foi sentido ao longo do ano passado e em 2022. Os meses de março e abril definem muito o canavial. Se tivermos uma umidade satisfatória, podemos ter uma estimativa de boa produção. Se as chuvas diminuírem, aí já é outra estimativa. Na minha opinião, vendo como está, acredito que vamos ter uma ligeira queda na produção”, estima.

 

De acordo com ele, a estimativa para o cenário nacional é de queda de 8% na produção. “A estimativa para Minas é de queda de 4,5%. Acredito que não vai cair tanto, mas vai ficar menor. Se ficar no mesmo patamar da temporada passada, aí podemos soltar foguetes”, afirma.


*Estagiária sob supervisão do editor Roney Garcia