(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas

Violência atinge as mulheres em todas as classes sociais

Em apenas cinco estados, entre eles, Minas, são mais de 228 mil procedimentos judiciais contra os agressores de mulheres, independentemente de status econômico e cultural


postado em 08/03/2015 06:00 / atualizado em 08/03/2015 08:56

Para o juiz Relbert Chinaidre Verly, hoje as mulheres estão mais confiantes em procurar apoio (foto: Beto Novaes/EM/DA Press)
Para o juiz Relbert Chinaidre Verly, hoje as mulheres estão mais confiantes em procurar apoio (foto: Beto Novaes/EM/DA Press)

Apesar dos avanços da Lei Maria da Penha, a violência contra a mulher está arraigada na cultura e atravessa classes sociais. Medidas protetivas para garantir a distância regulamentar de maridos, companheiros, namorados ou homens que um dia foram, mas já não são parte da vida afetiva dessas mulheres, atingem de operários a profissionais liberais, de analfabetos a pós-doutores. No Dia Internacional da Mulher, o Estado de Minas faz um levantamento junto a cinco tribunais de Justiça estaduais, que mantêm algum controle dessa informação nas varas especializadas Maria da Penha. Os dados apontam para 228,07 mil procedimentos judiciais entre ações penais, inqúeritos policiais e medidas protetivas em São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Goiás e Paraná – que concentram 42% da população do país. Estima-se que esse número seja três vezes maior, se consideradas as varas criminais no interior. Não há no âmbito do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) levantamento atualizado desse acervo processual.

Em cada canto do país, uma fila de casos desafia a capacidade de resposta da Justiça. São mulheres que aprendem a esquecer o silêncio ensinado por suas mães e avós sobre a violência diária entre quatro paredes. Frases como “ele me bateu, mas bateu no direito dele” ainda são ouvidas nas varas especializadas, como atestam os juízes Ben-Hur Viza, coordenador do Centro Judiciário da Mulher do Distrito Federal, e Relbert Chinaidre Verly, da 13ª Vara 0Criminal de Belo Horizonte, uma das quatro de competência privativa e exclusiva de agressão contra a mulher na capital mineira. “Mas as coisas estão mudando. As mulheres estão mais confiantes em procurar apoio. E o que vemos são pessoas percebidas como importantes batendo em mulher”, assinala Verly.

A violência contra a mulher é cultural e não tem classe social. “Gente da alta, da elite”, agride psicológica e fisicamente as mulheres, diz Verly. É assim, por exemplo, que o advogado sexagenário de Belo Horizonte, há mais de 30 anos casado com a professora de ensino médio com quem tem filhos, cumpre há 36 dias prisão preventiva, depois de voltar a espancar a esposa, violando a medida protetiva de afastamento. “Casos assim são diários”, informa Verly. Os passos da violência, que sempre habitou essa casa de classe média alta, foram abafados por mais de 20 anos pelo silêncio da mulher: de ameaças e xingamentos, um dia, ele partiu para o ataque físico. Ela apanhou por anos até que ganhou coragem e tentou uma saída pela via Maria da Penha.



GRADAÇÃO Da mesma forma em que o caminho da violência doméstica, se percorrido em silêncio, ganha força e intensidade com o passar do tempo, na Justiça, as medidas protetivas aplicadas em defesa da mulher têm uma gradação. No caso desse advogado, a primeira medida protetiva destinava-se a evitar a sua aproximação da mulher, porque ele passou a ameaçá-la para que retirasse a denúncia, que já havia resultado a ação penal em curso na vara especializada. Mas o marido ignorou a proibição e voltou a procurar a mulher, com novas ameaças. A Justiça aplicou por 90 dias a tornozeleira para monitoramento eletrônico de seus passos. Dessa vez, o advogado respeitou a medida protetiva e, por isso, cumprido o prazo, teve autorização para retirar o equipamento. Embora a determinação de afastamento da mulher ainda persistisse, ele voltou a se aproximar e recusou-se, inclusive, a acatar nova medida cautelar para o retorno da tornozeleira. Não satisfeito, procurou a mulher e voltou a espancá-la, exigindo que desistisse da ação na Justiça. Foi preso em flagrante e assim continua, depois de três habeas corpus negados pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG).

Apesar de a Lei Maria da Penha, em vigor desde agosto de 2006, recrudescer no tratamento da violência doméstica, despertando consciências e colocando luz sobre um problema cultural, há ainda enorme cifra oculta da violência. Não aquela estatística que os tribunais de Justiça e o Conselho Nacional de Justiça ainda não sistematizaram. Mas aquela estatística que nunca chegou à delegacia porque a mulher agredida se calou. “Para muitas sistematicamente agredidas ainda é difícil denunciar, romper com a cultura, com preconceitos e buscar ajuda”, afirma o juiz Ben-Hur. Um trabalho de reeducação nas escolas de ensino fundamental e médio, feito por muitos tribunais de Justiça no país, aos poucos, ajuda a mudar o olhar do homem sobre a mulher, e desta, sobre si mesma. A esperança é de que, um dia, relatos deste tipo farão parte apenas de processos judiciais há muito solucionados: “Veja a minha sina doutora: apanhei do meu pai quando menina, do meu marido quando adulta e agora velha apanho do meu filho”.

Assédio sexual

Hoje, Dia Internacional da Mulher, alunas da rede municipal do Rio, cujo uniforme inclui uma saia de pregas, farão um protesto na Praia de Copacabana, às 14h30. O slogan é “Nosso uniforme, não o seu fetiche”. No local, as estudantes se juntarão ao bloco Mulheres Rodadas, que promove o ato Dia Internacional da Minissaia – Mulheres Rodadas Pelo Direito de Rodar. As iniciativas visam chamar a atenção para o assédio sexual. Também amanhã, em todo o país, terá início a mobilização do Judiciário para julgamento prioritário de ações relacionadas à Lei Maria da Penha, que se estenderá até o dia 13. Esse movimento foi lançado pela vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia Antunes Rocha, dentro da campanha Justiça pela Paz em Casa. A iniciativa, que se destina a agilizar os julgamentos, se repetirá em agosto, aniversário da Lei Maria da Penha, e em novembro, quando a Organização das Nações Unidas (ONU) celebra o Dia Internacional da Não Violência contra a Mulher.


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)