Por Isabel Gonçalves
Eu sempre mantive minhas finanças sob controle. Com minha mãe me ajudando era fácil. Mas agora, formada, morando sozinha, cheia de despesas fixas e recebendo meu primeiro salário, a dúvida que fica é: quanto devo separar para cada aspecto da minha vida?
Quero investir, viajar, comer bem, sair com os amigos, mas por outro lado tenho aluguel, conta de luz, gastos com transporte e supermercado. Será que dá pra fazer tudo? Nas minhas pesquisas descobri vários métodos. Mas uma coisa que fica é: não tem uma resposta certa.
Como dividir o salário na prática?
Vamos ao que interessa. Antes de tudo eu sabia que era preciso começar pelo básico: entender para onde o dinheiro vai antes mesmo de pensar em para onde ele deveria ir. A dica é anotar em planilhas, apps ou no caderno mesmo, o importante é saber quanto você custa.
Pois bem, foi o que eu fiz. Depois disso, vem a parte do planejamento. O primeiro método que me deparei foi o 50-30-20.
O que é a regra do 50-30-20?
Ele consiste em separar 50% do salário para gastos essenciais, 30% para lazer e estilo de vida e 20% para compromissos financeiros.
Na primeira parcela entram despesas fixas tipo aluguel, condomínio, conta de luz, água, transporte e supermercado. Ou seja, tudo que você precisa para viver, comer e morar.
Na segunda parcela, os 30%, entram os gastos que deixam a vida mais leve, mas que não são indispensáveis. Aqui moram os restaurantes, os filmes no cinema ou os serviços de streaming, as roupas que você compra “porque mereço” e até o Gympass da academia. É a parte do orçamento que conversa diretamente com o seu bem-estar e sua rotina social.
Já os 20% finais são destinados aos compromissos financeiros tipo investimentos, reserva de emergência e qualquer outra meta de longo prazo. É a parcela que sustenta o futuro e é justamente ela que cria estabilidade para que os outros 80% funcionem sem susto.
Mas será que o método funciona para todo mundo?
Bom, tentei aplicar esse método na minha rotina. Mas o problema começou logo nas despesas fixas. Só aluguel, IPTU, internet, conta de luz e condomínio já ocupam mais de 50% do meu salário, se eu considerar supermercado (só o básico) e transporte, aí não sobra nada para a “diversão” e menos ainda para investir.
Mas alguém com a mesma idade que eu, que mora com os pais, não precisa gastar com supermercado e depende de transporte público, vai ter uma parcela do salário bem diferente ocupada por essas despesas fixas. Uma pessoa que está aposentando precisa separar mais do que 20% da renda para investimentos do que eu, que tenho mais tempo para construir minha reserva financeira.
Isso tudo quer dizer que não existe um método que encaixe perfeitamente em todas as vidas. Na prática, cada orçamento é um organismo vivo, cheio de nuances, fases e prioridades que mudam com o tempo. Não existe um único jeito certo, existe o jeito que funciona mês após mês.
E se eu tiver dívidas?
Se você tem dívidas, dividir o salário ganha uma camada extra de realidade e talvez de desconforto. E a pergunta é: de qual área da minha vida eu preciso abrir mão?
O primeiro movimento é encarar o valor total, a taxa de juros e o impacto que ela tem no seu orçamento. Sem essa visão honesta, qualquer tentativa de organização vira ilusão. Na prática, quem tem dívidas precisa tratar essas parcelas como despesas fixas prioritárias. Elas não podem ficar no fim da lista.
Os gastos essenciais são fixos e inegociáveis, então não dá pra pagar as dívidas com o valor do aluguel, por exemplo. Você também não vai parar de comer para pagar uma dívida. Mas pode diminuir na quantidade de delivery e priorizar o mercado que vai sair mais barato. Dá pra abrir mão da quantidade de Uber e escolher um meio de transporte mais em conta. O ideal mesmo é que o ajuste venha nos gastos que estão relacionados ao lazer e ao estilo de vida, assim você sente na pele o que significa estar endividado.
Qual a diferença entre despesas fixas e variáveis?
A primeira grande fronteira do orçamento pessoal está justamente entender o que é fixo e o que é variável, o que é essencial e o que não é. Parece simples, mas essa distinção muda completamente a forma como você enxerga e organiza o seu dinheiro.
Sem essa clareza você cai numa armadilha silenciosa, achando que gasta pouco, quando na verdade está sendo sabotado por pequenos gastos que aparecem do nada e que, somados fazem seu salário sumir.
Eu por exemplo, já entendi que comer fora de casa é uma coisa essencial pra mim pelo menos duas vezes ao mês. Sem isso, minhas amizades e meu relacionamento ficam prejudicados. Mas ao mesmo tempo também sei que meu salário não suporta que eu conheça um restaurante novo toda semana.
Entender essa diferença entre o que é essencial ou não e a frequência que cada despesa aparece não é só um exercício técnico, é um jeito de deixar a vida menos caótica. É aqui que a conversa deixa de ser chata e vira libertadora, quando você descobre o que realmente controla no seu orçamento e o que apenas tolera.
Conclusão: o orçamento que cabe na vida real
No fim das contas, dividir o salário é um exercício contínuo de autoconhecimento. A vida adulta chega com boletos, escolhas e responsabilidades, mas também com a liberdade de construir uma rotina financeira que faça sentido para você. Não existe uma fórmula universal, porque ninguém vive a mesma vida, tem os mesmos sonhos ou enfrenta as mesmas contas.
O que existe é a clareza de que entender suas despesas, sejam elas fixas, variáveis, essenciais ou supérfluas, é o primeiro gesto de cuidado com você mesmo. Quando você sabe o que pesa, o que pode ajustar e o que realmente importa, dividir o salário deixa de ser uma equação e vira um processo mais leve e honesto.
Uma dica final é não deixar de fazer sua reserva para o futuro. E, se as dívidas entram na conversa, aí é hora de mudar de postura. Ajustes sempre acontecem e prioridades mudam. A organização financeira serve justamente para abrir espaço para viajar, para descansar e para não viver no susto.
