Nós, os brasileiros, muitas vezes ficamos perdidos e desorientados porque não sabemos mais o que é certo e errado. Se nós, adultos, ficamos sem norte, isso se reproduz em nossas famílias e vacila até mesmo na educação dos filhos. Se não há lei única que atenda a todos e é respeitada, estamos perdidos.
A lei do pai é transmitida com autoridade e amor, mas a lei do papel, que aceita tudo, só pode ser revogada caso haja consenso para tal, mas nunca desacatada. Não há autoridade que possa fazê-lo legalmente.
A indústria das fake news tomou conta da internet a tal ponto que são tantas notícias e opiniões que já não sabemos em que acreditar. Se a gente não sabe a fonte ou tem indicação de quem são as pessoas idôneas em quem podemos confiar, estamos perdidos como cegos em tiroteio. Somente a legítima mídia pode ser confiável.
Nossa Constituição não é seguida nem por políticos e governadores. O próprio Congresso a contraria muitas vezes. Agora, o mesmo com magistrados. Creio que se ela nos é insatisfatória, devemos então fazer uma reforma, segundo o desejo do povo brasileiro. Recentemente, embora a Constituição reprove a pena de morte, assistimos à execução de mais de 100 homens no Rio de Janeiro. Ou seja, a pena de morte deve ser legalizada? É o nosso desejo?
Wálter Fanganiello Maierovitch,jurista e profundo conhecedor da nossa Carta Magna, questiona a matéria da agenciabrasil.epc.org.com.br, na rádio CBN, sobre a decisão do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), no dia 3 de dezembro, de que apenas o chefe da Procuradoria-Geral da República (PGR) estaria apto a denunciar ministros da Corte ao Senado por crimes de responsabilidade.
Quer dizer que apenas o ocupante da PGR pode pedir impeachment de um magistrado. Para isso, suspendeu o trecho da Lei do Impeachment (Lei 1.079/1950) que prevê que, numa democracia, todo cidadão tem o direito, a prerrogativa, de pedir impeachment dos magistrados.
A alegação do ministro Gilmar é que a intimidação do Judiciário, por meio do impeachment abusivo, enfraquece este poder e abala sua independência. Ele provavelmente quis defender o Supremo das ameaças que vêm rondando seus ministros. Essa decisão monocrática seria ainda julgada no plenário, entre 12 e 19 de dezembro.
O ministro recuou, no decorrer da semana, atendendo a apelo do Senado, à política e às articulações internas que desconhecemos. Entretanto, o motivo deste artigo é menos a política e mais a importância da lei. Os detalhes da politicagem, as vísceras de Brasília que cercam o fato serão analisadas pelas mídias. Inclusive, a necessidade de modernizar a lei.
Importam para a psicanálise as consequências da falta da lei. Do enfraquecimento da lei. A lei é para dela nos servirmos, impedindo abusos e excessos do mais forte sobre o mais fraco. Seu enfraquecimento tem consequências. A coletividade se organiza, é normatizada e normalizada pela lei, nos poupando da barbárie.
Tenho apreciado ações de cumprimento da lei pelo Supremo e pela Polícia Federal, acertadas mediante graves irregularidades relegadas por autoridades, e quiçá até sustentadas por elas, e todos sabemos que continuadamente afrontam nossa inteligência por serem permissivamente relegadas as medidas legais para combatê-las.
O Estado e os pais são responsáveis pela educação de nossos jovens. Sem a lei transmitida e acatada, sem limites respeitados, família, negócio e a sociedade não se sustentam bem. A lei protege, ampara e organiza a coletividade e a cidadania. E também a estrutura psíquica do sujeito. Por isso precisamos de muito cuidado quando se trata de abrir mão das leis ou aboli-las.
